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Sombras no Deserto bebe de fontes bíblicas para instaurar uma narrativa de horror

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São filmes como Sombras no Deserto que criam a impressão errada disseminada entre a cinefilia acerca de Nicolas Cage. Antes que todos apontem o contrário, Cage é um dos mais interessantes atores a surgir no cinema estadunidense no seu tempo. Suas escolhas nunca o colocam dentro de um escopo esperado; estamos falando de um merecido vencedor do Oscar (por Despedida em Las Vegas) que não opta pelo caminho mais fácil na hora de determinar o futuro de sua carreira. Isso já o levou a encarar projetos inacreditavelmente desnecessários, como Ligação Sombria, ou de voltar a ser indicado a prêmios, como em O Homem dos Sonhos. Seu novo filme que estreia essa semana se situa entre as produções inexplicáveis, ainda que nunca deixe de suscitar curiosidade. 

Trata-se de um projeto que bebe de fontes bíblicas para instaurar uma narrativa de horror que, embora possa ser encarada como uma possível história que investiga as provações encaradas por Jesus, logo em sua cartela inicial explica que os eventos mostrados se passam 11 anos depois de Cristo. Logo, trata-se de uma provocação com o cristianismo e seus muitos desdobramentos, mas que opta pelo terreno seguro da ausência da ousadia efetiva. Ou seja, o filme não banca sua teoria até as últimas consequências, perdendo assim sua proposta mais divertida. Liberando o roteiro para tratar-se de qualquer relação de ordem religiosa acerca de qualquer família da época, Sombras no Deserto não banca até o fim sua alfinetada.

Na tela, uma mulher dá à luz a um bebê em período de dominação do Império Romano, que sacrificava os recém-nascidos em fogueiras. Recomeçando a vida em uma outra cidade ao lado do marido e do filho, Sombras no Deserto escala O Menino como o protagonista da história, já um adolescente com questões acerca de sua real paternidade, e tentado por outra adolescente com intenções sombrias. Como todo adolescente, ele se rebela contra a educação e os conselhos que recebe dos pais, e começa a observar os poderes de cura que lhe escapam. Esse é o ponto de partida de um projeto que prima pela estranheza, mas não é como se tal fosse proveniente do roteiro, mas sim da escolha pelo projeto como um todo. 

Algum espectador esperaria assistir a um filme que pudesse ser definido como um horror bíblico em pleno 2025? Pois a coleção de projetos bizarros de Cage nos levam a encontrar coisas que saem dos trilhos, muitas vezes; Sombras no Deserto poderia ser a prova de que o cinema anda muito comportado, e que uma sacudida de vez em quando provaria o quanto o circuito encaretou. Mas o diretor e roteirista Lotfy Nathan não se mostra preparado para o peso de uma narrativa tão incomum. Com a base sinistra que tinha, o que provavelmente seria a saída para o projeto era tornar gráfico tudo o que eventualmente era desejo reprimido, dos personagens e da realização. O resultado decepciona pela maneira comedida com que os eventos são tratados. 

A coragem para a apresentação do projeto, sua gana de mergulhar fundo na ideia que era desenvolvida, ficou de fora da concepção final do filme. Nesse sentido, sobra a frustração de nunca sentir a pegada intensa que estaria na base das intenções. Sombras no Deserto poderia assemelhar-se a um mergulhador travado diante das possibilidades oceânicas; um filme que contempla seus temas, mas não consegue ter a bravura de levar até os últimos limites a proposta. No passado, filmes que contaram com uma aproximação entre histórias dos testamentos (velho ou novo) e alguma ousadia narrativa, pagaram o preço do apedrejamento comercial. Na ânsia de entregar um material intenso que se vẽ compelido a não comprar as brigas necessárias, a produção vive um eterno ‘quase’. 

Cage, em seu lugar, compreende que esse projeto precisava de alguma fúria, que não poderia ser controlada pelas imagens. Se jogando sem proteção, o ator acerta a apontar os caminhos disruptivos que Sombras no Deserto pediria, mas seus esforços soam deslocados dentro do filme bege que é apresentado. Ainda é sadio acompanharmos o crescimento de Noah Jupe (de Um Lugar Silencioso) e a cantora FKA Twigs também confirma as péssimas impressões deixadas em O Corvo. Os atores fazem exatamente o que se esperaria deles, para o bem e para o mal, e o filme ainda revela uma delicada Isla Johnston em sua estreia na tela grande. O resultado é um curioso desacerto, que não consegue primar pelo que se espera de algo com suas características, mas que estranhamente nos mantém fixados no momento seguinte. 

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