- Publicidade -

Cassandro: Filme celebra suas escolhas profissionais e pessoais

Publicado em:

CassandroDesde que foi exibido no Festival de Sundance em janeiro deste ano, Cassandro, cinebiografia de um dos mais proeminentes lutadores de lucha libre contemporâneos, chamou atenção por colocar o astro Gael García Bernal na pele do protagonista. Para quem não o conhecia, Cassandro é o nome artístico de Saúl Armendáriz, lutador profissional mexicano, que teve sua fama catapultada para fora de seu país ao assumir sua persona exótica, denominada pelo esporte. Dentro da Lucha Libre, você pode ser designado como uma atração vencedora, como uma escada ou como Exótico – e foi Cassandro o responsável por tirar dessas figuras a pecha alegórica que eles tinham, para, enfim, poderem também brigar por vitórias.

Mas Cassandro, surpreendentemente, não é exclusivamente sobre a sexualidade de seu protagonista. Essa seria a saída fácil, até esperada, roupagem a ser encarada pelo projeto, porém o roteiro de David Teague e do diretor Roger Ross Williams prefere, centrar sua narrativa no período em que Cassandro alcança sua explosão mundial, além de acompanhar o que esse esporte em específico tinha de tão fascinante para o personagem. Assim sendo, estamos diante de um filme que é uma porta de entrada não-didática para um esporte ainda muito centrado no México, e também é uma carta de apresentação ao que se tornou o símbolo de um literal orgulho LGBTIAPN+ no país.

Williams é o primeiro artista negro a ganhar um Oscar de curta documental (Music by Prudence), e talvez seu pioneirismo étnico tenha sido uma inspiração vital para ser pouco dramático na sua abordagem de outro pioneiro. Cassandro é um filme quase cru no que está sendo contado, de maneira pouco emocional, e acaba por alcançar a emoção através dessa segurança no que conta, dessa maneira pragmática. Talvez seja um filme que possa ser acusado de alguma frieza, mas a paixão do projeto exalada pelos olhos de Bernal algumas vezes, retrata melhor esse lugar pouco confortável ao público que não conheça a modalidade esportiva. É uma abordagem comprada pelo seu protagonista sem economia, ao entregar-se para uma figura de corporalidade tão frontal.

Com dois brasileiros na ficha técnica (um dos montadores é o Affonso Gonçalves, e a belíssima trilha é composta por Marcelo Zarvos), Cassandro é um projeto onde seus símbolos acompanham a narrativa na importância do que está sendo contado. Como membro da comunidade ‘queer’, me envergonho de conhecer tão pouco a trajetória de alguém que fez tanto pela causa gay através da exposição de sua arte. Vivemos em um tempo de criação de novos ídolos, descentralizados e com focos tão diversos, que uma figura ainda jovem como Cassandro pode sim ser recolocado em um lugar de representação de orgulho dentro do esporte. O filme celebra mais do que sua trajetória, mas principalmente suas escolhas, profissionais e pessoais, que o elevam em todos os sentidos.

Na secura que as elipses propostas pela narrativa provocam, alguns detalhes não conseguem ser devidamente sanados. Seu trato com as drogas, a relação com a memória de seu pai, são alguns dos pontos que o filme acaba acoplando também ao repertório de sua costura, que é bem feita mas escolhe por jogar mais sombras do que luz em eventos. Não é um dado defeituoso tradicional de biografia, porque claramente é uma proposta de tratamento de roteiro, andar à margem da narrativa, potencializando seu protagonista com pinceladas dela, aqui e ali. Estamos diante de um filme que tem mais interesse em mostrar esse homem do que explicá-lo, de exaltar sua figura mais do que decifrá-la.

Para esse propósito, a presença de Bernal é, certamente, fundamental por seu excesso de maravilhamento. Não exatamente por alguém ou por alguma coisa, mas, no coletivo, o astro de Diários de Motocicleta parece viver um transe apaixonado por um personagem – o seu. Há um explícito orgulho de estar naquela pele, com aqueles figurinos, vivendo alguém crucial para o entendimento de vários jovens em sua própria sexualidade.

O clímax de Cassandro, ao meu ver, nem é exatamente na luta que o consagra, mas no momento seguinte, quando o protagonista é entrevistado por seu oponente, e um jovem levanta da plateia para se dirigir a ele. Ali, o distanciamento que é conseguido durante toda a produção vai embora, graças ao olhar de Bernal, e a felicidade de enxergar um exemplo vivo à nossa frente, do qual podemos bater no peito de orgulho.

 

Mais Notícias

Nossas Redes

2,459FansGostar
216SeguidoresSeguir
125InscritosInscrever
3.870 Seguidores
Seguir
- Publicidade -