- Publicidade -

SEXA descortina temas caros à mulher, com olhar artesanal

Publicado em:

É saudável que uma atriz com o poder de barganha de Glória Pires escolha estrear como diretora, e com isso possa não apenas contar as histórias que melhor lhe convém, mas também encarar a indústria a partir de um novo ponto de vista. Sexa é mais do que sua estreia atrás das câmeras, é principalmente uma espécie de assinatura sua em relação às faltas em um espaço de entretenimento onde ela literalmente cresceu. Existe toda uma indústria da comédia romântica idealizada pelo cinema americano que privilegia o encontro fácil entre um homem e uma mulher, jovens e disponíveis, com a vida inteira pela frente, apesar do mote de cada história. O que Glória está dizendo aqui com seu filme é que essa história não está sendo contada, e, certamente, não está mesmo.

O olhar que uma mulher tem para si é impingido pela sociedade, que a coloca na berlinda o tempo inteiro: você está no tempo certo?, você se cuida o suficiente?, o mercado está preparado para uma mulher independente como você?, sua família é um empecilho para sua felicidade? São inúmeras as questões que Sexa tenta decifrar. Aliás, o intuito não é referendar um tratado documental acerca de temas caros à mulher, mas lidar com os mesmos com a importância que eles merecem, sempre criando um ambiente onde a ficção imprime tanta discussão quanto um viés jornalístico. O resultado é um filme que não se segura nos padrões comuns ao cinema em larga escala brasileiro, e sim tenta descortinar um olhar artesanal para uma rotina cinematográfica exausta. 

Algo que fica bastante claro é a construção da misè-en-scene no que tange seus diálogos, que é uma pedra no sapato do cinema brasileiro industrial. Comédias brasileiras, geralmente, tem um olhar para recusar o que é feito na atmosfera mais naturalista do audiovisual, e para isso a realização costuma apostar em uma dinâmica extremamente artificial que remete aos primórdios da televisão, onde cada personagem tem marcações de fala muito evidentes. Sexa ressignifica esses códigos, apostando em interações reais entre personagens o mais reais possíveis. É uma grata surpresa que o filme passeie por um lugar onde o som coabita um espaço de credibilidade ao projeto, mostrando seus agrupamentos muito críveis. 

O que causa estranhamento é Glória ser entusiasta do projeto, capitanear seus eventos, de estarmos em um ambiente favorável ao feminino, e a assinatura do roteiro ter sido confiada a um homem, no caso Guilherme Gonzalez. Já premiado no teatro e com várias grandes novelas no currículo como ator (entre elas, Sangue Bom Bom Sucesso, ), Gonzalez, enquanto figura masculina, não é quem se esperaria para assinar o roteiro de algo como Sexa. Ainda assim, não podemos dizer que sua protagonista não é delineada com exatidão em todas as nuances e predicados. Assim como os homens em cena não são exatamente modelos de comportamento, ou de decisões que os abonem. Ainda assim, entre todos em cena, um tipo ao menos chama a atenção, ainda que negativamente. 

Em tempos onde falta dinheiro para quase todos, é fácil compreender a situação de Rodrigo; difícil é ter qualquer empatia com suas atitudes. Em um filme rodeado de energia feminina, de um olhar absolutamente enraizado de cultura da positividade do passar do tempo sem esquecer dos problemas do mesmo, o filho de Bárbara, é um dos raros homens em cena a empreender etarismo (sim, contra a própria mãe) e exercer um papel doutrinador com as mulheres em seu entorno. Obviamente que não precisa de qualquer cartilha para entendê-lo como nocivo, pois o personagem, que é um símbolo do nosso tempo, infelizmente, vai até as raias do horror para exercer um papel tóxico. Na ordem do roteiro, ele é a imagem social que interage com Bárbara, que a diminui em suas potencialidades, que rechaça seus feitos, mas que não pode recusar seus esforços. Também parte dele o trampolim para que ela se liberte do mesmo, através de cenas cada vez mais absurdas que ele perpetra. 

Em seu lugar como atriz, Glória mais uma vez tem carisma e compreensão ímpar do que está realizando. Vê-la nesse lugar duplo, sem ratear em qualquer que seja o espaço e ainda encontrar uma zona de brilho para ambos, é um achado particular. 

Sexa na verdade não deixa de ser um filme que já vimos antes, ainda que em profusão muito menor do que o tema pediria. O que nos enche de alegria ao nos depararmos com ele é essa sensação de frescor de realização que ele possui, e que guarda para sua estrela um lugar que não precisava ser tão caprichado quanto acaba sendo. Fica a sensação de que Glória não apenas conhece seu público e o tempo dele, como tem apreço pelos seus fãs, ao entregar um material tão bem acabado dessa maneira. 

Mais Notícias

Nossas Redes

2,459FansGostar
216SeguidoresSeguir
125InscritosInscrever
4.310 Seguidores
Seguir
- Publicidade -