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Entre Mulheres aborda a toxicidade da masculinidade

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Com temática relevante, drama conta com duas indicações ao Oscar 2023.

A filósofa francesa Simone de Beauvoir tem uma frase célebre que nos últimos anos tem dialogado muito com os acontecimentos do mundo, “basta uma crise política, econômica ou religiosa para que os direitos das mulheres sejam questionados”, em outras palavras significa que, em um mundo regido pelos homens, basta que eles criem/acabem com uma nova religião, tenham problemas financeiros em suas negociações e/ou briguem entre si por posse e poder que, imediatamente, todos os (ainda poucos) direitos conquistados pelas mulheres ao longo de séculos começam a ser colocados em dúvida.

São eles que criam as regras e estão no poder, questionam a autonomia de nossos corpos, nossa vestimenta, nossa crença, nossa voz e nosso lugar de fala, isso para não falarmos das inúmeras violências contra a mulher que o virtual direito de posse e poder dos homens historicamente lhes incute, numa regra criada por eles mesmos. E é exatamente sobre isso do que se trata Entre Mulheres.

Entre MulheresO poderoso drama se passa em 2010. Em algum lugar no Meio Oeste, no interior dos Estados Unidos, uma comunidade inteiramente formada por mulheres de todas as idades e crianças vive seu dia a dia entre plantação, colheita e cuidados umas com as outras. Porém, hoje elas estão se reunindo porque precisam tomar uma decisão em grupo sobre o destino de todas, e, para isso, votarão se querem ficar e não fazer nada, ficar e lutar, ou ir embora. Tudo isso porque elas entenderam terem chegado ao limite com relação às constantes violências sofridas por literalmente todas elas nas mãos dos homens da cidade, que, na calada da noite, invadem suas casas para violentá-las sexualmente. Ao mesmo tempo que a impunidade passa batida pelas autoridades locais, elas, por serem mulheres religiosas, são obrigadas a perdoar esses criminosos diariamente para garantir a vida eterna no Paraíso. Agora é chegada a hora de pensar nelas mesmas!

 Baseado no livro de Miriam Toews e indicado à duas estatuetas no Oscar 2023 (Melhor Roteiro Adaptado e Melhor Filme), com uma hora e quarenta e quatro minutos de duração Entre Mulheres passa quase que em sua totalidade durante a conversa do grupo acerca do destino de todas. São dois arcos inteiros nisso, e, ao longo da conversa, vamos conhecendo suas personagens e personalidades de cada uma: a doce Ona (Rooney Mara), a raivosa Salome (Claire Foy), a magoada Mariche (Jessie Buckley), a ansiosa Agatha (Judith Ivey), a jovem Mejal (Michelle McLeod) e as crianças Neitje (Liv McNeil) e Autje (Kate Hallett), esta última, que narra a história.

Durante uma tarde inteira cada uma delas vai sendo apresentada ao público no roteiro de Sarah Polley, contando os traumas e violências sofridas e introduzindo novos argumentos para serem sobrepesados pelo grupo na tomada de decisão. Enquanto isso, August (Ben Whishaw, ótimo no papel) vai tomando nota da ata da reunião, por ser o único homem permitido de participar do encontro e, dada sua condição masculina, saber ler e escrever – atributos não permitidos às mulheres da comunidade.

Se por um lado os diálogos são poderosíssimos diante de uma situação terrível, por outro, o longa ganha tons dramatúrgicos, dando a sensação de peça de teatro gravada aos moldes audiovisuais. Por levar quase a totalidade da duração do filme, em determinado momento o debate cansa o espectador pela falta de acontecimentos, apesar da relevância e da importância do tema e das impactantes atuações.

Entre Mulheres é um ótimo filme para ser usado como ferramenta para grupos de estudos feministas mundo afora, inclusive nas escolas, até mesmo pela contemporaneidade dos fatos. Além disso, a fotografia do longa retira as cores do filme dando o tom de passado à história, porém, ela se situa nos anos 2010. Aliás, acima de tudo, Entre Mulheres é um filme que debate o papel da sociedade na educação dos homens e meninos, cujas toxicidade das masculinidades impactam profundamente na vida social da mulher, até mesmo das mães e irmãs desses mesmos homens.

Janda Montenegro
Janda Montenegro
Escritora, roteirista, mestranda em Literatura Brasileira pela UFRJ, crítica de cinema, tradutora e revisora.

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