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A Vilã das Nove carrega uma picardia ousada de um folhetim dramático

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A premissa de A Vilã das Nove não somente é deliciosa, como um prato cheio para alguém que cresceu tendo a teledramaturgia como base de construção narrativa, como eu. Aliás, que fique claro, o folhetim dramático de onde se formata a história de uma dramaturgia que, durante muitas décadas, era nosso pilar cultural mais fortalecido dentro da arte dramática, já produziu inúmeros clássicos, e não pode ser tratado como cidadão de segunda classe dentro do que é encenado no Brasil. No momento, o formato telenovela passa por um período de incerteza e necessária reformulação, com a aposta em remakes de obras passadas e títulos originais em posição de declínio. O que um filme como o de Teodoro Poppovic poderia resgatar dentro dessa estrutura (se é que existe esse interesse), e o que pode fazer pelo cinema em si?

A Vilã das Nove

No longa anterior de Poppovic, a ousadia presente fez nascer uma comédia que merecia ser muito mais conhecida e vista do que foi, de fato. TOC: Transtornada, Obsessiva, Compulsiva foi uma das comédias recentes mais interessantes, onde os elementos utilizados, tanto na construção narrativa quanto no trabalho do gênero, melhor funcionaram. A Vilã das Nove também carrega essa picardia ousada, essa experimentação e essa conversa com a arte, tenha ela a vertente que for. Embora não falte humor ao filme, e as cenas da telenovela ‘A Má Mãe’ são especialmente azeitadas nesse sentido, existe uma base dramática na produção que o coloca nos trilhos de produções muito densas, como As Horas. E nem sempre esses elementos conseguem harmonizar conjuntamente, e existe um fator que falta ao filme e muitas vezes sobra nas novelas: o tempo. 

A base do roteiro escrito a oito mãos é, a bem da verdade, de inspiração típica do melodrama. Poderia ser uma espinha dorsal que Manoel Carlos já defendeu, ou um argumento com a qual Pedro Almodóvar serviria com gosto. Mas existe essa curva temporal que precisaria ser melhor configurada em A Vilã das Nove, e que faz parte da estrutura de uma produção diária, como tantas já produzidas “globalmente”. São necessários alguns meses para desenvolver uma relação entre personagens, uma mágoa que precisa ser palpável em um campo que engloba no filme pelo menos quinze anos. Como muitas obras televisivas cometem aqui e ali, o filme de Poppovic parece se apropriar não apenas das características positivas de sua inspiração. 

O excesso de personagens com importância apresentada pelo roteiro, e a falta de estofo (e tempo) para aprofundar seus relevos e situações, fazem do que vemos uma reprodução quase fiel dos problemas que tantas novelas já enfrentaram. Não é difícil imaginar que uma resposta atestando o propósito de tais problemas fosse assumido pelos envolvidos, mas a verdade é que, tal qual nas novelas, esse é um dado que não melhora nem torna quem o comete “divertido”. Pelo contrário, conforme avança para o desfecho, A Vilã das Nove incorre em outro problema bem comum das novelas, que é o abandono dos personagens, tantos ficando sem o que chamamos de desfecho. 

O elenco, ou o trio de protagonistas femininas, é de profundo acerto. Karine Teles é uma das mais interessantes e humanas atrizes de sua geração, empregando um olhar muito verdadeiro em tudo que faz. Alice Wegmann é uma jovem estrela, que talvez tenha a personagem mais sacrificada aqui, porque suas curvas são muito agudas, o que exige muito mais da atriz. Além disso, o trabalho de Camila Márdila talvez seja o mais impressionante do trio porque ela encarna mais de um tipo, o real e o fictício, e ela consegue se equilibrar muito bem entre um naturalismo cheio de camadas, e uma artificialidade bem interessante de acompanhar. Além delas, a presença curta de Valentina Bandeira não passa despercebida, e Felipe Rocha merece um lugar que não vemos chegar para ele. 

Apesar do elenco bastante acima da média, A Vilã das Nove parece sucumbir ao excesso de intenções e pretensões, do qual o filme anterior de Poppovic lidou bem. Aqui, o campo era muito vasto e propício a quedas bruscas, mesmo em meio a um quadro onde a originalidade se mostra presente e bem-vinda. Temos a impressão de que muita coisa em cena é uma versão resumida de algo que carecia mais tempo de manutenção, sejam das emoções ou das relações. O que vemos parece um resumo de algo muito maior, com camadas melhor exploradas, onde tais personagens fizessem jus ao talento de cada ator envolvido. A forma final que chega ao espectador é de que, talvez, somente uma telenovela fosse dar conta de tantas possibilidades. 

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