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“Maio, Antes Que Você Me Esqueça” ferve o amor incondicional entre pai e filho no fogo da memória

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Se a memória é a o músculo da imaginação, o esquecimento é a atrofia do sonho, em especial de um sonho chamado vida plena em família. Nietzsche escreve em seu “Humano, Demasiado Humano” que “A vantagem de se ter péssima memória é divertir-se muitas vezes com as mesmas coisas boas como se fosse a primeira vez”. Mas a roleta-russa do Alzheimer que se abate sobre o apartamento no qual se passa a ação de “Maio, antes que você me esqueça” não há muito espaço para a ironia nietzschiana. O desgaste que se dá entre um pai e seu caçula, mediados pela dialética da erosão (de recordações e de responsabilidades pretéritas), não abre o flanco para um senso espirituoso. Mais bem-vindo é um acerto de contas, talvez não definitivo, mas possível.

Egresso das Gerais, “Maio, antes que você me esqueça” é escrito e dirigido por Jair Raso, a peça é um soco no estômago do qual a gente não se recupera fácil, não. Mas até vibrar numa dinâmica de dor, gravitando por um formato de lavação de roupa suja, ele é engraçado – um bocado – em sua mineirice, com evocações a torresmos e à fina pinga de Itamarandiba.

Numa esgrima de talentos de lâminas afiadas, Ilvio Amaral e Mauricio Canguçú se digladiam respectivamente nos papéis de Seu Helio e de seu filho mais moço, Mauro. O primeiro é um ex-lojista que vive refém do gradual apagamento de suas lembranças, sobretudo as recentes. O segundo é um paisagista, orgulhoso da profissão que, embora organize jardins e espaços de interseção com a natureza, vive numa caixa de cimento num prédio qualquer com uma janela grande o suficiente para levar alguém desesperado a pular.

Raso cria uma ciranda de situações cômicas no terço inicial de “”Maio, antes que você me esqueça” explorando a inabilidade de Seu Hélio em reconhecer onde está ao passar um fim de semana na casa de alguém que já não mais reconhece. Conversas iniciais sobre uma cervejinha gelada rendem episódios de humor rasgado me cena, apoiado na comicidade dinâmica da dupla de atores de “Imagine! Um Espírito Baixou Em Mim”, um fenômeno teatral. Mas em seguida, a peça toma outro rumo e adquire um tônus rasga-coração. É que Mauro tem muita mágoa daquele pai hoje fragilizado diante de si. É uma mágoa pelos males que acometeu sua mãe e pelo desdém de seu velho para com a escolha profissional que fez. Essa mágoa, nas raias do ódio, será purgada em cena em situações que depuram o talento de seus intérpretes. Situações às quais a iluminação feita por Marina Arthuzzi e pelo próprio Jair Raso reage com mudanças de temperatura de cor até a encenação chegar à fervura máxima.

Quando aquele amor incondicional ferve, a gente percebe estar diante de um trabalho teatral bonito demais para ser esquecido. “Maio, antes que você me esqueça” se afirma como atração obrigatória nas artes cênicas no Rio de Janeiro, com um elenco em estado de graça. Merece destaque a cenografia austera de Andréa Raso, que também cuida dos figurinos.

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