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Amores Materialistas: Novo filme de Celine Song traz visão pragmática do amor

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Dentro de uma relação amoroso, o amor propriamente dito é só um dos elementos que se empregam na constituição desse, digamos, negócio. Aliás, dizem que o amor romântico foi inventado pelo cinema, por Hollywood, pela literatura, ou seja, pela arte, e, de fato, os casamentos até pouco tempo atrás, eram formas de formalizar acordos, concretizar alianças, ou mesmo selar uniões de outra espécie, que não as de origem emocionais. Em Amores Materialistas, o modelo de amor que o cinema vende aos seus espectadores, é colocado, à princípio, em uma outra seara, e isso parte da própria protagonista da produção. Lucy é uma casamenteira profissional, que trabalha em um site criado para aproximar pessoas a partir de suas afinidades, e onde as ferramentas do romance não são a porta de entrada para solidificar resultados. 

O olhar sobre as casamenteiras não é inédito no cinema estadunidense, tendo sido a matéria-prima de um dos grandes sucessos de bilheteria de Jennifer Lopez, O Casamento dos Meus Sonhos. Ao contrário de lá, aqui a comédia romântica tem uma abordagem sutilmente diferenciada, embora o material de marketing induza ao contrário. Isso porque o olhar sobre as relações humanas construídas com base em algum afeto tem abordagem mais discursiva aqui; se a tradução for reflexiva, também está dentro do campo da verdade. Desde o quadro de abertura, onde um casal pré-histórico é a base da construção da ideia da protagonista (e retorna ao final para mais uma vez corroborar sua visão, já modificada), percebemos que Amores Materialistas busca o grande público, mas isso entra em contradição com sua própria autora.

Estamos falando de Celine Song, que assina a direção e o roteiro, assim como em seu filme anterior, Vidas Passadas, pelo qual foi indicada ao Oscar, uma das obras mais elogiadas dos últimos anos, e um exemplar de um cinema indie agridoce. Essa palavra está na ordem do dia em Amores Materialistas, para assegurar o olhar de sua autoria no projeto. A visão pragmática a respeito das relações ditas românticas de Lucy, e a forma como isso se costura a partir de seu encontro com o milionário Harry, desenha uma maneira menos explícita de comunicação dentro do cinema blockbuster. Existe um aprofundamento quase filosófico no que é dito, e uma visão menos edulcorada das imagens, em trabalho de direção que não lembra o que geralmente é feito no gênero, sem apuro em grande parte do tempo. 

Song acredita no que Lucy fala, porque compra sua personagem sem pudores. Sua visão sem firulas do amor, que seria apenas um dos muitos elementos presentes em uma relação onde se pretende união estável, é compromissada e esclarecida, ao mesmo tempo em que reflete uma criação crua. A forma como os diálogos e o próprio tratamento imagético da primeira hora se incumbem de um cinema (e uma porção) menos fantasiosa a respeito do romance são tão bem delineados, que o espectador é facilmente levado a compreender esse universo onde a protagonista vive. Ainda que o filme sugira algumas setas na direção esperada, a forma como os eventos são encadeados, e a maneira pouco eufórica com que as situações se formam, mostram que sua cineasta tem um ponto a defender como autora. 

No entanto, os 40 minutos finais de Amores Materialistas, ainda que modulados de maneira áspera, acabam por ceder aos ideais mais tradicionais possíveis, incluindo a visão que me cansa um bocado a respeito de um certo menosprezo pelo dinheiro e pela forma fácil com que ele é taxado negativamente. Essa é uma tradição das menos inspiradas do tradicional cinema americano, e que me incomoda bastante, a de que a felicidade só é conseguida quando o material for demonizado, e encarado como grave impedimento. Sim, Song filma com desprendimento real do que é mais óbvio na beleza, mas isso é insuficiente se os argumentos para se encerrar uma discussão são mais tradicionais. Mas creio que o incômodo real seja a contradição da construção para a resolução, sem que estejam agudos os motivos para essa levada. 

O trio de protagonistas (Dakota Johnson, Chris Evans e Pedro Pascal) estão bem e cuidam para que o filme nunca perca sua dose de charme. Talvez o que mais toque Amores Materialistas em um lugar errático nem seja o trabalho anterior de Song, mas o fato de que ela tenta disfarçar o que precisa contar aqui, ao fim e ao cabo. A ideia acaba por ficar no meio do caminho; nem se trata de um título requintado com saídas inesperadas, nem estamos diante de uma comédia romântica deliciosa que embale nossos prazeres culpados. Ainda que não decepcione, alguma dose de coragem faltou a produção; quando olhamos para 1997 e lembramos que há quase 30 anos um filme como O Casamento do Meu Melhor Amigo subvertia tudo o que o cinema de larga escala apregoava dentro da própria indústria, o trabalho de Celine Song parece ainda mais tímido. 

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