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“Um Filme Argentino” traz cenas de um matrimônio em ruptura

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Romperam-se os diques que sustentavam o amor de Cláudia (Letícia Colin) por Cláudio (Michel Melamed) no duelo equânime de esgrima cênica chamado “Um Filme Argentino”, peça a um só tempo engraçad(íssim)a, catártica e inventiva. Idealizada como híbrido de filme e série, mas realizada como espetáculo – um dos mais inventivos de 2024, nestes três primeiros meses de muitas estreias -, a love story de evocações à cultura portenha é um estudo sobre abrigos que um dia foram abraços e viraram recomeços.

Ambos em fervura máxima em cena, Letícia e Michel desenham as diferentes etapas de uma separação – e uma superação – ambientada em um prédio cujo síndico é uma figura de dúbios sentimentos. O que deixou de evoluir na vida daquele casal, sobretudo depois da aparição do lépido Clóvis (o próprio Melamed), um fã de corrida, vai se expandir, qual metástase de carência, no condomínio vertical onde tudo se passa. Aliás, o condomínio retratado em cena nos enche os olhos graças pela cenografia refinada de Marieta Spada, galvanizada pela luz de Adriana Ortiz.

O entra e sai de personagens, todos concentrados no par de protagonistas (e produtores), é vitaminado pela elegância dos figurinos de Luiza Marcier, cambiados com rapidez à moda The Flash. Eles alternam algumas das figuras, como um condutor de cães e um violonista. Mas o signo mais fundamental que a peça traz à tona é o legado de milongas e panelaços que nuestros Hermanos da pátria de Lionel Messi nos deixaram, sobretudo a partir do cinema.

Foi em 2002 que “O Filho da Noiva” chegou por aqui, amparado numa indicação ao Oscar para Juan José Campanella, servindo de emblema para la nueva hola latina, sobretudo portenha, que foi seguida por “O Abraço Partido”, de Daniel Burman, e “La Ciénaga – O Pântano”, de Lucrecia Martel, ambos lançados comercialmente aqui em 2004. Os argentinos abriram o século XXI recauchutando formas clássicas de escrita de roteiro, entre unidades de ação e unidades de tempo. Eram intrigas cuja predestinação dos personagens ou eram crises de família ou eram saldos da ditadura. Mais tarde, em 2014, “Relatos Selvagens” atomizou essa dualidade e nos fez trafegar pelo espaço onde Melamed e Letícia percorrem, amparados sob o signo cinéfilo de um país que emplacou sucessivos sucessos nos últimos vinte quatro anos. Até um Oscar eles levaram, com “O Segredo De Seus Olhos”, em 2010.

Na escrita da dramaturgia de “Um Filme Argentino”, Melamed retoma (brilhantemente) os vários procedimentos de nossos vizinhos de América do Sul na forma de abalroar o desdém, a finitude do querer, a fadiga física e os riscos que residem na frase “casa comigo”. Se ele brinca (e bem) de Ricardo Darín, Letícia é nuestra Soledad Villamil, num trabalho de expressão corporal tenaz.

Saiba mais sobre a peça!

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