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Corra Que a Polícia Vem Aí! vive seu momento ‘quinta série’ para nos livrar do bode

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Com um faturamento nas raias do US$ 57 milhões, Corra Que A Polícia Vem Aí! vive seu momento “quinta série” várias vezes, com piada de pum e sequência de piriri. Poderia ser pura escatologia, mas, nestes tempos de patrulhamento ideológico, de garrote da correção política, essa veia flatulenta ganha uma perspectiva corajosa. Liam Neeson, certamente, veio nos salvar de interditos.  

Incumbido da missão de ser o Charles Bronson do século XXI, o irlandês tem Michael Collins: O Preço da Liberdade (Leão de Ouro de 1996) e A Lista de Schindler (Oscar de Melhor Filme de 1994) no currículo. Sabe Tchekov de cor. Filmou com Scorsese, George Lucas e Woody Allen. 

 Mesmo com tudo isso (e mais um pouco), ele aceitou a demanda de Hollywood para assumir a persona de Rambo geriátrico, a partir de 2009, quando Busca Implacável tornou-se blockbuster, sem exibidor nenhum esperar. Ali, transformou-se num ferrabrás do tapa na cara. Aliás, foi nesse terreno, salvou os filmes de ação da indiferença popular. 

Nos últimos 16 anos, sem ignorar os convites de diretores autorais, como Christopher Nolan, Atom Egoyan e seu compatriota Neil Jordan, Liam manteve acesa a pólvora dos longas de pancadaria, assumindo um lugar de vigilante crepuscular. É esse lugar, o crepúsculo, que está em jogo em sua escalação para ressuscitar a franquia “Corra…” (“The Naked Gun” no original) e, com ela, a tradição da paródia. 

O roteiro do filme, escrito por Dan Gregor, Doug Mand e por seu diretor, Akiva Schaffer, com base na série “Police Squad!” (1982), de David & Jerry Zucker e Jim Abrahams (além da trilogia dela derivada), fala o tempo todo de resquícios. São vestígios de um velho heroísmo e de uma certa noção de hombridade, hoje sucateada. 

A graça na qual investe também teve validade cassada. São raros os títulos hoje que parodiam outras narrativas de gênero, como fez Apertem Os Cintos! O Piloto Sumiu (1980) ou Top Secret! Superconfidencial (1984). Essa forma de rir ficou na “Sessão da Tarde” de outrora, pouco germinou, apesar do lucro que deu. Essa lucratividade perdida está em pauta na volta de Corra Que A Polícia Vem Aí!. Além disso, seu acerto, nas bilheterias, resgata uma linhagem inteligente. 

Liam faz o que pode (e faz muito bem). Dublado estoicamente por Armando Tiraboschi, ele é o tenente Frank Drebin Jr, exemplar daquele tal de “homem de antigamente”. É do tipo que ainda manda flores (de plástico) e atira primeiro e pergunta depois. É a metástase de tudo o que o politicamente correto repudia. Só não devemos confundir a prática midiática da correção política com empatia e altruísmo. Trata-se de Poder, de disputa simbólica. 

Na microfísica do contemporâneo, Drebin é obsoleto. Por isso mesmo, nas franjas da ordem vigente, ele é mais do que essencial, pois faz o que ninguém pode fazer… e motivado pelo Bem. Nesse ponto, não há diferença entre sua figura e os anti-heróis encarnados por Liam em longas como Desconhecido (2011) ou Na Mira do Perigo (2021), para ficarmos em seus sucessos. 

Sua singularidade está no fato de Jr. ser um Didi Mocó da Lei, tal qual seu pai, Frank Drebin Sr. O grisalho tira fez de Leslie Nielsen (1926-2010) uma estrela. Dublado por Márcio Seixas, com um vozeirão impostado, Nielsen fez fortunas. O primeiro filme da saga Corra Que A Polícia Vem Aí! com ele, lançado em 1988, custou US$ 12 milhões e arrecadou US$ 152 milhões. 

O segundo custou US$ 23 milhões e ajudou o ano cinéfilo de 1991 a ficar com as contas no azul ao somar US$ 192 milhões. O terceiro e último episódio de suas peripécias contabilizou US$ 132 milhões em 1994. Aliás, os filmes podem ser vistas na Netflix. O Brasil agora pode subir o total de faturamento da franquia com Liam, desafiando a filosofia woke. Não aquela consciente das intolerâncias, mas, sim, aquela que usa das pautas inclusivas como desculpa para sectarismos culturais. 

Egresso de “Tico e Teco: Defensores da Lei” (2022), Akiva Schaffer, construiu um Corra Que A Polícia Vem Aí! curtinho. Tem 1h25… mas é uma hora e vinte e cinco minutos mesmo, pois há uma penca de piadas no texto dos créditos, no áudio que os embala e numa coda hilária, aos 45 minutos do segundo tempo. 

Um assassinato suspeito, que pode estar associado a um clube para milionários do magnata Richard Cane (Danny Huston), deixa Drebin mordido acerca de um crime ainda mais pesado no ar. De fato, existe um projeto em jogo, para manipular o humor da população, ampliando o que existe de animalesco no povo, de modo a produzir assassinos. Esse complô vai sendo revelado conforme o personagem de Liam segue a irmã do morto, a escritora Beth Davenport, papel que extrai uma atuação inspirada de Pamela Anderson.

Desde A Última Showgirl (Prêmio do Júri no Festival de San Sebastián, em 2024), ela está na rota da consagração, atuando com empenho. Encontra alquimia em Liam, que não se faz de rogado na hora de meter o louco. Sua interpretação solta todos os diabos de sua alma, o que nos leva a uma gargalhada contínua. 

Periga ser o filme americano mais engraçado da década. Seu produtor é Seth MacFarlane, o criador do desenho “Uma Família da Pesada”. Mais do que isso, Seth foi o responsável pelo último fenômeno humorístico hollywoodiano: “Ted” (2012), aquela deliciosa farofa na qual um adulto (Mark Wahlberg) tinha como melhor amigo um ursinho de pelúcia falante. Sua arrecadação na venda de ingressos beirou US$ 550 milhões há 13 anos.

Desde então, nos EUA, o gênero que presenteou o planeta com Buster Keaton, Mae West, Jerry Lewis, Lucille Ball, Goldie Hawn, Steve Martin, Lily Tomlin, Jim Carrey e gigantes afins não teve mais cifras astronômicas nos multiplexes. Seu dínamo mais imbatível foi Adam Sandler, que lotou salas de 1998 (quando lançou O Rei da Água) até 2011 (ano de Cada Um Tem A Gêmea Que Merece), e migrou para a Netflix há uma década. Nessa plataforma, sob a dublagem indefectível de Alexandre Moreno, Sandler reina.

Para o povo brasileiro, que tem Leandro Hassum, Paulinho Gogó, Ingrid Guimarães, Tatá Werneck, Rodrigo Santana, Mônica Martelli, Paulinho Serra (e outros), o humor é farto, é firme. Já o humor dos Estados Unidos precisa tomar um sacode. Liam é o cara pra isso.

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