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Globo de Ouro consagra Emília Pérez, O Brutalista e Fernanda Torres

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Qualquer texto brasileiro que fale sobre a noite passada, ou que se exercite uma análise sobre a entrega dos Globos de Ouro versão 2025, abrirá a discussão não com a consagração ligeiramente surpreendente de Emilia Pérez ou com a efetiva surpresa de acompanhar, na própria cerimônia, o crescimento de O Brutalista segmento a segmento. A madrugada do dia 6 de janeiro de 2025 será sempre, para nós, a noite da vitória de Fernanda Torres na categoria de melhor atriz dramática por Ainda Estou Aqui. Sim, eu estava lá, e daqui há muitos anos ainda lembrarei desse momento histórico. 

Fernanda Torres

Ouvi e ainda ouvirei muito, enquanto jornalista, sobre possíveis imparcialidades na hora de reagir a uma efeméride como essa, mas, sinceramente, estou me importando bem pouco com a opinião de quem me critica por me emocionar com o que aconteceu nas últimas horas. Somos uma nação da América Latina, com problemas de ordem de aceitação cultural gigantescos que vem sendo ainda ampliados por uma polarização ridícula de pessoas que se dizem patriotas, mas torcem contra qualquer conquista do próprio país. Um espaço que é conquistado a duras penas por uma malha artística reconhecida como das mais inventivas e prolíficas, mas que dentro da própria casa encontra resistência absurda. No lugar onde estamos – junto a outros lugares periféricos, não-estadunidense ou europeu – a vitória de Fernanda Torres é histórica sim, e ainda que mude a mentalidade de apenas um cidadão, já estará dando um passo descomunal na luta por ampliação de discussão e espaço. 

Também não encontro tempo ou paciência para discutir com colegas letrados que preferem não reconhecer como qualitativa o feito do Brasil ontem. Uma mulher tão intrinsecamente artista como Fernanda Torres, ser consagrada onde nenhuma outra havia sido antes, é um espaço que se abre não para ela, mas para toda uma cadeia de produção e visibilidade muito maior do que Walter Salles poderia promover. É o desdobramento de anos de reconhecimento do nosso valor em festivais ao redor do globo, que dessa forma consegue mais portas abertas para outros realizadores, outras narrativas, outras experiências cinematográficas em outros espaços. É com esse triunfo, e o de Baby em Cannes, e o de Cidade; Campo em Berlim, e o de As Boas Maneiras em Locarno, e o de Bacurau igualmente em Cannes, e o de tantas entradas que conseguimos em lugares imensos, que são fundidas as aceitações aos próximos filmes que nós fizermos – e que culmina agora, na primeira brasileira a alcançar esse lugar. 

Com ironia ou sem, “outros assuntos também importaram” na noite passada. Por exemplo, onde foi parar o favoritismo de Anora, vencedor da última Palma de Ouro e que está fazendo uma belíssima carreira nos prêmios iniciais da temporada, sendo o filme mais premiado nas categorias de melhor filme, roteiro e atriz, que saiu da noite sem qualquer troféu? Não dá para culpar o francês Emília Pérez pela tampa de um caixão, já que o filme ganhou apenas 1 prêmio que disputava com o filme de Sean Baker; tampouco podemos acusar O Brutalista por tal, pois também a produção ganhou apenas 1 troféu que disputava com o campeão de Cannes 2024. O problema, se é que houve algum, foi geral, pois tirando esses dois filmes, todos os outros saíram da festa com apenas uma vitória. Não é para entrar em desespero – ainda. Critics Choice, Sindicato dos Atores (o SAG), o BAFTA, ainda têm muito a dizer sobre o ano, e o Globo de Ouro foi apenas a primeira festa televisionada, e virão todas essas. A associação de imprensa estrangeira não tem, nos últimos anos, apontado tendências seguras em relação às premiações vindouras, ainda que tenham tomado boas decisões. 

Quanto às vitórias, tanto o filme de Jacques Audiard quanto o dirigido por Brady Corbet estão, no dia de hoje (é bom deixar claro), em excelente estado. Emília Pérez – que estreia no Brasil no próximo dia 6 de fevereiro – levou para casa troféus esperados, como os de canção original, filme internacional (batendo justamente o nosso Ainda Estou Aqui) e atriz coadjuvante, para Zoe Saldaña, uma força para vencer os próximos prêmios de sua categoria. A vitória em melhor filme de comédia ou musical foi menos óbvia, mas também não podemos chamar de chocante; ele era o filme com o maior número de indicações da cerimônia. O Brutalista – que chega até o circuito em 20 de fevereiro – levou filme dramático, ator dramático para Adrien Brody e direção, para Corbet. As três vitórias podemos classificar como suadas, porque a competição nas três categorias não era pouca. Isso significa que estamos de olho para os dois favoritos ao Oscar de melhor filme, especificamente? Não. Porém, o que aconteceu não pode ser ignorado. É certo que eles irão perder, então? Igualmente não. 

A corrida para o Oscar é cada vez mais complexa, e o ano passado foi uma baita exceção, quando Oppenheimer se mostrou uma locomotiva impossível de ser parada. Ao olhar para essa temporada, no entanto, a noite de ontem deixou ainda mais confusa uma corrida que já não estava acertada. Para quem gosta de acompanhar esses meandros, como eu, o jogo (ou a brincadeira) ficou ainda mais excitante, porque ganharam força e foco dois filmes que pareciam menos bem posicionados que, por exemplo, o já citado Anora Conclave, que saiu da festa apenas com o prêmio de roteiro, mas que não se ache que isso é pouco. Temos agora um grupo de 4 títulos à espera do próximo lance, que acontece já no próximo domingo, com a entrega do Critics Choice. Serão mantidas essas decisões, ou novas cartadas serão dadas? 

Ao menos um outro prêmio merece destaque e comentário mais dedicado, que é o de Demi Moore, que venceu uma batalha de gigantes pelo troféu de melhor atriz de comédia por A Substância. Sua briga era com competidoras fortíssimas do ano, e que poderiam facilmente construir uma narrativa de vencedora – Mikey Madison, a jovem estrela de Anora, Cynthia Erivo, a força motriz que rege o hit Wicked, e Karla Sofia Gascón, que interpreta a personagem-título de Emília Pérez. Moore fez tudo certo, não apenas vencendo (até porque isso nem competia a ela), mas entregando um dos melhores discursos da noite, daqueles momentos que qualquer votante quer repetir em seu próprio palco. Lembrou sua carreira, o esforço que é estar de volta para alguém que não era considerada uma opção de qualidade para um filme, e fez valer o discurso que sua produção tão perfeitamente elabora. Sabe os anos anteriores, com o palco dado para Brendan Fraser, Michelle Yeoh, Ke Huy Quan, Jamie Lee Curtis (um quarteto do mesmo ano), mas também Robert Downey Jr., Laura Dern e outros? Foi impossível não imaginar Demi ali, e a história sendo mais uma vez sendo escrita. 

O bom dos próximos dias, para nós, é dormir com essa sensação indescritível da surpresa mais deliciosa de nos vermos, uma vez mais que seja, no lugar mais alto do pódio, e também um daqueles que não depende exclusivamente do esporte para reluzir. Fernanda Torres, ontem, carregou todos nós junto com ela, como também já o fizeram Anselmo Duarte, Glauber Rocha, Leon Hirszman, e também Marcélia Cartaxo, Ana Beatriz Nogueira, Sandra Corveloni, tantos outros e outras, além do seu ‘parceiro no crime’ Walter Salles e sua mãe, há 25 anos atrás, a reboque do clássico Central do Brasil. Dona Fernanda Montenegro agora viu sua filha imortalizada como ela já é. Nós agradecemos a essa família de titãs, pela nova tocha que eles estão passando a outros realizadores, filmes e oportunidades. Ser patriota é isso aqui. 

Confira abaixo os vencedores do Globo de Ouro 2025:

Melhor Filme – Drama: O Brutalista 

Melhor Filme – Comédia/Musical: Emília Pérez

Melhor Filme Internacional: Emília Pérez 

Melhor Direção: Brady Corbet, O Brutalista 

Melhor Roteiro: Conclave 

Melhor Ator – Drama: Adrien Brody, O Brutalista 

Melhor Atriz – Drama: Fernanda Torres, Ainda Estou Aqui 

Melhor Ator – Comédia/Musical: Sebastian Stan, Um Homem Diferente 

Melhor Atriz – Comédia/Musical: Demi Moore, A Substância 

Melhor Ator Coadjuvante: Zoe Saldaña, Emília Pérez 

Melhor Atriz Coadjuvante: Kieran Culkin, A Verdadeira Dor 

Melhor Animação: Flow 

Melhor Trilha Sonora: Rivais 

Melhor Canção: ‘El Mal’, Emília Pérez 

Melhor Blockbuster: Wicked

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