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“A Barca” estreia no Teatro Correios Léa Garcia

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No meio de transporte mais comum para realizar a travessia entre as cidades do Rio de Janeiro e Niterói, o encontro no meio da baía que separa as cidades fluminenses, Ivo (André Ramiro) e Douglas (Paulo Giannini) inevitavelmente se aproximam. Em condições diametralmente opostas, os personagens, que foram criados juntos, praticamente partilhando pai e mãe, mas não podem se chamar de irmãos graças à cultura que os formou, buscam resolver suas pendências agora que o convívio se tornou ainda mais difícil. Este é o ponto de partida do espetáculo inédito

Ora para ajustar contas, ora para costurar memórias, ora para reclamar o futuro incerto, ora para saltar o abismo que afastam Ivo e Douglas, o espetáculo lida com uma temática importante: a relação inter-racial e seus pilares temporais: passado, presente e futuro. E o espectador é convidado a uma discussão demasiadamente humana sobre as origens dos pré-conceitos na representação dos corpos.

O pensamento decolonial e a inclusão definem o projeto. As personagens evocam as complexas heranças culturais de suas árvores biológicas somadas ao abismo que corta suas realidades sociais para revelar o quanto de irmandade e desamor tecem o vínculo entre eles. “Embora o racismo estrutural brasileiro esteja presente em qualquer lugar, em qualquer tipo de relação, a peça fala mais sobre a impossibilidade de comunicação entre dois homens que tiveram, podemos assim afirmar, o mesmo porto de afeto que foi o amor da mulher, empregada doméstica, pelo seu filho biológico e o outro menino, filho dos patrões. Mesmo assim, os dois, vivenciando memórias e prazeres juvenis, são incapazes de se auxiliarem por conta do abismo social”, pontua o diretor Luiz Antônio Pilar.

A decisão de construção de texto foi, para Alvaro Campos, uma maneira de sanar uma questão afetiva através de uma metáfora artística. “Quis transformar em arte um período complexo da minha vida particular, em que perdi dois entes queridos. Queria falar sobre como o afeto familiar é a única barca possível quando o mar é revolto demais para navegar. E sobre como às vezes todos nós, de forma orgulhosa e estúpida, temos medo de confiar nessa embarcação. A barca leva de um ponto ao outro. É sinônimo de mudança. E quando a barca está no mar, você está preso com a companhia dos demais passageiros.  É preciso lidar com o que se sente por eles”, pondera o autor.

Pilar complementa, considerando que o texto aborda a questão socioeconômica e afetiva entre dois homens. “Embora convivendo durante muitos anos no mesmo ambiente, eles tiveram uma vivência social contrária neste mesmo espaço: um cresce como homem de classe média, quase rico, com formação universitária e filho dos patrões. E o outro como pobre, com uma educação básica, filho da empregada, um adulto com poucas possibilidades de exercer uma atividade que lhe dê prazer. O grande diferencial na nossa montagem é que, contrariando a realidade e expectativa racista e social vivida no Brasil, o homem com os pais ricos, universitário e filho dos patrões, é PRETO. O outro, é BRANCO”, antecipa o diretor.

Um dos desafios da montagem foi cuidar para que o personagem negro, que na cena está em superioridade social, mas num lugar de dívida, não fosse inserido num lugar de algoz, como costuma comumente e equivocadamente ser relacionado na sociedade, sobretudo mediante tal cenário. “Esta é uma questão muito inteligente e sensível. Mas reconheço que hoje, depois de anos de luta e de um trabalho constante de afirmação da condição do ser preto/preta através de movimentos sociais e de letramento racial no processo de educação, o cidadão e a cidadã, preto e preta, já sabe que pode ir para além deste limite. As pessoas já chegam com uma consciência crítica e questionadora sobre este papel, ainda que muitos ainda queiram colocar os negros no lugar de algoz ou vítima passiva de um sistema feito para anulá-lo”, aposta o diretor Luiz Antônio Pilar.

Em cena durante todo o tempo, os dois atores são apoiados por uma trilha sonora que sublinha os diversos sentimentos expressos e a história da peça. De maneira a afirmar o jogo cênico diante do público, os atores vão transformando os seus figurinos, estabelecendo novos climas dramáticos para a narrativa e em suas interpretações, revelando ao público o espaço e cenário onde estão contracenando. Criado a serviço do texto, o espetáculo foi respeitando todas as suas indicações emocionais, psicológicas e físicas.

“Queremos mostrar como o afeto é o único catalisador para qualquer transformação positiva. A luta de classes. O preconceito geográfico. A construção da consciência antirracista. Todas as causas são vitais, mas em suas complexidades e desafios, esquecemos que é o afeto que permite a escuta sincera. É o acolhimento afetivo que desarma as tensões e permite a aproximação. Vivemos um tempo estúpido não pela falta de informação ou capacidade cognitiva, mas porque negligenciamos a construção do afeto entre diferentes, como se não estivéssemos vivendo na mesma cidade, no mesmo país, no mesmo planeta, no mesmo tempo. ‘A Barca‘ é a história de uma família que não se aceita como tal por preconceito, mesmo que seus integrantes precisem desesperadamente do apoio familiar”, encerra o autor Alvaro Campos.

SERVIÇO: Temporada: 5 de setembro a 5 de outubro de 2024/ Dias e horários: Quinta-feira a sábado, às 19h Local: Teatro Correios Léa Garcia / Centro Cultural Correios (Endereço: R. Visconde de Itaboraí, 20 – Centro) / Ingressos antecipados: https://riocultura.eleventickets.com/

Duração: 65 minutos

Classificação Indicativa: 14 anos

Instagram: @sarava.cacilda

*Nas sessões dos dias 20, 21, 27 e 28 de setembro e 4 e 5 de outubro haverá Libras e audiodescrição.

Rota Cult
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Redação do site E-mail: contato@rotacult.com.br

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