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Tipos de Gentileza: Yorgos Lanthimos rememora que suas últimas obras

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A essa altura, a carreira de Yorgos Lanthimos, em espaço de menos de quinze anos, deu uma reviravolta inesperada, onde parecemos sempre estar diante de um novo choque de possibilidades de sua filmografia – e principalmente da forma como o mundo a vê, ou abraça. Uma análise fílmica não deveria se debruçar sobre a relação entre objeto e a subjetividade de quem a vê, mas o caso de Lanthimos especificamente parece abrir um precedente para isso. Sua movimentação mais recente, Tipos de Gentileza  é um projeto que nos rememora que suas últimas obras parecem uma versão comportada do que ele na verdade quer representar. Aqui, temos sua versão inicial como cineasta de volta à ribalta, e o que pode ser dito de mais fora do comum a esse respeito (mas que ainda precisamos de novos capítulos para atestar tal fala) é que sua versão, digamos adocicada, era sua melhor persona. 

Tipos de Gentileza

Com sua radicalidade inicial, o tanto de misantropia que era acusado (com alguma razão) e uma forte carga exploratória que emanavam de seus filmes, Lanthimos abriu um espaço raro de conversação dentro da indústria mais formal para ir além da casca em seu registro. Quando explode para o resto do mundo com Dente Canino, ele acaba ousando ao querer deixar as cercanias de sua Grécia, para se comunicar com o mundo inteiro. A lista é impressionante: desde o filme de 2009, o cineasta consegue sair de algum dos maiores festivais do mundo com um prêmio importante. A despeito do teor que suas imagens apresentam, ele conseguiu conquistar a atenção de astros do quilate de Colin Farrell, Nicole Kidman e Rachel Weisz para que sua obra conseguisse um lugar ao sol, ainda que estranhíssima. Isso nos leva até Tipos de Gentileza, onde o que poderia oferecer de melhor dentro de sua propalada extravagância parece ter escasseado quase por completo. 

O que sobrou de A Favorita (para mim, seu grande filme) e Pobres Criaturas aqui? Praticamente nada. Comprado efetivamente por Hollywood em dois filmes onde abusou de um tom fabular para conversar sobre misoginia e exploração da imagem da mulher como uma peça inanimada com resultados tão diferentes, Tipos de Gentileza é um retrocesso ao modelo narrativo a qual ele dedicou os últimos 5 anos de carreira. Aqui, a discussão sobre violência contra a mulher, uma sociedade patriarcal e como o mundo é formado a partir dessa visão antiquada, não está mais nas entrelinhas da obra, e sim no centro do picadeiro com raros momentos onde a respiração é permitida. Mas a tensão produzida pela obra é menos sobre suas capacidades de ser visto como um thriller e mais como uma peça amorfa em suas intencionalidades, que soam a princípio difusas e ao longo da jornada, cada vez mais cansativas. 

Independente da adjetivação (do qual sou contra e não-adepto), Tipos de Gentileza se revela uma produção profundamente vazia em qualquer que tenha sido seus propósitos, e estamos falando de Yorgos Lanthimos, ou seja, a metralhadora continua girando. Mas, despido do artifício que se especializou nos títulos que o transformaram em uma espécie de ‘Midas da intelligentsia‘ através dos recursos anacrônicos, o que salta na superfície aqui é o quanto seu cinema mostrou-se em toda a sua vaidade. Saindo da opulência que marcou os títulos anteriores, o diretor apresenta-se limpo graficamente, mas extremamente excessivo em quantidade cavalar, ainda que sua capacidade de encher de possibilidades temáticas uma obra de aparência simples só mostra o quanto nada ali faz muito sentido. 

E não estamos falando de um projeto hermético nos valores de produção, pelo contrário. Tudo que o filme tenta comunicar é extremamente óbvio no que é apresentado, sem ser necessariamente didático; é só esvaziado na totalidade. Ainda que seus longas nunca tenham gozado de unanimidade, Tipos de Gentileza se mostra em outro patamar de alcance. Enquanto alguns verão como algo cheio de extravagância e descompromisso, outros se mostrarão indiferentes a algo que é também carregado desse despropósito – esse é o caso de quem escreve. Se suas três historinhas de 50 minutos cada não deixam o espectador entediado, tampouco conseguimos criar alguma conexão com o material filmado, ou mesmo pretendido. São quase 3 horas de algum ritmo e uma boa decupagem, mas que rapidamente se revelam inócuas. 

Nem mesmo o elenco consegue nos proporcionar qualquer tipo de prazer, porque conhecendo os talentos empregados ali (e estamos falando de pessoas do quilate de Emma Stone, Willem Dafoe, Hong Chau, Margaret Qualley, além do já citado Plemons), Lanthimos os dirige na mesma chave de obviedade. Então, por mais que todos estejam bem, Tipos de Gentileza ainda comete o deslize de transformá-los em intérpretes sem surpresa. Aliás, cabe a Dafoe ainda ter algum brilho na última história, Plemons tem algum na segunda, mas no coletivo nada ali efetiva o talento que esses atores comprovadamente têm. A sensação, ao término do filme, não é de cansaço ou desprezo, mas de um sentimento de perda de tempo e enfado extremo, salpicado por todas as muitas vezes onde uma mulher é mais uma vez torturada a mando de alguém, e algumas vezes estamos falando de auto-mutilação, emocional ou não. 

O pensamento não poderia ser outro, que não uma vontade muito grande de ouvi-lo falar do quanto cada imagem daquelas não consegue se tornar o que inspirou sua motivação, e sim o oposto dela, provavelmente. Assistir uma festa entre amigos queridos, no fim das contas, não é a mesma coisa que participar da mesma: essa é a impressão que fica ao acender das luzes. Tipos de Gentileza, que também poderia ser conhecido como ‘Sou Rico e Posso Ficar um Mês com Meus Amigos me Divertindo às Custas de Muita Misoginia’. 

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