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Caiam as rosas brancas!: Albertina Carri faz recorte feminista

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Albertina Carri é uma cineasta argentina experiente, que já rodou por grande parte dos festivais internacionais, como Cannes, Berlim, Rotterdam e Locarno. Em seu sétimo longa metragem para o cinema, essa estreia Caiam as Rosas Brancas!, ela volta a realizar uma obra em co-produção com o Brasil e a Espanha, com detalhes que estavam presentes em seu longa anterior, As Filhas do Fogo, e que movem a arte que exerce. Raras são as vozes como a dela a conseguir espaço no circuito exibidor de hoje, e isso é essencialmente uma qualidade não apenas sua, como a da distribuidora em apostar em uma estreia aqui que permita um filme fora dos padrões como esse chegar ao espectador. Os olhos e a experimentação de um cinéfilo devem estar preparados para uma experiência com esse recorte.

Do ponto de vista do teor estético, creio que o filme anterior de Carri representava um avanço mais particular, com descobertas visuais e uma tentativa de entregar ao público uma voz pouco esperada. Aqui, a diretora permite que seu olhar feminista converse mais com elementos essenciais, como a integração entre outros seres vivos e que conectam sensações de diversas ordens. Existe um estranhamento natural que é possibilitado de maneira sutil dentro de Caiam as Rosas Brancas!, porque estamos diante de um experimento de cinema que nos permite julgar a obra diante de parâmetros menos quadrados. Não existe uma poética narrativa em cena, mas um lugar que se permite menos viciado nas relações humanas, ainda assim ameaçado pela violência da normatividade. 

Mesmo o ‘cinema de invenção’ é tratado como um espaço que não permite reais inserções para a inovação, não em um campo já viciado de suas normas. Diante disso, é uma provocação viável que Caiam as Rosas Brancas! seja aberto com sua protagonista fugindo de uma nova produção, onde não consegue espaço para expandir sua autoralidade. Nesse ato de rebeldia, ela carrega consigo outras três mulheres para uma jornada que parece ter um propósito concreto, mas acaba se mostrando uma jornada de conhecimento de nossas capacidades diante do que é orgânico. Ou seja, o cinema de autor também é vítima dos próprios esquemas que criou, e que só a fuga para algo verdadeiramente novo e disruptivo pode trazer de volta a real inventividade. 

Caiam as Rosas Brancas! é um filme de corporeidade inegável, mas também age através de uma sensibilidade tátil, que não se fixa em um lugar do onírico, apenas. Suas personagens não estão em um lugar idílico, da geografia ou do pensamento, mas sim em busca de ir além de onde estão. Por isso o deslocamento, por isso a intenção das novas interações, por isso a busca por algo que realmente as desafie, ao contrário de uma arte cuja liberdade é ilusória. Ao longo do percurso, elas não encontrarão apenas outros corpos que as coloquem em contato com a certeza do que fazem, mas a lembrança de um histórico de violência patriarcal nos ambientes mais tradicionais. A cena da madrugada na casa remete a algo infelizmente tão comum a mulheres, perseguidas pelo horror de uma masculinidade que não cede. 

Ao contrário de seu filme anterior, a sexualidade aqui é exercida de maneira menos explícita. Sim, Caiam as Rosas Brancas! é um filme lésbico, 100% estrelado por mulheres, onde a maior parte de suas funções é exercida por mulheres, mas não existe aqui o teor abertamente erótico que motivava o anterior. Se por um lado esse não era um aspecto da produção que definisse o filme, aqui Carri acaba por permitir que um olhar para outras vertentes se realizem. Como o cinema de gênero, onde o suspense e uma pontada de ficção científica se entrelaçam ao contexto geral. Isso permite uma maior possibilidades ao título, ainda que sua permissividade para a disrupção criem na obra algumas tentativas de eco, não-concluídas. Ao redor do que é naturalista, o filme não funciona tão assertivamente, como em tudo que cerca a internação de uma das personagens. 

Com fotografia de Wilssa Esser (de Lispectorante) e participação de Renata Carvalho (de Os Últimos Soldados), Caiam as Rosas Brancas! faz assim valer o que é brasileiro no caráter da co-produção, além de ter um bloco final passado em São Paulo. Isso não aproxima exatamente o nosso público de um filme que precisa ser apreciado com moderação, porque se pretende muito mais difuso. É verdade que é dada muito mais atenção nos símbolos do que em um ponto concreto, e isso permite ao filme um vácuo em determinados momentos, mas não tira de seu teor de experimentação o frescor que procura. Albertina Carri está em processo de especialização de uma linguagem particular e uma visão de cinema que poucos artistas se permitem hoje.

 

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