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A Chegada

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a-chegadaNovo filme de Denis Villeneuve questiona a existência humana

A existência humana está diretamente relacionada à questionamentos que passam pelas idéias de início e fim. De onde viemos? Pra onde vamos? Início e fim são conceitos com os quais passamos a vida nos debatendo, seja de maneira mais existencial passando pela religiosidade, seja de maneira temporal medindo os momentos que vivemos; o início de um relacionamento, o fim de um casamento, o início das aulas, o último dia de trabalho. A chegada e a partida. Tudo isso atrelado a uma ideia maior, à grande indagação sobre qual o nosso propósito, qual o propósito de tudo que vivemos e fazemos. Logo no início do filme a personagem de Amy adams, com algumas poucas palavras, parece jogar luz sobre todas essas questões ao declarar não ter mais certeza se acredita em inícios e fins. “Há dias que definem sua história para além da sua própria vida”.

Em uma breve narrativa com princípio e fim somos apresentados à tragédia pessoal da Dra. Louise Banks (Amy Adams), que já desde o primeiro instante, parece carregar o mundo nas costas, com uma melancolia e gravidade marcadas pelo olhar lânguido e pensativo e pela cautela nos movimentos, essa sensação é agravada por uma direção de arte excepcional e atenta aos detalhes que faz com que ainda nos minutos iniciais, o expectador se afeiçoe a personagem. Ao termino de uma narrativa se dá o início de outra. A doutora em linguística, professora em uma renomada universidade americana, é recebida por uma sala de aula vazia e então descobre através da televisão que 12 enormes objetos no formato de cápsulas se posicionaram de forma aleatória em partes diferentes do planeta, sendo uma delas em montana. O dia da chegada.

Nietzsche diz que a importância da linguagem reside no fato de que nela o homem colocou um mundo próprio ao lado do outro, para dali erguer o resto do mundo sobre seu eixo. A linguagem é mais do que a forma como nos comunicamos, nela impregnamos a maneira como entendemos o mundo, nossas crenças, cultura, noções de tempo. O japonês, por exemplo possui a noção de presente e futuro atreladas ao mesmo tempo verbal, já que o presente está sempre em movimento, o que reflete um jeito de ver o mundo muito diferente do ocidental que organiza a vida inteira, muitas vezes, em torno do futuro. A Dra. Banks acredita e escreve em um de seus livros que a linguagem é a fundação da civilização, a cola que mantém as pessoas unidas, e a primeira arma utilizada em um conflito. O governo americano, representado pelo Coronel Webber (Forrest whitaker) parece concordar com ela e a recruta para, juntamente com Ian Donnelly (Jeremy Renner), tentar estabelecer uma comunicação.

O mundo criado por Villeneuve e sua equipe é simples e realista, tanto que, como diz a própria personagem, chega a ser difícil verbalizar a ideia de alienígenas. O filme apesar de pertencer ao gênero da ficção científica, segue um caminho bem particular, fugindo da ação e aventura, de explosões e sacrifícios heroicos que vão salvar o mundo, mas inquestionavelmente os alienígenas estão lá e uma pergunta, velha conhecida da humanidade, precisa ser respondida: “Qual o seu propósito aqui?”.

Essa é a função da Dra. Banks, estabelecer uma comunicação com eles e conseguir respostas. A cada 18 horas uma porta é aberta, levando ao interior do receptáculo, onde, mais uma vez, a direção de arte ganha enorme destaque com o ambiente construído irretocavelmente de forma simples e crível. Nesse ambiente claustrofóbico eles fazem contato e começam um processo de troca, em que um começa a aprender o idioma do outro. Porém, esse é um processo demorado. Quanto mais próxima fica dos seres, que são denominados octópodes, mais intensos e frequente são os flashes de memória que levam a personagem à um estágio de confusão e cansaço, mas que ao mesmo tempo parecem querer dizer alguma coisa. O suspense é uma crescente. A medida que o tempo passa as tensões mundiais aumentam. O desenvolvimento de canais de comunicação é buscado por todos os líderes mundiais, cada um lidando à sua maneira com a capsula dentro de seu território. A tensão aumenta quando após um contato o líder chinês que se sente ameaçado e declara guerra contra os alienígenas, fazendo com que o sucesso da protagonista seja ainda mais urgente. O silêncio, a ausência de comunicação são ingredientes perigosos e vemos no contexto mundial o caos estabelecido pelo medo desse enorme desconhecido silencioso. O filme ressalta o enorme separatismo existente no mundo e a dificuldade que existe de cooperação para solução de problemas.

A Chegada é um drama que conta uma história maior através do jornada individual de um único personagem. Essa estratégia narrativa revela uma história muito humana e faz com que seja mais um reflexo da humanidade, em que de certa forma, os alienígenas são meros catalisadores. A direção de Denis Villeneuve (Homem duplicado, Sicário, Incêndios) é brilhante e todos os elementos da produção vão se encaixando para formar esse belíssimo filme. A fotografia de Bradford Youg (Selma, O ano mais violento) e a direção de arte são complementadas com uma trilhas sonora incrível, responsável por exacerbar diferentes climas em diferentes momentos do filme, seja o drama do sofrimento, a crescente tensão, o medo, a sensação de claustrofobia. A trilha amarra de maneira muito eficiente todos os sentimentos criados pela construção visual. E tudo isso, como se fosse pouco, ainda vêm atrelado à uma belíssima e arrebatadora interpretação da Amy Adams, que é cativante da primeira a última cena, carregando com maestria o peso do filme e o desenvolvimento de sua personagem.

Com um inesperado e surpreendente desdobramento, a conclusão lança um olhar inteiramente novo sobre a história, obrigando o expectador a revisitar todo o filme a procura de respostas. A projeção termina, mas a experiência está longe de terminar. Acompanha o expectador que com certeza terá bastante sobre o que refletir.

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