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Venom A Última Rodada: Uma cerimônia do adeus com adrenalina e risos em equilíbrio

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A revolução dramatúrgica para os padrões Pop das HQs, ao reunir personagens de diferentes perfis numa ambientação interdimensional, “Guerras Secretas” (que está em adaptação para as telas pelos Irmãos Russo) ampliou as vendas da Marvel Comics, em 1984, e introduziu uma figura peculiar: um uniforme vivo, alienígena, definido como Simbionte. O primeiro a “vestir” esse ser de tecido orgânico (capaz de expandir a potência de seu usuário) foi Peter Parker, o Homem-Aranha. Não demorou para que a “roupa” de inteligência própria demonstrasse sinais de má índole e atacasse o Escalador de Paredes. Quatro anos depois, em 1988, a dupla David Michelinie e Todd McFarlane enxergou naquele ET fluído um potencial vilão para o Aranha e o ressuscitou, dando a ele nome de Venom, uma história pregressa e um novo “dono”: o repórter de caráter diminuto Eddie Brock. 

Naquele momento histórico, fim da década de 1980, o jornalismo passava por uma crise, bandeando-se mais para o lado da publicidade, sob a tentação do sensacionalismo e da espetacularização. Um criminoso que encarnasse a fake news parecia perfeito ao torvelinho da História. Só que com o tempo, Brock foi complexificado e humanizado, e seu traje alien humanizou-se junto. Virou um anti-herói, combatendo ameaças à Terra seguindo caminhos que não eram bem-vindos aos vigilantes de bom coração da editora. Foi nesse quadro de mudança que o cinemão, na figura do produtor Avi Arad (“Motoqueiro Fantasma”), resolveu convocá-lo para o audiovisual. Tom Hardy, o Bane de “Batman – O Cavaleiro das Trevas Ressurge” (2012), foi o ator escalado para interpretar Brock, o que foi uma sacada sagaz. Trata-se de um galã rústico, de mirada indomável (como um Marlon Brando fora de época). A segunda sacada precisa de Arad: pensar para o projeto uma linha de filme B, mais violenta, com um instinto de “autoesculhambose”, sem nunca se levar a sério demais. O resultado: um êxito comercial. O primeiro longa-metragem, de 2018, faturou US$ 856 milhões, e o segundo, de 2021, arrecadou US$ 506 milhões. Eis que chega o terceiro, Venom A Última Rodada, capaz de ser mais divertido – e mais eletrizante – que os antecessores. 

Com o carisma de Hardy (bem dublado aqui por Guilherme Briggs) no leme, a franquia “Venom” é pautada por uma mistura equilibrada de riso e adrenalina, sem jamais descambar para o clima de chanchada de “Deadpool”. Certamente, a galhofa aqui não é soberana. Aliás, a parte três, que marca a estreia da roteirista Kelly Marcel na direção, é marcada por um tempero agridoce em seu olhar sobre a amizade. A trama de Venom A Última Rodada gravita pela sensação de despedida entre dois entes, o humano Brock e seu parceiro das estrelas, Venom, e as sequelas sentimentais dessa partida. Estamos diante de uma cerimônia do adeus, tanto para Hardy (em sua relação com uma trilogia nerd) quanto para os personagens.

Ficou excessiva a aposta dos filmes de matriz quadrinística  – um filão em plena ressaca depois do decepcionante “Coringa: Delírio a Dois” – na ideia de multiverso. Por sorte, o roteiro de Kelly, baseado em argumento escrito por ela e por Hardy, trata o assunto de forma jocoso. Há, sim, um portal para uma outra dimensão, mas ela não dá deixa para que o protagonista venha e volte no tempo (ou no espaço) em versões diferentes de si mesmo, como se vê no gênero, de um modo cansativo, desde que a pandemia acabou. O que se sabe é: o planeta natal de Venom, lar de outras/es/os simbiontes como ele, repeliu uma divindade chamada Knull (o papel do eterno Gollum Andy Serkis) para uma espécie de limbo prisional. Se esse deus caído puser as mãos num dispositivo que está encrustado na fisiologia de Brock, ele pode se salvar e destruir o Cosmo. Para se apoderar desse pertence, ele envia monstros ao nosso mundo, como seus coletores. É aí que a correria começa, e Kelly a conduz com eficiência.

Em Venom A Última Rodada existem núcleos de personagens satélites aleatórios (e supérfluos) ligados a uma base militar de “controle de pragas” (no caso, de simbiontes) liderada pelo oficial Rex Strickland (Chiwetel Ejiofor, num desperdício de talento). Nesse grupo trabalham cientistas como a Dra. Payne (Juno Temple), outra coadjuvante desnecessária. Mais sorte tem o núcleo hippie de fãs de UFOs liderados por um inspirado Rhys Ifans, que ofusca geral em cena, menos Hardy.

Por fim, a montagem taquicárdica de Mark Sanger agita Venom: A Última Rodada na medida certa nas múltiplas sensibilidades em que mira, da violência à melancolia. A edição consegue até disfarçar a falta de criatividade na fotografia de Fabian Wagner, excessivamente protocolar. Só que como a natureza dessa cinessérie nunca foi ser inventiva, essa dimensão plástica de visual corriqueiro é perdoável. O empenho dramático de Hardy salva o dia. 

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