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Dying: A Última Sinfonia é um ode à perda da romantização da vida e da morte

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Não é todo dia que um filme como Dying: A Última Sinfonia estreia no nosso circuito, ou mesmo que algo assim sequer é produzido, por mais que, em exemplo, os nórdicos tenham uma relação muito mais despudorada com a morte. Produção alemã vencedora do prêmio de melhor roteiro no último Festival de Berlim, estamos diante de uma obra verdadeiramente desconcertante, onde nós, latinos, temos comunicação truncada com o que é mostrado. Diante da frieza com que relações humanas à beira do desfecho são encenadas, resta ao espectador questionar-se do momento em que tais tessituras foram esgarçando até chegar onde estão, sejam elas coletivas ou individuais. 

Dying: A Última Sinfonia

Matthias Glasner tem aqui o grande filme de uma carreira de quase 40 anos. Ao construir uma ode à perda da romantização da vida e da morte, o diretor consegue extrair o máximo (possível) em expressões humanas do projeto. Dying: A Última Sinfonia é um trabalho maduro sobre um tema incômodo, tratado de maneira bifurcada; tanto existem passagens aparentemente desprovidas de ferocidade, quanto em outras suas emoções se situam no lugar certo da narrativa. Sem qualquer sintoma de didatismo, o filme vende uma propaganda metafórica a respeito do livre arbítrio e da consciência de nossos atos. Aos poucos, mesmo as lacunas aplicadas no roteiro começam a responder questões que o filme traduz em rancores de muitas ordens. 

O filme mapeia as costuras da família Lunies, que flerta constantemente com o desaparecimento, mas que não cessa de minar qualquer novo acordo de paz que possa reconfigurar seu futuro. Os pais de Tom e Ellen estão morrendo, cada um por seu motivo, e a partir dessa informação certeira, Dying: A Última Sinfonia trata de observar os motivos (completos ou não) pelo qual esse quarteto já desencarnou seus afetos há tempo. Sem arrastar uma seleção de amarguras – mas sim, elas existem e não são mascaradas – e mostrando de maneira inteligente as curvas que o roteiro propõe, a narrativa é separada por capítulos, se movendo pelas três horas de duração de maneira sinuosa, ora enchendo a tela de fúria em brasa, ora carregando nossa energia para um excesso de submissão diante da vida. 

Glasner compõe planos econômicos de recursos, onde o que importa na maior parte das vezes é que o espectador encontre a saída mais rápida dentro do que assiste, constantemente incômodo. São recortes muito sucintos de ressentimentos que venceram a força do tempo, e se mantêm intactos ainda hoje, ferindo os envolvidos mutuamente. Para o que observamos dentro de um contrato familiar, Dying: A Última Sinfonia exaspera nossas sensações, levando-nos ao limite dos que nos permite as lembranças particulares.

Não é, apenas, da morte física que o roteiro está tratando, mas talvez principalmente do falecimento das liturgias de encontros, quando nada mais está condicionado ao sucesso. É curioso que tantos passamentos físicos ocorram em Dying quanto nascimentos, e também esses não estão simbolizados de maneira fiel. Glasner monta seu painel sobre a falência das instituições familiares, ao mesmo tempo em que estabelece a construção de novos modelos de interação humana, e que acaba por substituir todos os campos do prazer. Dessa forma, ainda que suas escolhas se conectem ao fim, também é possível observar, dentro de alguns momentos aflitivos, um respiro do horror.

A experiência final de Dying: A Última Sinfonia, no entanto, não poderia guardar mais predicados coletivos. Da direção respeitosa e insinuante dentro de seus códigos até o roteiro que desenha de maneira fina todos os personagens que se descortinam em cena, da criação de momentos especiais em construção imagética até o elenco envolvido de maneira tão melancólica com o que trata. Não é o caso, aqui, de promover uma recomendação sem apontar tais situações que crescem em desesperança da vida em comunidade direta, mas de garantir as recompensas diante desse roteiro exemplar, que sempre encontra a fresta de luz onde só se enxerga trevas. 

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