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Petrus Cariry aborda o Brasil no drama Mais Pesado é o Céu

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Petrus Cariry é um cineasta que nunca encontrou limites dentro das narrativas que desbravou. Encerrado entre quatro paredes (ou algo que o valha), ou abraçando seu quinhão de imensidão, parecia pertencer a Petrus cada polegada de horizonte. Ele abraça com facilidade a introspecção do plano, cercando seus personagens de um escopo específico de prisão – metafórica ou geográfica – mas quando precisou se cercar das possibilidades infinitas que a grandiloquência da lente poderia agregar, ele se certificou das mesmas para criar sua atmosfera. Nessa dicotomia própria de sua obra, é com espanto que encontramos Mais Pesado é o Céu, talvez o maior mergulho à imagem que Petrus já propôs. E sim, estamos falando do cineasta de O Barco; aqui, no entanto, esse cineasta não quer falar de sonho, de fábula ou de parábola. Ele quer falar de Brasil. 

Por isso, faz sentido que não haja qualquer amarra de profundidade no que vemos aqui, porquê as dimensões espaciais e emocionais dos valores de um país em constante construção e reconstrução estão em vias de análise. Mas não é de qualquer leitura, mas de um tomo específico que representa quase uma tradição familiar. Citar Petrus pelo primeiro nome é dar a ele personalidade para além dos Cariry, sem jamais deixar de ser (e de querer ser, e de poder ser) um deles. Rosemberg Cariry, seu pai, Barbara Cariry, sua irmã, o próprio Petrus: um clã que investiga o Brasil cada qual do seu modo, podemos dizer assim. Mas no cerne dessa afirmação, o que Mais Pesado é o Céu representa para a filmografia de Petrus, é como um primeiro mergulho diante da profundidade quase lisérgica de um país que parece clamar por um afeto intrínseco, que precisa ser retomado. 

Mesmo que a alguns títulos não lhe tenha faltado brasilidade, é o debruçamento que ele propõe em Mais Pesado é o Céu que parece, pela primeira vez, abraçar um senso de nação em sua face mais acertada. Através da história da inundação da velha Jaguaribara, cidade que desaparece para que nascesse o açude Castanhão, o roteiro do diretor ao lado do pai Rosemberg e do tradicional parceiro Firmino Holanda, percorre a jornada de um casal disfuncional que se confunde com o país que também está nascendo. Nasce uma nova cidade, uma nova família, em um tempo que parece remeter ao 1998 que recebia Central do Brasil, mas aqui muito menos dependente. Existe a esperança que Walter Salles visitou, mas esse filme se coloca de maneira muito consciente a respeito do fim das coisas, inclusive de um tempo de progresso. Não é ceticismo o sentimente que emerge do filme, mas a certeza de que nenhum bem é indestrutível.

Se a fotografia que amplia o horizonte dos personagens é também ela um fotograma do país renascido, são os personagens em cena que mostram que, dessa vez, era necessário textura de relevo para permitir a comunicação. Antônio e Teresa, através das espetaculares leituras de Matheus Nachtergaele e Ana Luiza Rios, são uma espécie de resumo desse novo momento, sem vestir-se de arquétipos. Seus intérpretes recheiam a criação de seu diretor de uma humanidade que não é performada com frequência no cinema independente brasileiro, e é isso que conecta tais sujeitos a quem os assiste, e permite uma leitura emocional de Mais Pesado é o Céu. Sem resvalar no exagero do melodrama, estamos diante de pessoas reais que erram bem mais que acertam, mas que encontram sem procurar um sentido de unidade, uma comunicação não-verbal que assenta as buscas que eles nem imaginavam desejar.

Desbravar, acima de tudo, a geografia desse desejo sem nome, aquele o mais recôndito possível, e se perceber no auge do encontro. É nesse escaninho delicado que Petrus ainda encontra mais uma forma de interpretar as formas que apresenta, recondicionando no sertão uma natural troca de papéis de gênero que começou há muito tempo nas grandes metrópoles; no entanto, o lugar que o diretor filma ainda desconhece novos códigos. Por isso é tão verdadeiro e bonito que se avance por essas estradas indefinidas, que se revelam tão doces quanto complexas; está no que não é prometido e nem conseguido, mas na interação entre seus tipos, que revelam novas significações e remodelam as antigas. 

Adepto do cinema de gênero pelo viés da fantasia (ainda que contemplando a violência sem pudores) de maneira mais explícita anteriormente, como em Clarisse ou Alguma Coisa Sobre Nós Dois, Petrus deixa sua concepção desse novo Brasil esbarrar no horror, a quem olha de longe. É como se dissesse que, ainda que as coisas se reconstruam, elas tem prazo determinado para acabar, e geralmente não o fazem de maneira sutil. Mesmo quando rasga sua proposta de suavidade rumo a esse estampido inesperado, o autor está ainda conjecturando sobre o pais, diante do tamanho de horror que nos assola historicamente e que nunca pede licença para chegar. É a espreita com o qual vivemos em tempos de regozijo e delicadeza, de que, mais uma vez, nada dura para sempre, e que mesmo algo bonito precisa terminar para que o céu permaneça lá. 

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