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Higienização social e nossos desconhecimentos em “Curral Grande”

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Por: Thales Valoura

Devido a nossa intensa construção escolar e social formada principalmente pela história europeia, muito sabemos dos campos de concentração nazistas construídos durante a Segunda Guerra Mundial, mas pouco – ou nada – conhecemos sobre os campos de concentração criados durante as grandes secas do Ceará do século XX. Sim, tivemos campos de concentração no Brasil antes mesmo do Nazismo. Também conhecidos como currais, esses locais foram construídos no Ceará pelos governos federal e estadual durante a seca de 1915 a fim de evitar invasões das grandes cidades pelos retirantes e novamente usados em secas posteriores. Os flagelados eram vigiados por soldados e [sobre]viviam em meio a total miséria.

É essa espécie de higienização social – que vemos constantemente ainda hoje através, por exemplo, do projeto “cidade limpa/linda” do prefeito João Dória em São Paulo e da construção de megaestruturas culturais no Rio de Janeiro distantes do centro e zona sul para afastar os mais “pobres” – que constitui a peça “Curral Grande” do coletivo Ponto Zero. A montagem traz os currais usados na seca de 1932 nas cidades do Ceará onde os flagelados viviam em condições desumanas, com o mínimo cuidado médico e/ou alimentação. Diferente do que temos construído imageticamente sobre as secas do Nordeste, a direção de Eduardo Machado e texto de Marcos Barbosa trazem os currais e a seca vistos por outras perspectivas, não somente carregado de tristeza, melancolia e escuridão que a temática produz.

Diferentes gêneros de narrativas audiovisuais são usados para dar forma a oito cenas, onde quatro atores se revezam entre 40 personagens diferentes. Essa formação é perfeitamente auxiliada pelo cenário e seus elementos cênicos marcam as distinções necessárias para cada cena. Os contextos históricos utilizados para marcar a data de 1932, como uma canção de Carmem Miranda ou uma matéria de jornal do ano também são importantes componentes cênicos.

Num momento tão importante da nossa história social e política, em que as histórias estão sendo reescritas e recontadas por outros vieses, ver a seca nordestina e seus campos de concentração contados de diferentes maneiras, inclusive com uma pegada por vezes cômica, dá a leveza necessária diante de um tema tão complexo, fugindo, principalmente, do lugar comum que geralmente é posta nas reproduções midiáticas.

 

 

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Redação do site E-mail: contato@rotacult.com.br

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