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Exclusiva: Teresa Cristina fala sobre novo momento na carreira

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Dona das noites, Teresa Cristina é o sucesso das lives na quarentena.

Teresa Cristina
Foto: André Pokan

Quem gosta de boa música e está se sentindo sozinho ou entediado na quarentena não pode perder o melhor das noites, as lives da Teresa Cristina. A sambista de renome, faz lives desde o início do isolamento social, cada noite um tema diferente, que incluem além do seu próprio repertório, homenagens para algum cantor que ela admire, ou até mesmo um tema pedido pelo público. Já foram trazidos como tema cantores como Dona Ivone Lara, João Gilberto, Cazuza, Gilberto Gil, Paulinho da Viola, Zeca Pagodinho, Chico Buarque e Arlindo Cruz.

Seus fãs, que ela carinhosamente chama de Cristiners, numa brincadeira entre o aplicativo de namoro Tinder e as declarações e paqueras que rolam entre os comentários entre quem assiste, são assíduos nas apresentações diárias, mas quem vê Teresa nessa quarentena é uma verdadeira legião de fãs da boa música brasileira, o que inclui verdadeiros gênios, que são nosso patrimônio musical, como Caetano Veloso e Gilberto Gil, que inclusive já entraram ao vivo para dar uma palinha, deixando a cantora totalmente emocionada.

Teresa Cristina é brilhante tanto nas interpretações como nas conversas que são propostas todas as noites, recebe convidados que cantam com ela e conversa sobre tudo, desde a história aprofundada de diversas composições da música popular brasileira e do samba, temas que ela estuda e tem muito conhecimento, até pautas políticas essenciais nesse momento conturbado que o país vive neste, incluindo também machismo e racismo.

Aliás, a carioca, vascaína e portelense conseguiu o primeiro patrocínio de sua carreira recentemente, após ganha repercussão, devido ao grande sucesso das lives, mesmo tendo uma carreira já consolidada e mais de 20 anos de estrada. Assim, com a quarentena, Teresa Cristina passou a ser cada dia mais reconhecida por seu enorme talento!

Como está sendo a sua quarentena?
Teresa Cristina – A gente não sabe de nada nessa quarentena. Só o que eu sei é que vou continuar fazendo minhas lives. Moro com minha mãe, Hilda, de 80 anos, e minha filha de 11 anos, Lorena. Tenho meus afazeres domésticos e divido o dia entre essas tarefas e a elaboração das apresentações baseadas em temas que me vem à cabeça. Dedico várias horas por dia a pesquisar e montar repertórios.

As lives começaram no dia 16 de março, mas quando veio a ideia de começar as lives, você já pensava em ficar fazendo todos os dias, ou isso foi uma coisa que foi acontecendo?
Teresa Cristina- Começou com uma preocupação séria: o medo de entrar em um quadro depressivo. As notícias começaram a ficar cada vez mais fortes e sérias. Minha mãe tem 80 anos e um grau de ansiedade muito forte. Perdi o sono. Não conseguia dormir. Absorvi notícias pesadas, aliás até hoje, né? Daí pensei: preciso fazer alguma coisa que me dê prazer imediato. Nada funcionava. Uma noite, fiquei ouvindo Dona Ivone Lara até 6h da manhã. Escutei coisas que eu achava que conhecia. Foi uma descoberta. Eu não conhecia nada. Músicas que eu nunca tinha ouvido. Todo mundo estava fazendo live, pensei: acho que vou fazer alguma coisa para falar sobre as músicas dela. No mesmo dia algum seguidor, no Twitter, falou de samba de terreiro como se fosse de Umbanda ou Candomblé.

E várias pessoas seguindo a mesma coisa. Aí comecei a explicar sobre Samba de Terreiro. Pensei: vou fazer uma live falando de Samba de Terreiro. O assunto não coube em uma live só. Já tinha começado a ocupar minha mãe fazendo aos domingos com ela, porque ela gosta de cantar também. Então comecei a fazer esporadicamente. As coisas ficaram piores (a pandemia), as declarações do presidente ficaram ainda mais perigosas. Quando vi, estava com lives todos os dias. E percebi a minha animação ao pesquisar os temas e curiosidades que eu iria apresentar à noite, trocando ideia com as pessoas.

Foto: Leo Aversa

Como você vê o resultado da repercussão e alcance no Instagram depois das lives?
Teresa Cristina – Acredito que seja por conta da espontaneidade com que trato estes momentos ali. Estou ali para cantar, contar histórias, me aventurar em canções que nunca pensei em colocar em algum repertório. Converso com o público, recebo amigos e artistas que nunca pensei em dividir um espaço. Quando o Gilberto Gil apareceu, por exemplo, no dia que fiz a releitura do álbum “Realce”, não segurei as lágrimas. Ele surgiu já com um violão, aqueles olhos de águia, lindo e cantando “Viramundo”. Escolho os temas com carinho, acredito que alcanço fãs de nomes como Tom Jobim, Elis Regina, Chico Buarque, Moraes Moreira, Cazuza, Marisa Monte e Alceu Valença, por exemplo. Bebo minha cerveja, me emociono e me divirto todas as noites. Precisamos da arte para viver. Ali é um espaço aberto para os amantes da música. Quando comecei, tinha 98 mil seguidores. Agora já são mais de 323 mil pessoas.

Como você escolhe os temas e os convidados? Você estabelece um tempo médio para as lives ou é de acordo com o que você está sentindo no dia?
Teresa Cristina – Como cada dia é um ano que estamos vivendo, eu escolho as lives pelo que o dia está me dizendo. Varia muito da energia do dia. Tem vezes que marco um tema sobre uma live no dia tal. Daí chega esse dia e acontece outra coisa e eu mudo o tema. No início das lives, criei uma fala que era “minha live, minhas regras”. E é isso. Cada vez que acho que tenho de mudar de opinião, quebro a regra, vou lá e mudo. O tema vem sempre pela minha intuição. A não ser por aniversários como foi o do Gil, do Chico, do Pitanga, da Elza. Nestas eu consegui pensar e organizar. Mas quando não é algo datado, vou pela intuição. Geralmente, penso isso de manhã. Começo as lives pontualmente às 22h. Elas têm duração de três horas porque o Instagram deixou. Tem vezes que fecho 01h da manhã e abro outra só para encerrar com categoria o tema escolhido.

Você poderia falar um pouco sobre a sua relação com os cristiners, além de contar sobre a origem do nome, e da brincadeira com o Tinder?
Teresa Cristina – Nunca vivi isso e nem tive fã-clube cativo. Tenho muito carinho pelos Cristiners. Eles mandam mimos para mim, coisas bem simples, mas que têm um efeito bem grande em mim. Enviam salgadinhos, cartinhas feitas à mão. É uma demonstração de carinho que tem mexido muito comigo. Me emociona, pois, ganho avalanches de carinhos todos os dias. É uma experiência muito nova para mim. O nome se originou ali. E o Cristinder veio do bate papo gostoso que rola nos comentários. Eu me divirto.

Foto: Marcos Hermes

A interação descontraída que acontece entre celebridades e fãs anônimos nas suas lives é muito interessante, como você vê isso?
Teresa Cristina – Acho incrível quando vejo atores e músicos conversando com os outros seguidores. Se fosse numa situação normal, provavelmente eles seriam abordados com um pedido de selfie. Ali, todos estão na mesma festa, num clima mais relaxado.

Tem algum cantor que você gostaria que participasse?
Teresa Cristina – Eu já sou grata e feliz pelas surpresas que tenho a cada noite. Gil, Gadu, Bebel Gilberto, Caetano, Pedro Baby, João Bosco, Alceu… Na verdade, eu queria mesmo era que o Michael B. Jordan aparecesse por lá, isso sim.

Você já tem planos de repertório específicos para as próximas lives?
Teresa Cristina – Foi o que eu disse acima. Como cada dia é um ano que estamos vivendo, eu escolho as lives pelo que o dia está me dizendo. Varia muito da energia do dia. A não ser que sejam datas emblemáticas, como os aniversários de Chico Buarque, Elza Soares, Gilberto Gil, Marisa Monte…

Na época da ditadura militar a classe artística teve um papel de protagonismo no enfrentamento, usando a arte como ferramenta de crítica social como vemos em inúmeras composições da época. Suas lives costumam ter uma abordagem de pautas políticas, como você acha que a classe artística neste momento que o país vive pode agir para auxiliar no combate ao retrocesso?
Teresa Cristina – A arte vai continuar sendo vitoriosa e sair mais forte dessa pandemia, pois ela sempre sobrevive. Ela teve força, base, história e sobreviveu contra o Nazismo e o Fascismo. Essa pandemia veio para mostrar isso. O que tem segurado a gente, certamente, é a arte. Para tanta coisa absurda que está acontecendo, só a beleza que me distrai e tem a minha atenção. Além disso, é a imensa a bagagem de bobagens que o ‘Voldemort’ fala diariamente. A classe está unida e quem entende o momento que passamos tem se posicionado.

Após tudo que aconteceu com a morte do George Floyd e os movimentos antirracismo, a pauta que é importantíssima para um país que é muito racista como o nosso está bem em alta e isso é um bom momento para conseguirmos falar como isso afeta inclusive a música, como por exemplo essa questão, primeiro patrocínio depois de 20 anos de carreira?
Teresa Cristina – Essa coisa de patrocínio, às vezes, é muito ingrata. A gente, certamente, fica invisível. Eu sou invisível desde 1998. Isso fala muito de como é o Brasil. As pessoas gostam de dar dinheiro a quem já tem, não sei explicar como isso acontece, mas acontece.

Aliás, a quantidade de artistas, de pessoas brancas que têm uma carreira facilitada para tudo… Isso é uma coisa que a gente não fala, porque a gente está cansado de falar. A falta de apoio aos cantores de samba não é de agora. A pandemia jogou uma lente de aumento em várias situações. Tivemos de passar por isso para entender que não é toda a população que tem água encanada, luz, tratamento de esgoto. As pessoas vivem em condições precárias. Quando começamos a falar sobre usar o álcool gel, por exemplo, esqueceram que têm pessoas que nem água tem em casa. Aliás, os cantores de samba, em sua maioria – salvo algumas exceções – sempre tiveram cachês mais baixos. A relação com os contratantes sempre foi na base do “tudo tá bom”. Nunca precisou de um som incrível, uma grande produção. Isso é um reflexo do que sempre aconteceu.

Juliana Meneses
Juliana Meneses
Jornalista, pesquisadora de comunicação, fotógrafa e escritora. Apaixonada por literatura, cinema, teatro, música e fotografia. Viciada em café e livros, nasceu para escrever e viver cercada de histórias.

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