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Na Teia da Aranha: Kim Jee-woon faz uso da satira para falar do Regime Militar

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O cinema sul-coreano vive uma lua de mel ininterrupta há mais de vinte anos, não apenas internamente como principalmente na percepção internacional. A cada novo cineasta surgido e a cada novo sucesso que escapa de algum festival, precisamos nos dar conta de cineastas que já entregam qualidade faz tempo. O caso de Kim Jee-woon é curioso: dono de uma filmografia celebrada, inclusive no Brasil, finalmente terá um filme seu estreado nos cinemas aqui, Na Teia da Aranha. Homônimo em português de um filme de suspense policial de vinte e cinco anos atrás protagonizado por Morgan Freeman, não confundam as produções e nem julguem esse título pela carreira de Kim, que passeia por lugares muito diferentes entre si, mas que sempre tem alguma comunicação entre seus temas. 

Na Teia da Aranha

A violência é uma vertente que ele utiliza com frequência, e talvez aqui esse seja um elemento pouco utilizado, para além da psicológica. Embora sua direção e roteiros geralmente atestem alguma conexão com o Cinema, realizar enfim um filme sobre a produção de outro, em exercício de metalinguagem bastante divertido, é uma adição à percepção que temos a seu respeito. Já que esse lugar explícito da violência não está escancarado aqui, Kim utiliza outro gênero que costuma bancar, de maneira mais frontal aqui, a comédia. O resultado é uma produção híbrida, que lida de maneiras muito fortes com o fazer cinematográfico, metaforizando as situações dentro de um quadro que só se expande para o delírio. 

Partindo dos princípios da metalinguagem, onde Kim constrói não apenas Na Teia da Aranha como também o filme que está sendo realizado dentro do filme, o que é feito aqui ultrapassa alguns limites de uma tradição desse subgênero. Podemos dizer que o diretor era admirador profundo de David Lynch? Provavelmente. Suas curvas narrativas não são bem delineadas, e o filme busca essa confusão com seu andamento; essa busca é realizada também dentro do filme que estamos vendo. A conversa entre o que vemos e o que é feito é contínua, e as sensações que seus personagens experimentam refletem também o que é descoberto pelo espectador. Se nem sempre essa confusão é esclarecida, também parece ser o propósito da obra. Ou de ambas. 

No roteiro, um diretor de cinema consagrado se sente acuado por acusações que ele considera injustas em relação ao seu último filme; é considerado ultrapassado, um dramalhão antiquado. Quando termina as filmagens de sua próxima produção, ele tem sonhos onde imagina um novo final para o filme. Imediatamente convoca toda a equipe para mudar o desfecho, porque acredita que tais informações não apenas mudarão o que já foi gravado, como a percepção para sua filmografia. Em tese, Na Teia da Aranha, por trás da fantasia liberada por estampar o ato de filmar como seu desenvolvimento narrativo, está essencialmente falando sobre o ego na indústria cinematográfica, a princípio. Aos poucos, essa situação vai abrindo portas para que se conectem os universos que o filme descortina, e essa discussão mais particular, onde são unidos gêneros de cinema, como a comédia, o noir, a fantasia e o experimentalismo. 

Como trata-se de um diretor experiente, que já passou anteriormente por outros códigos de linguagem, Na Teia da Aranha não carece de cuidado imagético, ou de implicações mais profundas que dizem respeito à sua construção. No lugar disso, temos um campo mais livre de absorção de ideias, que se abre de maneira mais lógica, com suas chaves concretas, até abrir mão do que poderia ser mais fácil para se ater em uma proposta de desconstrução. Dessa forma, Kim se permite brincar com as possibilidades da imagem e do discurso, sem uma ideia concebida de estrutura. A instrução (se é que dentro do trabalho crítico cabe uma) é esperar um mergulho menos sólido da obra, e deixar-se levar pelo sensorial, por imagens que conversem com sutileza pela ordem. 

Liderando o elenco, Song Kang-Ho é mais uma vez o porta-voz de um projeto. Após brilhar em Parasita e ganhar o prêmio de atuação em Cannes por Broker, o ator parece ter se tornado uma espécie de talismã da Coreia do Sul, e quem o faz está certo. Aqui em Na Teia da Aranha, por exemplo, é sua credibilidade que habilita o filme a trafegar por mares menos plácidos. Sua postura é segura diante do caos, e seu rosto acaba convencendo o público a respeito das situações que podem não significar tranquilidade. Não é comum que títulos como esse cheguem ao nosso circuito, ainda que sob o respaldo do que tem criado de respeitabilidade o cinema sul-coreano por aqui; encarando os caminhos fantásticos que o filme abraça aos poucos com liberdade de aceitação, o saldo é amplamente positivo. 

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