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Sing Sing, de Greg Kwedar, aborda a resiliência e o poder da arte

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Sing Sing é, por assim dizer, um “filme velho”. Explico: estreando no Festival de Toronto de 2023, o filme foi comprado pela A24 e logo engavetado e não lançado na temporada passada, aquela dominada por Oppenheimer. Recebeu estreia marcada nos EUA para julho do ano passado, uma data meio inglória para filmes que pleiteiam indicações na temporada de prêmios, mas a distribuidora vinha de uma temporada anterior acertada, onde Vidas Passadas havia sido lançado exatamente no mesmo período, e conseguido suas indicações. Após a estreia onde críticos estadunidenses juravam se tratar do ‘vencedor do próximo Oscar de melhor filme’, a própria crítica acabou por não dar muita atenção ao filme. O resultado foi o que se viu, três indicações ao Oscar (melhor ator, melhor roteiro adaptado e melhor canção), onde não há chance de qualquer delas se transformar em vitória. 

Não existe uma fórmula certa, para se conseguir indicações e vitórias nessas temporadas, ou uma maneira de compreender o comportamento coletivo que determina tais resultados. Estreando essa semana nos cinemas, Sing Sing é um filme dos mais agradáveis de assistir durante essa temporada de premiações, uma produção de fácil acesso ao espectador que não esteja em busca de um tratado hermético disfarçado de cinema. Seu diretor, Greg Kwedar, nos apresenta de maneira afetuosa aos tipos que circulam pelo filme, e nos insere em um contexto que poderia ser de revolta – nos prepara para isso, inclusive – mas acerta-nos com uma dose ilimitada de compaixão pelo que vemos, por seus personagens e sua ânsia pela liberdade na acepção mais literal da palavra. 

Baseado em um livro que foi inspirado em eventos reais acontecidos na prisão de mesmo nome, Sing Sing tem um pulo do gato que o torna especial, e encantador. Situado nos corredores do sistema prisional, o filme acompanha um grupo de encarcerados que têm costumeiramente aulas de teatro que resultam, ao fim de cada ciclo, em uma apresentação teatral onde o grupo monta um espetáculo diferente. Aliás, o que promove a produção é a presença, em cena, de grande parte do grupo que estava verdadeiramente encarcerado, mimetizando versões de si mesmos e produzindo, na frente das câmeras, a realidade que eles presenciaram durante boa parte de suas vidas. Apenas três atores profissionais (e reconhecidos) estavam entre eles – Sean San José, Paul Raci (indicado ao Oscar por O Som do Silêncio) e o astro Colman Domingo, que conseguiu nova indicação aqui. 

A integração entre todos é tão profunda, no entanto, que um espectador menos experimentado pode ver o que acompanhamos como um documentário, ou de um grupo inteiro retirado do mesmo propósito. Isso se dá pela qualidade com que Kwedar comanda aquele espetáculo, que lida com um conceito de teatralização diferente do que o cinema costuma adentrar. Isso porque o interesse de Sing Sing é nas relações humanas que brotam daquelas interações, e isso é deflagrado pela chegada de ‘Divine Eye’ ao grupo. Ele é a figura que se aproxima do grupo e torna o espectador cúmplice do que está acontecendo, apresentando a narrativa para o exterior. Se essa ferramenta de roteiro é banal, o filme utiliza-se dela da melhor maneira possível, porque também permite ao público uma forma de se aproximar do campo do teatro, de suas normas e de algumas diretrizes. 

O resultado é uma produção simples e muito eficaz no que encampa, com uma singeleza na maneira como constrói os laços que apresenta, e na maneira como procura assentar seu olhar para a amizade que brota de maneira genuína ali, um ambiente sem qualquer resquício de afeto. Através do talento bruto que esses homens apresentam, com maior ou menor experiência física de palco, observamos o lugar mais primordial de um ator, e de como o talento, a inspiração e a vocação independem do lugar de onde viemos. Em algum ponto, focos de Um Sonho de Liberdade ecoam, e não há maior elogio do que aproximar qualquer que seja o filme de uma comparação com o clássico de Frank Darabont. 

Isso acontece justamente porque no centro da narrativa está esse já citado senso de companheirismo estabelecido, aos poucos. Com uma performance tocante de San José que fica ainda mais lírica na segunda metade, existem na centralidade Colman Domingo e Clarence Maclin. O segundo é a versão formal de ‘Divine Eye’ interpretando a própria trajetória, em uma entrega dolorida de acompanhar, mas amplamente reconfortante, a cada vez que Sing Sing se aproxima desses dois homens. Tem a ver com a forma com que a escapatória é encarada por cada um deles, mas justamente nas diferenças que os unem, que toca e emociona. Se não é mais marcante e profundo, ao mesmo tempo não deixa qualquer um que o assista menos envolvido em como Kwedar se apresenta em seu segundo longa, mostrando um brilho na forma que conduz um espetáculo que poderia ser difícil e árido, em algo oposto a isso. 

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