- Publicidade -

O Telefone Preto 2: Scott Derrickson ousa na sequencia mais aterrorizante

Publicado em:

O que pode ser mais benéfico a uma continuação, não mexer no time que ganhou – e isso significaria o que, em muitos casos, seria a repetição de fórmula e conteúdo – ou partir para um ponto de partida distinto, quase como um tiro em um escuro familiar? Seja como for, mudar a essência da matéria-prima talvez seja o risco maior que uma intencional franquia poderia cometer, e é exatamente esse lugar que é ocupado por O Telefone Preto 2. Sem medo de ousar, o diretor Scott Derrickson mais uma vez mostra porque é necessário atenção ao seu trabalho, às dimensões que ele avança, e principalmente à experimentação, que é ponto pacífico em sua filmografia. Mas esse talvez seja seu movimento mais agudo, porque trata-se de um mergulho quase inverso dentro de uma possibilidade que ele já tinha apresentado, com outra proposta.

Depois de estrear em longas com duas continuações para ‘home video’ de êxitos de outrora (Lenda Urbana Hellraiser), o diretor aponta no cinema com um dos filmes de gênero mais marcantes dos últimos 20 anos: O Exorcismo de Emily Rose. De lá pra cá, seu olhar se sofisticou sem abandonar suas origens no terror, chegando até esse cálculo arriscado que ele lança agora. Um sucesso inegável, o primeiro O Telefone Preto mistura violência psicológica contra crianças a um toque de fábula para contar a história de um assassino de crianças que era ameaçado pelo além. De construção imagética espantosa, o filme quase surge como um milagre para um filme de grande estúdio. O que está em primeiro plano aqui é o que estava sendo gestado pelo diretor em segredo: ele não queria em 2021 contar uma história, mas sim criar um mito. 

Dos pés fincados em uma lógica naturalista para um filme de gênero, que abraça o horror gráfico e uma possibilidade fantástica, Derrickson parte para uma história de origem em O Telefone Preto 2, indo para um passado 25 anos antes dos eventos do tomo, ao abraçar a fábula já de cara, sem pensar muito. Isso reconfigura a jornada inicial, ao mesmo tempo em que a nova programação desenha um caminho onde O Sequestrador não é mais vestido como um homem comum, mas uma lenda do horror, escalando gradativamente os pontos de alucinação. O resultado causa um benéfico estranhamento ao espectador, que pode não se situar com o que vê. Mas os pontos fazem sentido durante o caminho, para mais uma vez reverenciar quem veio antes de nós, no cinema. 

Quem assistiu ao longa anterior, sabe que o serial killer morre ao final da jornada, então por si só a feitura de um O Telefone Preto 2 já estaria incumbido de um desafio, mas ao longo da projeção entendemos que Derrickson não brincou em serviço, nem mesmo para com o fim do Sequestrador. Porque sua ideia, caso viesse o sucesso do filme, viria elevar o jogo para fora daquele contexto fechado. Lembrando que o primeiro filme tinha outra questão para lidar, o protagonismo por uma dupla de crianças, que obviamente cresceu. Logo, o filme se abre para esses 25 anos anteriores onde o surgimento desse homem terrível tinha camadas que o montasse como algo hediondo. A partir daí, toda a trajetória do filme é para apresentar não mais um assassino, e sim uma entidade – superior à morte. 

Dessa forma, Derrickson se vale de inspirações que o acompanharam desde a infância, e que funciona com qualquer adolescente ligado ao cinema de gênero. Estão dispostos Sexta-Feira 13A Hora do Pesadelo e a pulsação de outros filmes, como Carrie; isso é uma assertividade concreta que pretende também unir a figura do Sequestrador à outros mitos, como Jason Voorhees e Freddy Krueger. Ou seja, a ideia de uma produção que também abrace as conotações de Stranger Things  não se situa como desconectada de uma ideia. O problema dessa ambição é que o filme com clareza mostra uma espécie de manual de instruções para ser feito, por causa de sua estrutura tão precisa, e ao mesmo tempo com os dois pés na fábula. Sinto falta da roupagem mais artesanal que tínhamos a quatro anos atrás, mas precisamos compreender a opção criativa e narrativa do todo como algo minucioso.

O crescimento dos bastante talentosos Mason Thames e Madeleine McGraw não tirou talento deles, mas a verdade é que as interpretações aqui tem menos peso para o cômputo geral, porque estamos diante de uma jornada de construção de autoralidade, quer queiramos ou não. O trabalho solitário de Derrickson enquanto autor é também desafiado, e ganha contornos bastante inesperados, como no abraço frontal a 1982, o novo ano retratado, e a época dos efeitos práticos que substituíram a sugestão. Uma sequência em especial é resolvida com brilhantismo à luz da época, terminando no corte de um rosto que fará qualquer fã do período sorrir com cumplicidade e saudosismo. 

Esse é, na verdade, o molho do filme como um todo. Avançar nos anos, e remontar aqui uma nova costura para o terror, com a adição de um propósito maior que o roteiro. Já não faz mais tanto sentido a replicação do primeiro filme em carregar o espectador para dentro dos noticiários policiais setentistas, mas sim levar pela mão esse mesmo público, mas dessa vez para a magia da criação cinematográfica. Os prós são a provocação per se, os códigos dispostos na nossa frente, e os contras são a formatação igualmente artificial dessa moldura. Na balança de resultados, a qualidade e o prazer se sobressaem, mas discordo de quem coloca o original abaixo, porque lá a busca era por um modelo único. Em O Telefone Preto 2, o foco é a manutenção do amanhã no cinema, ainda que bebendo mais uma vez de resgates do passado. 

Mais Notícias

Nossas Redes

2,459FansGostar
216SeguidoresSeguir
125InscritosInscrever
4.310 Seguidores
Seguir
- Publicidade -