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Atena, um thriller policial, com Mel Lisboa

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Existe um mérito claro em Atena, suspense policial dirigido por Caco Souza que estreia essa semana nos cinemas do país. Ambientado em uma Gramado cosmopolita, viva, cheia de luzes, neon, escuridão, mas acima de tudo, uma cidade normatizada para além do turismo, a narrativa coloca a cidade que o cinéfilo brasileiro cresceu ouvindo falar como um espaço de acesso facilitado. Além do famoso festival de cinema, Gramado sempre foi comercializada de maneiras tradicionais: o Festival de Gramado, o chocolate de Gramado, a arquitetura de Gramado, transformando-se quase em uma entidade de conto. Através do filme, tudo isso é retirado e fica apenas uma metrópole instigante e cheia de potencial paralela a qualquer mitificação. Esse é o mérito, e pouco (ou melhor, pouquíssimo) vai além dele.

A narrativa segue os moldes dos pintados pelo escritor sueco Stieg Larsson em sua série ‘Millennium’, adaptada em Hollywood por David Fincher. A personagem Atena, protagonista aqui, é uma espécie de Lisbeth Salander abrasileirada, uma mulher que busca justiça após ter sido abusada por anos pelo próprio pai, em uma saga de vingança indiscriminada contra os piores tipos de homens possíveis, que ela pesquisa e não mede esforços para encontrar. Nenhum demérito à intenção de repaginar o cinema brasileiro dentro da lógica do thriller policial, que inclusive não é um recorte que encontramos com facilidade. Os maneirismos possíveis de títulos internacionais, que poderiam servir como base de sustentação de Atena, não são o que de mais grave a produção tem a oferecer. 

Caco Souza tem pelo menos um filme interessante no currículo, o igualmente policial 400 contra 1, que teria uma base real na história da criação do Comando Vermelho e é protagonizado por Daniel de Oliveira. Aquele diretor experiente não aparece em torno de Atena, uma produção que parece ter sido concebida por alguém bem menos experiente que Souza – ou quase um amador. Existe, por trás das intenções distintas da realização, o que é servido afinal, carregado de uma artificialidade que é quase impossível de se comunicar com o que vemos. Porque, ainda que o pressuposto fosse o de uma realização universal, o alcance final é restrito a uma frieza sem par. Nada do que vemos é minimamente crível, e isso não tem a ver com o gênero, mas com a maneira com que cada elemento é pintado em cena. 

Devido a experiência anterior de Souza, existe um nome que precisamos guardar com ainda mais empenho: Enrico Peccin. Ele também é o roteirista e produtor do próximo filme de Souza (Mato ou Morro), e estou disposto a tirar a prova dos 9 em breve. Pelo que foi realizado em Atena, não há muita animação para aguardar. Os desenhos dos personagens são simplórios, e as decisões especificamente ligadas ao personagem de Thiago Fragoso implodem ao menos parte da seriedade que se pretende construir. São bases que passeiam entre a cópia do que já vimos, ou de alguma ideia descabida de bom senso para o quadro geral. Ao invés de construir tensão, muitas vezes não conseguimos fugir do humor involuntário que invade tanto os diálogos, quanto as descrições de cenas. 

Os problemas de Atena, no entanto, não estão isolados; eles se espalham por quase todo setor de produção. As imagens de Gramado parecem extraídas muito posteriormente, e em outro contexto, à produção; há um descolamento que sugere os antiquados ‘stockshots’ de telenovela, imagens geográficas que ilustram uma ambientação geralmente genérica. A direção de arte é outro detalhe incômodo, pois muito demarcada de suas preocupações, não conseguindo criar uma unidade ao projeto. A fotografia de Juliano Dutra é pesada e sem contraste, e raramente atinge um estágio cinematográfico adequado, passeando por texturas televisivas e uma acerto de cor que retira as características habituais de um acabamento próprio para cinema. 

Outro grupo que não pode ser afetado pelo resultado final é o elenco, ainda que o trabalho de Thiago Fragoso esteja especialmente comprometido, devido a uma utilização de sotaque incompreensível. A direção de atores, no aspecto coletivo, é a responsável por não conseguir dar um norte ao que vemos, e com isso atores premiados como Mel Lisboa e Gilberto Gawronski não conseguirem atingir o mínimo de seus potenciais – inclusive por não terem material sólido onde apoiar-se. É uma pena que uma premissa tão instigante tenha rendido um material final tão aquém do que o cinema brasileiro está nos acostumando a entregar. 

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