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Nelson Pereira dos Santos: Vida de Cinema mostra a relevância e assertividade do cineasta

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Documentário radiografa um homem que viveu a arte.

Ter como um dos nossos maiores cineastas de todos os tempos um mestre como Eduardo Coutinho, que revolucionou a linguagem cinematográfica documental para longe do que até hoje é feito em solo estadunidense, colocou o Brasil como refém de um gênio. Por sua causa, eu desaprendi a aprovar ‘cabeças falantes’, por exemplo, que é aquele mais básico registro para um documentário, onde nada mais do que comentários à exaustão feitos a respeito do tema abordado, esse era o meu medo com Nelson Pereira dos Santos: Vida de Cinema. 

2023 foi realmente prodigioso para o lançamento de documentários, e títulos como Bem-vindos de Novo, Mirante e Muribeca, além de Retratos Fantasmas, longa de Kleber Mendonça Filho e entre outros, ganharam as telonas e mostraram a versatilidade de um gênero que precisa ir além do estabelecido. Aída Marques e Ivelise Ferreira conseguem o que muitos cineastas experientes não se dão conta de atender: ao falar de alguém, porque não deixar que a própria pessoa, e somente ela, se expresse? É o que acontece em mais de 90% do material, com um trabalho respeitoso com o “homenageado” – não gosto da expressão para cinema, parece que estamos falando de desfile de escola de Samba – e sua arte, que são essencialmente o que precisamos acompanhar para que ele se mostre, por inteiro.

Nelson Pereira dos SantosProvavelmente o fato de Ferreira ser a viúva de Nelson contribui para que tal decisão não apenas seja a mais acertada, como também a que o personagem gostaria que prevalecesse. Nesse sentido, Nelson Pereira dos Santos: Vida de Cinema é um filme sobre um profissional em seu ofício, seja ele qual for. Que se trate do homem por trás de obras imortais como Rio 40 Graus, Rio Zona Norte e Vidas Secas, isso aumenta o interesse da cinefilia sobre o filme. Que se saiba então que o filme é, sucinto, uma espécie de auto memória. O próprio cineasta repassa a limpo tudo que já fez, como fez e porquê fez, isso aumenta não apenas o interesse pela obra, mas também sua relevância e assertividade no que estão contando.

Como nos melhores filmes em qualquer formato, a montagem é a alma do que vemos em um documentário, isso, certamente, costuma ter peso extra. Nelson Pereira dos Santos: Vida de Cineasta tem em Luiz Guimarães de Castro um profissional à altura da empreitada, porque ele não dá apenas ritmo e precisão ao todo. Seu trabalho é minucioso, já que em muitos momentos não conseguimos identificar a mudança no tempo dos depoimentos de Nelson, fazendo parecer que duas citações afastadas por longos períodos parecem absolutamente conectadas. Se isso é também obra da coerência de um artista que conhecia muito bem seus desejos, o trabalho de Castro não pode ser tratado como apêndice das opiniões de Nelson, porque seu corte é muito estreito, no acerto de unir tantos anos em algo absolutamente coeso.

A liberdade que o filme arrebanha para Nelson é similar ao que ele conseguiu em sua obra, indo a lugares tão intensos e díspares como Memórias do Cárcere ou O Amuleto de Ogum, sua obra foi marcada pelo rigor, mas pela ausência de regras pré-estabelecidas pelo mercado. Por isso é tão feliz vê-lo comentar em Nelson Pereira dos Santos: Vida de Cinema o quanto essa possibilidade de trilhar um caminho próprio permitiu que seus filmes tenham nascido exatamente da forma como foram. Com clareza e objetividade, o filme também é uma aula sobre como podemos sim sair de uma zona de resguardo para a total criatividade, e que só ela pode responder a tantas questões sutis.

Estamos também diante de uma carta de amor, não apenas de uma esposa pelo homem que esteve ao seu lado, mas principalmente um retorno do cinema para um profissional que ergueu uma pilastra dentro do mesmo com seu talento. Nelson Pereira dos Santos: Vida de Cinema, como o título diz, radiografa um homem que viveu arte, que não existiu enquanto não profissional de sua área, e o fez de maneira sublime. Se faz falta é porque gostaríamos de mais, ainda que a obra que deixou seja maior que tantas carreiras inteiras. No entanto, são 100 minutos que passam voando, ao mergulhar em filmografia tão gigantesca contornada pelo dono dela; um privilégio.

 

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