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Traição entre Amigas encara com maturidade a vida adulta

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Bruno Barreto é um dos cineastas mais reconhecidos do nosso cinema. Seu nome e o de sua família ocupam espaço reservado dentro de uma iconografia de um país que nem tem o hábito de se assistir, e muito menos de prezar pela memória. Assim sendo, os Barreto serem uma instituição reconhecível dentro da nossa História não é simples ou pouco. Ainda que sempre tenha flertado com a leveza popular, os últimos 12 anos foram exclusivos dedicados a um cinema despretensioso, talvez até raso, e isso inclui o tratamento estético dispensado O que nos mobiliza para Traição entre Amigas, o novo filme não apenas de Bruno como de sua família, é o reencontro com um arrojo e uma paixão que parecia faltar em suas últimas obras. 

Baseado no primeiro livro escrito por Thalita Rebouças, o filme é um ponto fora da curva não apenas do cineasta, como principalmente da escritora. Especializada em títulos infanto-juvenis de inclinação feminina, seu primeiro título é como se fosse um reencontro com personagens para a qual ela costuma escrever 10 anos depois do feito. Luiza e Penélope são jovens mulheres amigas desde a adolescência, quiçá antes disso, que é justamente o momento que Rebouças costuma dedicar-se, mas aqui essa dupla não apenas está mais velha, como encara o peso de uma cobrança de responsabilidade que muitas vezes parte das mesmas. Apesar de ser nomeado de uma maneira suave, Traição entre Amigas encara com maturidade os deslizes de duas personagens cheias de predicados, onde nem todos tem taxação positiva. 

Aliás, essa costuma ser uma característica muito interessante no vasto rol de mulheres que ele já dirigiu, no papel ou fora dele. Desconstruir Betty Faria em cena como uma profissional doméstica (Romance da Empregada), a imagem de ‘namoradinha’ que carregava Regina Duarte (Além da Paixão), construir uma capa impermeável em torno de Glória Pires (O Quatrilho Flores Raras), fazem parte da assinatura de um autor que nunca se contentou com o esperado. Larissa Manoela e Giovanna Rispoli são duas atrizes que cresceram na frente das câmeras, aqui se embrenham pelos terrenos pantanosos da responsabilidade afetiva, mostrando vulnerabilidade. Como já tinham mostrado anteriormente talento inconteste, a novidade é mostrar que esses talentos não apenas amadureceram, como principalmente negociam para o futuro um espaço menos óbvio. 

Traição entre Amigas não se contenta com uma dupla de protagonistas apetitosas e também abre o leque de seu roteiro para outras construções de qualidade, como as mães das protagonistas, duas mulheres do mundo de hoje cheias de atritos com o que se espera delas. As personagens de Gabrielle Joie e Nathalia Garcia vão além do que se imagina para ambas, permitindo que o filme sempre mostre novas camadas a suas propostas já amplas. Escrito por Rebouças e Marcelo Saback (que também escreveu o incrível Loucas pra Casar), o filme busca na humanidade de suas construções uma porta de entrada para uma discussão quase naturalista da juventude dos grandes centros. Ao propor dois estereótipos que negam suas aparentes obviedades, o filme cria facetas inesperadas e soluções pouco ortodoxas para um filme que busca identificação imediata com inúmeros públicos. 

As duas atrizes encaram os maiores desafios de suas carreiras, com uma vastidão de implicações em suas leituras críveis de um mundo sem máscara. De um lado, temos uma moça libertária nas experimentações que lhe apontam; de outro, uma visão cheia de escapes para uma personagem que, na ânsia de fugir da retração, encontra um caminho que não tem medo de submergir no conservadorismo do patriarcado. Traição entre Amigas passa longe de buscar respostas fáceis para situações que o próprio filme planta de maneira complexa, sem sutileza tanto para uma aparente modernidade quanto para um retrocesso equânime. As soluções de suas personagens, que se mostram cada vez menos encarceradas, é tirar de suas condições qualquer que seja um conceito de facilidade moral para dar algumas cambalhotas na costura do que se imagina enquanto clichês. 

No trabalho de Barreto, para além da sensibilidade do lugar do masculino ao olhar para uma centena de novidades de posicionamentos, está também um autor com sede de ambientação. Traição entre Amigas exala contemporaneidade, assim como é contaminado por sua vontade de ler pessoas e espaços, seja ele Curitiba ou Nova York. O filme explora uma certa frieza que pode ser lida como tradicional do Sul do país, assim como radicaliza o experimentalismo da tal Grande Maçã, para chacoalhar o que entendemos como chavão, na intenção de desconstruí-los. O resultado é o filme de maior personalidade do diretor desde a sensível adaptação do romance entre Elizabeth Bishop e Lota de Macedo. Aqui, ele consegue extrair frescor de uma fatia da sociedade que é jovem para além dos parâmetros da idade, mas também na mola propulsora das decisões tomadas para as próprias vidas. 

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