- Publicidade -

Chuva é Cantoria na Aldeia dos Mortos: documentário retrata diferenças dentro de um sociedade ocidental

Publicado em:

Os ocidentais – em especial, os do continente americano – tendem a achar que a sua cultura é padrão e universal, inclusive, rituais básicos de qualquer sociedade, como o luto. No entanto, o longa Chuva é Cantoria na Aldeia dos Mortos – que ganhou o Prêmio do Júri na mostra Un Certain Regard durante o Festival de Cannes, em 2018 – aborda as diferenças culturais dentro de um mesmo país ocidental – no caso, o Brasil.

Dirigido por Renée Nader Messora e João Salaviza, o longa se passa na aldeia Pedra Branca, no interior do Tocantins, onde vivem os membros da tribo Krahô, e acompanha Ihjãc, um jovem índio que, ao lamentar a morte do pai – falecido há alguns meses – em uma cachoeira no meio da noite, recebe uma mensagem do espírito de seu progenitor pedindo para que os ritos de fim de luto sejam realizados para que, assim, ele possa ir para a Aldeia dos Mortos.

Simultaneamente, Ihjãc ainda é atormentado pela figura da Arara, que o ronda constantemente, como uma indicação de que ele deve começar a se preparar para assumir o posto de novo Pajé da tribo, contrariando a vontade do rapaz, que se acha muito jovem para tal responsabilidade, argumento rebatido com o fato de ele já ter esposa e filho, tendo, portanto, maturidade o suficiente para aceitar a missão.

Por si só, esta premissa já é um mergulho profundo em uma cultura que, mesmo tão diferente, está muito próxima dos brasileiros, geograficamente. Além disso, os diretores conseguem captar a essência daquelas vivências de maneira única e retumbante. Seguindo as personagens de forma discreta, mas precisa, o olhar da câmera 16mm serve bem tanto à imensidão da área indígena quanto para super detalhes que ganham uma aura quase mística.

Este aspecto da produção é ressaltado pela cinematografia, que, utilizando pouca iluminação, destaca as cores fortes que permeiam as vidas daqueles indivíduos, seja o verde das florestas, o azul vívido das penas da Arara ou o amarelo-alaranjado das fogueiras. E o som claríssimo que consegue cercar o espectador ajuda neste exercício de imersão, no qual o público é quase um voyeur, afinal, o objetivo é dar o protagonismo aos índios.

E, para tal, os diretores encontram soluções interessantes. Por exemplo, ao retratar a convivência trivial dos indígenas com os brancos da cidade, apenas o membro da tribo está enquadrado, focalizado ou com o rosto visível na tela, sendo possível apenas ouvir as vozes dos não-índios em off. Além disso, é perceptível também que os moradores da região conhecem os hábitos e crenças um do outro e isso não é fonte de conflito, apesar de a diferença de idioma deixe as interações um pouco truncadas.

Por outro lado, está presente a ameaça representada pelos políticos e fazendeiros que buscam tomar posse do território indígena – este aspecto presente apenas por meio de diálogos. No entanto, também há a troca, o intercâmbio cultural entre os dois povos, como o esmalte utilizado por Kôtô, esposa de Ihjãc, o qual, por exemplo, gosta de músicas “da cidade” e joga fliperama.

Assim, o longa consegue o grande feito de não mostrar os Krahô como uma comunidade exótica, algo que deve ser visto com um tipo de curiosidade espetacularizada – muito disso se deve ao esforço de mínima interferência adotado do cinema documental -; isso faz com que o público consiga desenvolver empatia pelas personagens, entendendo seus conflitos mesmo que estes aparentem ser muito distantes da realidade urbana/ocidental – embora tratem de situações universais, como morte e luto. Com isso, fica claro que é possível retratar, dar voz e protagonismo social/político/artístico a diferentes comunidades, grupos sociais e culturais de forma respeitosa e autêntica.

Mais Notícias

Nossas Redes

2,459FansGostar
216SeguidoresSeguir
125InscritosInscrever
3.870 Seguidores
Seguir
- Publicidade -