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O Professor Substituto: Thriller francês discute o suicídio

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As artes, em geral, tendem a refletir os anseios de uma geração e o cinema é um dos melhores expoentes disso – desde o Expressionismo Alemão no pós-primeira-guerra, passando pela paranoia da Guerra Fria em meados do século XX até as produções pós-2000 e suas preocupações com mudanças climáticas, atentados terroristas e as gerações futuras. Assim, o thriller francês O Professor Substituto é um exemplo deste último tipo.

Adaptado do livro homônimo de Christophe Dufossé, o longa – dirigido por Sébastien Marnier, que também escreveu o roteiro em parceria com Elise Griffon – começa a partir da tentativa de suicídio de um professor, que se joga da janela durante uma prova, na frente de seus alunos, logo na primeira cena do filme – trata-se de uma cena seca, além de incomodamente solar e esta sensação de estranhamento permeia os 104 minutos da produção.

Devido ao fato de este incidente acontecer no meio do semestre, a escola, imediatamente, arruma um professor substituto para assumir a turma, composta por 12 alunos super dotados, que, mesmo estando nos primeiros anos da adolescência, preparam-se para entrar na universidade. Assim, entra em cena Pierre Hoffman (Laurent Lafitte), que logo percebe que há algo de incomum não apenas nos estudantes, como também nos funcionários da intuição. Enquanto os outros professores e o diretor do colégio demonstram uma significativa apatia diante de tudo o que acontece ao redor, um grupo de seis alunos da turma parecem ser totalmente isentos de sentimentos e emoções – e não demora para que Pierre descubra que há algo de muito mais complexo e bizarro por trás disso.

Inicialmente, o sexteto parece apenas um grupo arrogante que, constantemente questiona a capacidade do professor, criando momentos de tensão dentro de sala e inquietação e atrito das dependências da escola com os outros alunos “normais”. Todos os seis são obcecados pela perfeição e agem com um pragmatismo quase robótico, o que intriga cada vez mais Pierre, que, ao perceber que se trata de uma espécie de seita liderada pela fria Apolline (Luana Bajrami), representante de turma ao lado de Dimitri (Leopold Buchsmaum), entra em uma espiral crescente de paranoia, na qual tanto persegue os jovens, quanto se sente perseguido por eles, que têm grandes planos para a viagem de conclusão do ano letivo, quando todos os alunos e professores estarão reunidos em um casarão no campo.

Esta trama, por si só, já é intrigante o suficiente para atrair a atenção do espectador, no entanto, se não houvesse uma boa execução, a boa premissa e o perspicaz sub-texto se perderiam, felizmente, este não é o caso. A começar pelo protagonista, Lafitte entrega um trabalho consistente e maduro como um professor substituto de 40 anos – fato questionado pelos alunos – que se vê confrontado por um grupo de adolescentes super dotados – seus questionamentos acerca do comportamento do grupo e dos funcionários vão desde a verbalização até pequenas expressões faciais muito bem construídas. E, do outro lado da equação, Bajrami entrega uma antagonista à altura, uma personagem impassível, calculista, manipuladora e até cruel – aliás, o confronto aberto entre os dois, já perto do terceiro ato, é um dos melhores momentos do longa.

Além disso, nos aspectos técnicos, o filme também oferece um produto competente. Um exemplo disso é a cinematografia, que, apesar da crueza do início da trama, começa muito solar e vai se tornando cada vez mais sombria, até quase o breu no último ato, casando com a trilha sonora, sintética, que eleva esta sensação de prenúncio do caos do terceiro milênio. E o roteiro ainda faz algumas analogias muito interessantes – incluindo citações e referências a Kafka -, apresentando um sub-texto de diversas formas – desde o coral de alunos cantando “Pissing In A River” e “Free Money”, passando por imagens de atentados, mudanças climáticas e violência praticada pela indústria da carne, até o treinamento para situações de terrorismo, que substitui o tradicional treinamento para casos de incêndio.

Talvez, apesar de a história ser contada do ponto de vista do professor, ao optar por estas exposições mais gráficas e literais, a produção coloque o público na posição do culto de estudantes, dessensibilizando-o, a fim de torná-lo mais resistente – ou imune – ao que o futuro da Terra reserva para os tão comentados millennials – pessoas nascidas a partir dos anos 2000 -, que, além de ter que lidar com pressões cada vez maiores, ainda terão que conviver – ou sucumbir – com as consequências das ações das gerações passadas, as quais se mostram apáticas ou conformadas com a situação.

Assim, O Professor Substituto é um thriller que possui muitas camadas de discussão além de sua premissa – há uma pequena subtrama envolvendo as ligações misteriosas recebidas por Pierre que tem uma conclusão meio aleatória, mas que não deixa de ser válida -, pois, em uma época em que temas que eram tidos como unanimidade – mudanças climáticas, por exemplo – começam a ser questionados sem qualquer base lógica, é, de fato, difícil imaginar um futuro que não seja distópico/apocalíptico (como aponta Eliane Brum no artigo “O Suicídio dos que Não Viram Adultos neste Mundo Corroído”) – por qualquer razão que seja -, assim como não é tão estranho ou conspiratório questionar se os jovens não deveriam se preparar, realmente, para o fim do mundo.

 

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