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Ameaça no Ar: Mel Gibson enverniza os tacos do gênero ação

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Que a correção política não nos escute (ou leia), mas Ameaça no Ar, trash até dizer chega, carrega algo de libertário (e eletrizante) em seus excessos (e muita tosquice). Sob o garrote do moralismo que patrulha o filão thriller, a aposta de seu realizador, o astro Mel Gibson, numa narrativa rascante, de brutalidade sem moderação, bate nas telas como um gesto de audácia. Michelle Dockery sustenta a pouca elegância que o filme, no posto de protagonista, de veia heroica, e Mark Wahlberg se reencontra com a maldade, inspirado, como não fazia desde o suspense noventista Medo, de 1996. O saldo mais valioso desse experimento, despretensioso à primeira vista, é a habilidade de envernizar os tacos do gênero ação.
   
Houve um período histórico para o filão, na indústria do entretenimento, entre 1982 e 1997, no qual Hollywood tratou as tramas de “tiro, pancada e bomba” como biscoito fino, na fase que vai de Rambo – Programado Para Matar, de Ted Kotcheff, até A Outra Face, de John Woo. Nessa época, Gibson tornou-se um sol para as estéticas da porradaria ao criar a persona do vigilante kamikaze na pele do sargento Martin Riggs da franquia “Máquina Mortífera” (1987 – 1998). Encarnava o herói alquebrado na alma que colocava o pesoço na guilhotina na lida do dia a dia. Bruce Willis fazia algo parecido, só que com mais gaitice, em “Duro de Matar” (1988).

Quando passou a dirigir, com O Homem Sem Face (1993), Gibson preferiu conversar com as cartilhas do melodrama, mas não tardou a se lançar nas trilhas do épico com “Coração Valente” (1995), que lhe rendeu o Oscar de Melhor Direção. Seguiu nessa linha com “A Paixão de Cristo” (2004), um esplendoroso corpo a corpo com o Evangelho; com “Apocalypto” (2006), no qual se agarrou à selvageria; e na recriação da II Guerra “Até O Último Homem” (2016), no qual ficou afogado em bom-mocismos um tanto hipócritas. Agora, com “Ameaça no Ar”, o Martin Riggs dentro dele passou a falar mais alto do que sua consciência de “epicizar” feitos. 

Fotografado burocraticamente por Johnny Derango, o novo Gibson acompanha a cilada na qual a agente federal Madelyn Harris (papel de Michelle Dockery) se encontra, em pleno ar, sobre as rochosas montanhas do Alaska, ao levar um contador envolvido com a máfia, Winston (Topher Grace, espertíssimo em cena), para depor. A arapuca é o avião em si, pois o piloto, interpretado por um Mark Wahlberg mau feito pica-pau (com um vistual digno do Hortelino Troca-Letras dos Looney Tunes), almeja matar seus tripulantes. Seus planos transformam a embarcação numa arena (aérea) claustrofóbica, de múltiplas viradas no roteiro de Jared Rosenberg.

O script de Ameaça no Ar tem furos imperdoáveis, muitos deles risíveis, a se destacar uma situação com um celular que beira o ridículo, mas se salva dele pela credibilidade que Dockery imprime. Apesar das imperfeições nas quais incorre, Rosenberg monta uma estrutura firme, que lembra o Brian De Palma sinestésico de “Um Tiro Na Noite” (1981), não só pela pressão, mas por incorrer num enredo de enganos e surpresas. Gibson preserva seu apuro na aposta em engenharias sonoras sofisticadas, o que amplia o prazer deste espetáculo torto, mas inquietante.   

Sob a afiada guilhotina do politicamente correto, o cinema de ação soube se reciclar pelo advento de uma estética cinemática, de puro movimento, como se fosse um desenho do Papa-Léguas, com a franquia “John Wick”, coroando um ex-dublê, Chad Stahelski, como diretor autor. Gibson não se embrenha nesse caminho, optando por veredas mais convencionais, mas é capaz de refrescá-las com sua destreza. 

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