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Capitã Marvel estreia em filme que cumpre a missão de entreter

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Com mais de onze anos de existência, o Universo Cinematográfico Marvel (MCU) fundamentou não só um jeito inovador de se adaptar histórias em quadrinho como também entregou projetos que visam inserir alguns assuntos relevantes para a sociedade, da mesma forma que seus quadrinhos fizeram nos anos 60 e 70, tendo o oscarizado Pantera Negra como o expoente máximo de um discurso de inclusão.

Capitã Marvel surge para dar protagonismo às personagens femininas que sempre foram tema controverso com a Marvel Studios, uma vez que não é de hoje que o público cobrou ao produtor Kevin Feige por uma maior importância às personagens femininas. Ao mesmo tempo, o filme tem a difícil missão de servir como uma ponte entre o bem sucedido Vingadores: Guerra Infinita e o aguardado Vingadores: Ultimato ao introduzir a personagem da Capitã cuja a importância será imensa no quarto filme dos heróis mais poderosos da Terra. Para tanto, a análise será dividida entre essas duas funções que o filme desempenha e seus respectivos resultados finais.

 

Girls Just Wanna Have Fun

 

A essa altura, é provável grande parte do público já percebeu que a Marvel Studios tem uma fórmula própria para produzir todos os seus filmes, o que ao mesmo tempo que garante consistência e aceitação a todas as obras também mina muitas tentativas dos diretores em deixar sua própria assinatura nos filmes (com exceção dos bem avaliados Soldado Invernal e Pantera Negra). Essa fórmula se traduz em um equilíbrio entre sequencias de ação extrema para manter viva a atenção do espectador, conversas entre personagens com o objetivo de trabalhar melhor suas personalidades, seguidos por cenas cômicas para quebrar a tensão e por fim a conclusão com um conflito final. Tudo isso regado a elementos de ligação com outros filmes daquele universo.

Portanto, Capitã Marvel se mostra como uma representante de peso dessa fórmula ao segui-la fielmente e ainda assim entregar uma narrativa satisfatória. Por ser um filme de origem que já se inicia com Carol Danvers sendo dona de poderes incomensuráveis, há um vai e volta entre momentos no presente e fragmentos de memória passada ( em um modelo similar ao de Batman Begins ) cujo o propósito é maior do que simplesmente mostrar momentos da vida humana da protagonista mas sim construir de maneira convincente o que a torna uma mulher forte. Isso fica bem exemplificado em uma boa sequencia de cenas de diferentes momentos da vida de Carol em que ela está realizando uma mesma ação.

O ritmo é bem cadenciado entre ação, desenvolvimento, alívio e fim (apesar de não saber trabalhar alguns elementos tão bem) muito porque o ambiente a sua volta serve como medidor do que a cena irá propor e para guiar a reação do público ao que o filme quer. Melhor explicando: quando Carol se vê diante de algum ambiente que remete fortemente a nostalgia dos anos 90, é compreendido que esse momento é o momento de comédia porque é evidente que ele está ali para tal. Quando Carol e Fury estão em uma viagem e ambos discutem sobre suas vidas é a deixa para prestar atenção no que estão dizendo e por aí vai. Essa técnica serve de maneira positiva para guiar seu público para as reações que os diretores pretendem, seja de momento ou comprando a ideia do personagem, porém anula qualquer fator de surpresa.

O foco da atuação da Brie Larson (Capitã Marvel) é justamente em se esforçar para não criar uma personagem sisuda e cuja a única função é explodir coisa e soltar frases de efeito. Sua Carol Danvers é um elemento ativo no roteiro e suas ações criam as situações que puxa outros personagens a seu encontro. De fato, ela própria solta poucas piadas mas reage positivamente à aquelas que são ditas por terceiros. Sua presença em cena inspira, fato que o roteiro se esforça para deixar claro, outros a ajudar potenciais inimigos que se encontram em situação difícil ou uma criança que a vê como um exemplo e é aqui que de fato mora o discurso de emponderamento feminino da obra. Com uma ótima sutileza o roteiro insere a importância da Capitã como símbolo feminino por meio de diálogos ou com reações de outros personagens, dispensando discursos enlatados que teriam a função de explicar o óbvio ao público. Optando pela primeira opção, o espectador tende a aceitar mais positivamente o peso da protagonista de maneira similar aos outros participantes da história do que poderia ocorrer com a segunda opção.

A relação da protagonista com os personagens secundários também constrói a imagem de uma heroína que não só é poderosa mas também relacionável, em especial com um jovem Nick Fury (Samuel L. Jackson). Por ser um filme adaptado nos anos 90 e por ter Fury ainda atuando como um agente de campo da S.H.I.E.L.D a relação entre os dois soa muito similar a outras parcerias de filmes policias da época como Maquina Mortífera 2 ou Duro de Matar 2. Enquanto Carol representa a policial durona e que se atira de cabeça nos confrontos ( quase um Mel Gibson que voa), Fury é o tira experiente (vulgo Danny Glover que perde um olho), que não se arrisca a toa e que serve de fonte para os momentos mais cômicos da produção. Como resultado final o filme consegue construir essa ótima parceria de modo que a cena pós crédito de Guerra Infinita soe coesa com o que foi proposto. Destaque para o ótimo rejuvenescimento facial de Samuel Jackson que, a cada filme da Marvel, parece estar se tornando um importante elemento narrativo.

As cenas de ação, marca importante dos filmes do MCU, porém se mostram como algumas das mais desinteressantes já feitas naquele universo. Em filmes passados, o quase hipnotizante combate corpo a corpo movido a cortes rápidos inspirados em filmes sul-coreanos de artes marciais se tornou o padrão a ser esperado de uma produção Marvel. Aqui eles não se repetem por um motivo: a Capitã Marvel é poderosa demais. Talvez com exceção de um breve momento no início em que Carol e o personagem de Judy Law estão treinando técnicas de luta corporal, o resto do filme reserva a essas sequencias cenas que variam entre perseguições em naves espaciais e a capitã soltando rajadas de energia dos punhos explodindo tudo que vê pela frente. São cenas rápidas demais e que não mantém o interesse do público pela arte da coreografia, apenas talvez pelas explosões. Um defeito que já havia sido notado em filmes passados do Thor e que retorna aqui.

As cenas cômicas repetem erros cometidos no passado ( em especial no Guardiões da Galáxia 2) ao insistirem compulsivamente na mesma piada. O uso de piada, quando bem utilizado, pode ajudar na construção da mensagem do filme ( vide Guardiões da Galáxia 1 e Thor: Ragnarok) porém a insistência na repetição de determinado gracejo não só enfraquece aquele momento do filme como mina o interesse do público pelo o que pode rolar imediatamente depois.

Outra tradição da Marvel Studios que é honrada aqui são os péssimos vilões. Embora nos últimos anos, os filmes tenham brindado a plateia com excelentes antagonistas como Killmonger, Abutre e Thanos, em Capitã Marvel vê-se o retorno de inimigos superficiais, de importância nula para o espectador e sem maiores objetivos na trama. Não há um desenvolvimento maior sobre eles ou uma atenção destinada pelo roteiro a mostrar o que motiva suas ações de modo eles se tornem mais humanizados, eles são maus porque sim.

 

Call me if you really need me

 

Além de atuar como um filme individual, Capitã Marvel existe para preparar o terreno para Ultimato. Em sua cena pós crédito, Guerra Infinita introduziu a existência da Capitã pela primeira vez ao mostrar Nick Fury pouco antes de se desintegrar utilizando um pager modificado para notificar à Capitã de que sua ajuda é necessária. Em seu filme solo, há algumas referencias pontuais sobre a importância dela para o MCU antes mesmo da sua introdução. Apesar da ultima referência soar gratuita e desnecessária ela contribui para a construção de um sentimento de universo maior.

Porém, ao final da produção sobrou o temor de que um dos erros que rebaixaram Liga da Justiça: o elemento Deus ex-machina. Esse é um conceito que constantemente aparece em narrativa literárias ou filmes, basicamente ela surge em situações em que tudo parece perdido e nenhuma solução surge claramente, porém no ultimo segundo algo milagroso acontece e a situação muda a favor do então elemento oprimido. Para exemplificar há dois exemplos de deus ex-machina que tanto funcionam quanto não funcionam. O retorno de Gandalf ao final de Senhor dos Aneis: as duas torres é um exemplo de deus ex-machina pois até o momento os heróis estavam entrincheirados pelos vilões e quando Gandalf surge traz consigo um exercito que vira o jogo, aqui essa ferramenta narrativa funciona porque, em diálogos anteriores, o personagem já deixara claro que traria ajuda então não foi algo gratuito. Já em Liga da Justiça esse conceito falha por não explicar previamente a enorme quantidade de poder adquirida pelo Superman que sozinho salva os heróis de uma derrota acachapante.

Como dito anteriormente, os poderes da Capitã Marvel foram um elemento negativo no filme por justamente não terem estabelecido anteriormente quais são seus potenciais e, principalmente, limites. O temor então deixado para a participação de Carol Danvers em Ultimato é justificável visto que ela terá um papel central e estabelece assim uma proposta totalmente inversa à boa construção de Guerra Infinita, que é a de um vilão todo poderoso cuja a superioridade força os heróis pensarem melhor sobre como agir.

Há duas cenas pós crédito, sendo que a primeira é de suma importância e a segunda é descartável. Na primeira evoca-se um importante elemento narrativo que fora bem desenvolvido no decorrer do filme e pavimenta a possibilidade dele influenciar ainda mais a Capitã em Ultimato além de fazer importante ligação com a vindoura produção.

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