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Família flagra comunidade de brasileiros imigrantes no Oriente

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Há um fascínio inicial que ocorre, para brasileiros e japoneses, durante a primeira sequência de Família, filme que estreia nos cinemas nesta semana. Com um drone, o filme acompanha uma comunidade em uma zona periférica do Japão, mas não se trata de um espaço geográfico qualquer. Durante quase cinco minutos, escutamos os personagens flagrados conversando em português, e precisamos avisar ao leitor: não vá até a gerência perguntar se estamos diante de um erro, e o filme começou estranhamente dublado. O que acompanhamos, e saberemos em seguida, é de uma produção que flagra algum tempo dentro de uma comunidade de brasileiros imigrantes no Oriente, muitos deles descendentes de japoneses, e que estão ali com a esperança de que algum sonho prometido viria lhes resgatar de uma realidade difícil. 

Muitas eram as formas para conduzir essas narrativas, tratando seus personagens sob tantas prerrogativas. Estão ali a discussão entre a modernidade e a tradição, a primeira no intercurso de nacionalidades, no fator cosmopolita de enxergar seus percursos; a segunda na forma como apresenta uma profissão secular como um valor que ainda pode ser cultivado – no caso, a artesania dos ceramistas. Podemos também observar tais elementos a partir de um choque provocado entre culturas tão díspares, como a efusividade típica brasileira e a parcimônia cerimoniosa dos japoneses. Dentro desse lugar, poderíamos também explorar a multiplicidade de idiomas de Família, que ainda conta com o inglês (que une um dos casais) e o árabe da Argélia, montando o mosaico de uma Babel em pleno 2024. 

Além disso, ainda existem as relações familiares que se sobressaem no roteiro, especificamente a paternidade – o que provoca um estranhamento diante da decisão de lançar o filme uma semana após o Dia dos Pais, no mínimo estranha. São casos de resgate de laços, filhos que já não estão mais e determinam o futuro das ações, de adoções inesperadas e de resgates de valores diante de várias ordens de recomeços. Nesse sentido, Família esquadrinha seu título muito bem, e mostra que todos em cena estão em rota de ressignificação de tais valores, e que suas molas de união estão montando a narrativa. Como esperado, a emoção irá tomar conta do projeto diversas vezes, em alguns momentos de maneira mais orgânica que outras. 

Isso porque o gosto da direção caminha nas vielas do melodrama, quase como se uma telenovela estivesse em desenvolvimento. É mais uma forma de unir fórmula e conteúdo, porque são países que desfrutam desse apreço pela ideia apresentada do melodrama televisivo. Histórias divididas em núcleos, grandes dramas familiares entrecortados por sequências humoradas, a conversação entre cada universo que criam uma massa de eventos que se apresentam juntas: está tudo isso em Família e todos esses elementos montam a estrutura do filme. Todo o material, no entanto, não é transformado positivamente pelo roteiro, que se desenvolve como um compêndio coletivo de pequenas tragédias particulares, que caminham pouco a pouco a um ambiente insuportável de eventos dramáticos. 

O diretor Izuru Narushima conseguiu compreender o gosto médio dos espectadores tanto japoneses quanto brasileiros para entregar uma massa que evolui dos micro dramas entre pai e filho para a situação econômica que advém da globalização. Além disso, esse movimento descartou pessoas de seus lugares de origem, e pequenas cidades foram transformadas em cemitérios. Mas o que o roteiro de Família faz de mais consciente é crescer o escopo em absoluto, transformando cada um dos personagens em reféns de uma grande tragédia prestes a acontecer. De repente, toda a sutileza das pequenezas no dia a dia dão lugar a uma escalada de horror dramático, onde cada movimento novo parece indicar que uma próxima desgraça se abaterá sobre alguém. 

Com o magnífico Kôji Yakusho (o vencedor do prêmio de melhor ator em Cannes por Dias Perfeitos) no centro da história, Família parte daquela coloquialidade típica do cinema oriental para chegar ao seu oposto, que igualmente faz parte de seu lugar comum. A cena onde Seiji chega até ao Ministério das Relações Exteriores é especialmente dolorosa, mostrando que se o filme tem um centro nervoso e uma sensibilidade fora do comum, essas características estão focadas nele. O resto, que envolve os confrontos entre duas gangues rivais onde um jovem sempre acaba se ferindo violentamente, e um sequestro de trabalhadores na Argélia, soam como uma exacerbação da teledramaturgia. Mas, se o espectador não se importa com as reviravoltas de Glória Perez e Walcyr Carrasco e até os aprecia, Família pode até ser uma pedida perfeita. 

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