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Maré Alta: Marco Pigossi emociona em seu primeiro longa como protagonista

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Estreia na direção de longas metragens de Marco Calvani, Maré Alta não tem muitos pares para espelhar uma exemplificação. O cinema LGBTQIAPN+ parece funcionar apenas para reforçar discursos, e essa é uma posição que se afirma de maneira positiva ou negativa. Se por um lado temos o reforço de olhares assertivos a respeito da nossa própria existência, também observamos a confirmação de estereótipos que só servem para julgar, a nós ou aos espaços que circulamos. As produções ora são leves e despreocupadas, geralmente solares e cheias de vida, ou disfarçam sua densidade com cores cinzas, dias nublados e atmosfera melancólica. Em alguns projetos inclusive demarcam os momentos onde as coisas precisam ser de um jeito ou de outro. 

Maré Alta

Calvani tem formação teatral como dramaturgo, diretor e ator, e talvez por isso seus atores aqui estejam tão à vontade na forma como se posicionam, uns aos outros ou nos espaços ocupados. Em seu primeiro título no cinema, o cineasta italiano não foge dos espinhos de sua narrativa, mas escolhe fazê-lo quase sempre à luz do dia, em meio a cenários naturais e abertos, criando uma aura de conforto para o que está sendo contado, que nem sempre tem sutileza emocional. Maré Alta é uma produção muito honesta e frontal sobre o que enfrenta homens gays de idades diversas em relações amorosas, ainda que conte com um foco bastante específico, etária e social. 

Digo isso tudo simplesmente porque, em meio a tantas produções “honestas, cheias de significado e sensíveis” envolvendo pessoas heterossexuais, nunca será demais quantos filmes ‘queer’ estrearem. O que Maré Alta tem de especial, além de tratar com humanidade e respeito os sentimentos verdadeiros de pessoas que perderam um grande amor e caíram em uma espécie de pré-depressão? Eu diria que isso por si só já é notável, em sua busca pelos espaços de pertencimento que estamos diariamente lutando por. Por mais minúsculos que possam ser acusados filmes como Do Outro Lado da Dor ou Our Son, que tratam com sobriedade temas como o luto e o divórcio; particularmente, acho que “tais filmes simples”, não tem nada para serem chamados assim. 

Maré Alta conta, a princípio, a história de Lourenço, jovem brasileiro em problemas com o visto nos EUA, vivendo em Provincetown, considerada uma das vilas mais abertamente ‘queer’ da América do Norte. Mas não é só isso: Lourenço acabou de ser abandonado por Joe, e agora vive de favor nos fundos da casa de um amigo de seu ex-namorado. Claramente abalado, Lourenço vive em uma comunidade à beira-mar com problemas até prosaicos, mas absolutamente verdadeiros. Marco Pigossi, em sua estreia em uma produção de longa-metragem globalizada, entende em absoluto seu personagem e o vive com entrega emocionante. Reencontrar o amor, que parece sempre estar à espreita, é apenas mais um dado de uma cadeia de eventos que não para de se mover. A vida é assim, né?

Tão envolvidos com a sinceridade do projeto, a dupla de Marcos (que na vida real é um casal) não percebe que seu filme incorre em diversas facilitações de roteiro que o deixam mais próximo de clichês mais tradicionais do que o filme gostaria de aparentar. Iguais aos entraves da direção, porque Maré Alta não tem um bom apuro no que vemos, parecendo que a sensibilidade com que é nutrido vários momentos não deixaram perceber que muitas vezes faltou arrojo na decupagem, ou entender que histórias “banais” envolvendo pessoinhas reais como as encenadas por Mike Leigh, Kenneth Lonergan ou Noah Baumbach, não pode ser desprovida de arestas técnicas. É um resultado ligeiramente agridoce, quando somos envolvidos pela natureza do que é contado, sem deixar de perceber o que os lugares que o filme deixa desguarnecidos. 

Com um elenco coadjuvante que inclui as estrelas Marisa Tomei e Bill Irwin muito bem em seus tipos, eles servem como complemento de uma abordagem bastante precisa sobre esse jovem assolado pelos contratempos diários de uma existência. É isso que, certamente, coloca Maré Alta ainda em um espaço de reconhecimento dos valores que estão sendo perseguidos, e alcançados em resultado final. Se a contrapartida da realização não sustenta as qualidades que seu relevo pediria, ainda assim é possível encontrar pontos de veracidade em seu registro. Isso é um ponto pra lá de positivo, que o filme consiga sustentar seu interesse do início ao fim graças ao olhar carinhoso que lança para as pessoas que precisam de um abraço, e que Pigossi entrega em seu estado mais puro de compreensão. 

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