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De canção em canção, novo filme de Terrence Malick, chega aos cinemas

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“Eu achei que pudéssemos viver de Canção em canção, de beijo em beijo”
De memória em Memória. Quadro a quadro. A memória, consciência inserida no tempo de Fernando Pessoa. Inexplicável artifício de armazenamento que decide aquilo que tem relevância para ser preservado no tempo. Cheiros, sabores, sons, sensações, imagens. Uma série de recortes escolhidos, diria à revelia da nossa consciência, que delimitam a nossa história e muitas vezes definem quem somos e desencadeiam sentimentos.
Sentimento e memória são as duas primeiras coisa que me vêm a cabeça ao pensar nesse filme e no caminho que têm feito Terrence Malick ao longo de sua filmografia.

A arte está sempre indo adiante, se reinventando, aprendendo novos caminhos e adquirindo novos significados. No início do século XX isso é muito nítido, quando com o advento da fotografia, a pintura e a escultura, principalmente como simples registro da realidade, do momento ou como instrumento para recriar a realidade à sua mais vivida semelhança, perdem um pouco o sentido. O realismo é rapidamente seguido por uma série de movimentos que expandem o conceito de arte para além da semelhança com o objeto, mas explora texturas e, impressões pessoais, luz, sensações visuais. Impressionismo, expressionismo, cubismo, surrealismo. Movimentos que desdobram o conceito de arte e a maneira como as obras eram entendidas até o momento.

O cinema é a Sétima Arte, a última a entrar para o rol das Belas Artes, sendo esse posto pleiteado por Ricciotto Canudo com o argumento de que o cinema é uma arte “síntese”, uma arte total, que concilia todas as outras artes. E, apesar de uma forma de arte jovem, com cerca de 200 anos, o caminho seguido pelo cinema como arte não poderia ser tão diferentes das demais. Depois de explorado à exaustão nos formatos tradicionais é de se esperar que esses formatos comecem a ser questionados por alguns artistas e a estrutura do cinema seja reinventada.

É interessante e refrescante para o cinema, de maneira geral, sair do lugar comum, expandir e desdobrar as possibilidades narrativas. Sem duvida Terrence Mallick é desses artistas inquietos que gostam de brincar com os limites da arte. Mas essas experimentações e tentativa de brincar com estruturas e formatos nem sempre são bem sucedidas em termos de entendimento e aceitação do público.

De canção em canção é um filme que tem uma estrutura narrativa que se assemelha á um resgate de memórias. Recortes e desconstrução. Parece um mergulho no subconsciente do outro. Uma estrutura narrativa que é uma junção de recortes como um desencadeamento de ideias subjetivas, que só vão fazer sentido no todo. Belíssimos recortes, imagens às vezes de tirar o fôlego, sendo a fotografia crucial para a experiência do filme. O filme se constrói em pedaços, talvez como se construa toda a nossa relação com o passado, em detalhes, armazenados e repletos de significado.

O filme parece repleto de simbolismos, como as mansões por onde passeiam os personagens. Belíssimas estruturas, caras e enormes, porém vazias. O vazio das vidas em casas grandes e ocas. A fama. A riqueza. O sexo. O Glamour. Esses são temas recorrentes na obra de Mallick, agora acrescido do universo da música. As questões de vazios existenciais que acompanham esse universo e a famosa fábula dos “pobres meninos ricos”. Honras, títulos; nada disso existe. O que você vê é um palco.

O “voiceover” nos leva à esses questionamentos sobre a vida, sobre ser quem somos, sobre os caminhos que escolhemos. Sobre ser artistas e o preço que se paga. Perversão. Dor. Solidão. Sobre lidar com nossos demônios e nossas escolhas. E é difícil não se relacionar com algumas das questões levantadas. Ainda que o fio condutor sejam esses personagens jovens, bonitos, ricos e supostamente famosos.

Talvez o grande tema sejas justamente esse, o que significa tudo isso? Fama, riqueza, beleza? ser artista? A constante sensação de vazio. Em tempos de grandes artistas da música se suicidando essas questões sejam talvez bastante relevantes.

E no meio de tudo isso o amor. “It’s all for sale”. Está tudo a venda. Tudo. Será?
Quatro personagens que carregam uma série de questões e sentimentos muito distintos e brigam cada um com seus conflitos internos. Belíssimas interpretações de Michael Fassbender, Rooney Mara, Natalie Portman e Ryan Gosling, que desenvolvem atuações que trasbordam força e sentimento, na maioria das vezes, exclusivamente pela linguagem corporal e pelo olhar. Um filme de poucos diálogos construído em cima da força das imagens. Quatro construções de personagens muito diferentes e muito fortes. É possível sentir através das interpretações a angústia desses personagens, a leveza ou o peso das relações. O afeto e intimidade construídos em toques e detalhes.

O filme possui muitos pontos fortes. Fotografia, atuações incríveis, trilha, direção. Mas é tudo costurado de uma maneira pouco convencional. A subjetividade da obra chega ao expectador desde o início e, como em qualquer obra, apreciá-la é, assim como o enredo do filme, um exercício de individualidade. Alguns filmes conversam com umas pessoas mais que com outras. O filme de Mallick é um belo exemplar de arte contemporânea, em que se testam os limites da arte e da obra, causando desconforto e estranhamento.

Super recomendado para os fãs do diretor e do gênero, sendo um belo exemplar dos caminhos que Terrence mallick vem buscando com trabalhos mais experimentais, mas com certeza um filme que vai agradar a poucos.

 

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