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Snowden

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snowden “AS pessoas não querem liberdade. As pessoas querem segurança.”

A ideia de que nossos aparelhos e comunicações eletrônicas estão sendo vigiados está longe de ser considerada paranoia, um absurdo inimaginável. Essa ideia sequer gera medo ou espanto, mas é, de certa forma, plausível, senso comum. Hoje a questão não é mais se estamos sob vigilância ou não, mas até que ponto nos incomodamos com isso. Até que ponto estamos dispostos a abrir mão da maneira como fazemos uso da tecnologia para garantir nossa privacidade, nossa liberdade. O mesmo diálogo que levanta essa questão, que talvez seja, a grande questão do filme, também fala sobre a mudança de alguns outros conceitos no que diz respeito a segurança de maneira geral. “Onde é o campo de batalha moderno?” Em todos os lugares. A informação se tornou o bem mais precioso, e quem a tem, tem tudo. Segurança é sinônimo de sigilo. E quem detém a informação detém o poder.

Edward Snowden tem na sua história as características que marcaram tantos dos protagonistas de Oliver Stone, e não há conflito nenhum no caminho seguido ao retratar o “personagem”. Delator ou traidor? Ele é o Herói, como outros do diretor, um sonhador desiludido confrontado com injustiças que o incomodam, quiça, o revoltam e o fazem (re)agir. Snowden é um idealista, desses que acreditam e defendem cegamente o governo de seu país,e tem seu sonho de servir às forças militares destruído após sofrer um acidente que o tira do serviço militar. “Existem outras maneiras de servir o seu país”, o conselho recebido já dá indícios desse novo mundo em que vivemos, em que as guerras não são mais travadas em campos de batalha mas de trás de computadores. O espaço de tempo de 10 anos em que, o agora, analista de sistemas, começa a trabalhar na CIA e NSA com sistemas de vigilância e coleta de dados. A medida que se aprofunda em seu trabalho e naquilo que o cerca profissionalmente com relação a segurança nacional, começa a rever seus conceitos e questionar suas crenças. O roteiro escrito juntamente com Kieran Fitzgerald tem como uma de suas enormes façanhas a simplificação dos mecanismos de vigilância o que torna a história bem fluida.

A genialidade do diretor se destaca e é maximizada pela presença de Don Mantle a frente da direção de fotografia e fica nítida quando, em situações cotidianas como horas dentro um quarto de hotel ou uma simples refeição são capazes de carregar visualmente a sensação de perseguição e deixar o expectador preso à cadeira. É como se a qualquer momento algo terrível pudesse acontecer, e fosse acontecer, inevitavelmente, gerando uma sensação constante de paranoia, como estar sempre olhando por cima dos ombros. Essa sensação de suspeita que perpassa o trabalho de câmera aliada a música de Craig Armstrong e Adam Peters dão ao filme um toque Oliver Stone de qualidade.

Jason Gordon levitt está surpreendente, com uma voz grave e uma sobriedade que beira o blasé, ele dá vida a um personagem mais apático e fechado que o Próprio Edward Snowden, mas o faz de forma muito consistente, tanto que no final do filme quando o ator dá lugar à imagens reais leva-se algum tempo para se dar conta da mudança, apesar da grande diferença física entre os dois a troca não é percebida logo de cara.

As mulheres na obra do diretor, assim como seus protagonistas, ocupam um lugar muito parecido, e servem, em geral a um mesmo propósito. É através dos relacionamentos que esses homens com problemas de socialização, com tendências à solidão e ao isolamento, é através dessas mulheres, que ocupam esses papeis secundários, e dessas relações, que eles são humanizados. Shailene Woodley é Lindsay Mills a companheira de muitos anos, que está sempre ao lado do seu parceiro, a que suporta o sofrimento e é incompreendida, e os conflitos gerados por essa relação funcionam como mola propulsora para o comportamento e as escolhas do nosso “herói”. O amor e a ética são as grandes alavancas da história.

As críticas ao imperialismo americano são temática comum nos filmes de Oliver Stone. Questões políticas, o poder, a guerra fazem do diretor uma espécie de militante, mas, apesar de beber da mesma fonte de inspiração que tanto o motivou em outros trabalhos, Snowden é um filme aquém do potencial do diretor. Edward Snowden é, na representação de Stone, um homem ético, racional, sóbrio. O filme parece perder ao mimetizar em sua estrutura narrativa a personalidade do “Herói”. Diferentemente do filme de Laura Poitras, Citizenfour, que tem todo um caráter jornalístico expositivo e de denúncia, talvez não fizesse muito sentido que o filme de Oliver Stone seguisse a mesma linha, principalmente, considerando o momento atual, em que as informações contidas no filme, não são mais nenhuma novidade. As questões no filme de Stone são outras e em muitos momentos parece simplesmente querer servir à vontade do seu protagonista expor os fatos e gerar incômodo. O filme parece mais interessado em nos fazer refletir sobre a nossa posição frente ao que já sabemos, o incômodo que causa é mais pela nossa própria passividade diante do que deveria ser ultrajante. E, talvez a passividade narrativa, as amarras que nos dão a sensação de que falta alguma coisa no filme, sejam, na verdade, um reflexo do que falta no nosso posicionamento frente às denúncias feitas.

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