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Tolos são os Outros apresenta experencia árida sobre relações humanas

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Se pudesse resumir Tolos são os Outros em uma expressão, poderia ser “uma investigação massacrante”. A produção polonesa no que pode ter de mais duro dessa afirmação, chega até o público nacional sem que tenhamos muito acesso a sua narrativa. Não apenas porque sua sinopse é cercada de uma ideia vaga sobre o que vamos assistir, mas porque sua experiência árida, cheia de camadas que não se abrem com facilidade, é, certamente, um convite à incógnita.

Ao final da sessão, o que se apreende do material é uma daqueles momentos raros, onde temos certeza que nada parecido com isso se apresenta com facilidade para o espectador, e que é maravilhoso como podemos ainda receber filmes assim para a apreciação coletiva.

Tolos são os OutrosDirigido por Tomasz Wasilewski, que também já tinha lançado por aqui seu anterior, Estados Unidos pelo Amor, já sabemos a essa altura o que esperar do rapaz. Um jovem diretor disposto a conversar sobre relações humanas a partir de pontos de vista radicais. em Tolos são os Outros, ele acompanha a história de um casal, Marlena e Tomasz, que abriga o filho dela, muito adoecido. Se a história anterior da família ao menos parecia estável em sexualidade e paixão, com a chegada desse novo integrante, a estrutura que parecia firme entre eles se mostra cada vez mais frágil, de uma maneira irreversível. É quando o filme começa então a investigar não os eventos que uniram aquelas pessoas, mas a forma como elas posicionam seus corpos em uma determinada estrutura social.

Tolos são os Outros é assumidamente um filme onde o corpo tem papel decisivo no andamento da narrativa, na composição dos planos e na associação narrativa. O que move os personagens é uma estrutura física que não é estabelecida apenas de maneira concreta, mas também pela forma como, socialmente, temos um papel a desempenhar com nossa carga óssea. Passeando pelas entrelinhas, vemos uma mensagem sobre como a força do tempo nos separa uns dos outros, e de como somos moldados por essa mesma passagem simbólica, que não é algo visível apenas pelas marcas, mas de como muitas questões ainda não foram assimiladas pelo nosso entorno, mesmo que o nosso corpo tenha feito o arranjo independente disso.

Enquanto experiência cinematográfica, Wasilewski não pretende deixar o público omisso ao que ele proporciona. Tolos são os Outros incomoda em sua fisicalidade, mas nunca tanto quanto em sua sensorialidade, são descritos e vividos momentos de intensa angústia em cena, e o diretor consegue fazer alguns momentos quase vibrarem dentro do espectador. Não se trata de algo simples de reproduzir, e em determinadas passagens, nossa conexão é tão forte com a protagonista que compreendemos suas rupturas com o bom senso, e a compaixão. Aliás, essa mesma compaixão que a personagem não conseguiu agregar a si mesma, e a culpa que sente pela forma como desenhou sua existência, acaba resvalando em tudo que ela carrega dentro de si, e que se volta contra ela de maneira violenta.

Quase inteiramente constituído pela união de diversos planos sequência, ou sequências de câmera estática, Tolos são os Outros não tem essa solução de maneira gratuita. Isso também é uma forma de acompanhar a relação dessas pessoas, mais precisamente Marlena, com o tempo, e com as determinações que passamos a partir dele. Parte dessa observação vem da constatação de que estamos acompanhando aqueles momentos quase em tempo real, com um desenrolar de eventos que se assemelham à ordem natural das coisas. Esse é mais um fator determinante a nos encerrar dentro da angústia pelo qual todos estão passando a partir da chegada (e do sofrimento) de Mikolaj.

Ao contrário do que apregoam ao cinema, relacionando-o exclusivamente à diversão gratuita, esse cinema em específico tendo a ser atacado por grupos de cinéfilos que encontram em produções assim uma porta de entrada à misantropia. Por mais que até possa ser, filmes como Tolos são os Outros não estão criando uma sociedade paralela onde o sofrimento (gratuito ou não) não pode ser negado, como algo feio, de fato, ele existe, mas, certamente, não seria mais adulto enfrentar essa realidade? Por trás do que está sendo dito de maneira direta, nas curvas do roteiro está sendo questionado o conceito de amor incondicional, e do quanto abrimos mão por essa posição inquestionável de um sentimento, até às raias da destruição.

 

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