- Publicidade -

FICA MAIS ESCURO ANTES DO AMANHECER: QUANDO AS PRETENSÕES ENGOLEM A METÁFORA

Publicado em:

Com o notável crescimento e desenvolvimento do cinema brasileiro nos últimos anos, o mercado tem visto o maior número de produções nos circuitos comercial e de festivais desde a retomada, e, como consequência disso é uma diversidade cada vez maior no que diz respeito aos tipos de filmes realizados. Logo, não é de se espantar que, com a falta de incentivo ainda existente e uma competitividade crescente, novos diretores busquem imprimir uma identidade em suas primeiras obras em detrimento do potencial comercial destas — o que não é nenhum demérito uma vez que diretores autorais costumam se destacar neste meio. O problema surge quando o desespero pela ousadia, pela subjetividade se sobrepõe à narrativa. E é justamente este o caso de Fica Mais Escuro Antes do Amanhecer, segundo longa-metragem de Thiago Luciano, que roteirizou, produziu, dirigiu e atuou no filme.

O enredo segue Iran (Thiago Luciano), um homem cujo relacionamento com Lara (Lucy Ramos) foi destruído pela morte do filho e a incapacidade dos dois de lidarem com o fato — ambos estão indo cada vez mais fundo em seus respectivos poços individuais. Em alternância com este arco, o longa acompanha o rapaz em seu trabalho operário em uma fábrica de gelo, a qual passa a ser diretamente afetada pela intensas mudanças climáticas que estão afetando a região, que começa sofrer períodos de nevascas ou de calor infernal. Quando é noticiado que, em breve o lugarejo testemunhará o seu último pôr-do-sol — literalmente —, a atmosfera depressiva que cerca Iran se espelha para todos os habitantes, os quais aguardam, impotentes, o início do acontecimento apocalíptico.

A trama em si tem um potencial muito promissor, uma vez que a escuridão, e espera pelo “fim” podem ser uma ótima metáfora para a depressão. Contudo, na execução, logo os problemas começam a aparecer. E o primeiro deles é a estrutura narrativa. O roteiro não segue uma estrutura linear e o desenvolvimento dos arcos não é feito de forma natural, fluido, dando ao espectador a sensação de estar assistindo dois filmes em um; a cinematografia e o design de produção — muito bons, diga-se — até tentam evitar — ou, pelo menos, eufemizar — este truncamento, mas esta revela-se uma tarefa inglória se realizada apenas por estes aspectos técnicos. O que leva ao segundo problema do filme: o próprio roteiro. Por mais que a ideia seja boa, ao tentar destrinchá-la em um longa de uma hora e vinte minutos, o realizador passou longe do alvo.

Desta forma, o tema do filme — a depressão extrema — acaba se perdendo entre metáforas rasas e monólogos que, claramente, têm a pretensão de serem repletos de simbologias profundas, porém, no fim, acabam apenas por serem risíveis e provocando a famosa “vergonha alheia” — em mais de um momento, é preciso dizer. E esta falha afeta diretamente o elenco. Por mais que todos estejam comprometidos com as personagens, a falta de material — ou a qualidade deste — prejudica e desnivela as atuações. Quem mais se salva do roteiro é Lucy Ramos, que consegue entregar uma performance boa e crível. O que não é o caso de Caco Ciocler — o nome mais conhecido do elenco —, que dá vida a Luciano, o dono da fábrica onde Iran trabalha. Ciocler é reconhecidamente um excelente ator, no entanto, neste caso, está preso em uma personagem que busca uma excentricidade profunda, mas, por fim, é apenas caricata, rendendo muitos momentos vergonhosos.

Assim, Fica Mais Escuro Antes do Amanhecer é uma produção que tem uma premissa com muito potencial — e se utiliza de uma metáfora instigante e válida, apesar de não ser original, vide Melancolia —, porém, na hora de passar a ideia para o papel e, em seguida, realizá-la, toda a simbologia da trama foi eclipsada por um sub-texto raso e engolida por uma busca desesperada para se enquadrar no rótulo de “filme cult/cabeça”, deixando a impressão de que este filme é muito mais a realização de um capricho ou uma pretensão do realizador — ou do meio em que ele está inserido — do que uma reflexão, um estudo, ou até mesmo uma simples metáfora sobre a depressão. Ou seja, mirou no Lars von Trier e acertou no Tyler Perry.

 

Mais Notícias

Nossas Redes

2,459FansGostar
216SeguidoresSeguir
125InscritosInscrever
3.870 Seguidores
Seguir
- Publicidade -