Tomás Portella conta a história da Rádio Fluminense, em Aumenta que é Rock’n’Roll

Tomás Portella é um daqueles cineastas que, em pesquisa rápida no Google, nos damos conta de que sua filmografia parece ser mais tímida do que seu dono. São 13 anos de carreira e esse é seu oitavo trabalho (vem um outro, o nono, ainda esse ano), mostrando a versatilidade de quem trabalha com o que sabe. Desse jeito, foi à comédia, ao terror, ao policial, ao drama, ao filme de ação, ao romance, quase nunca repetindo o gênero, mas emprestando elementos de um a outro, e seguindo assim. Antes da moda do ano passado, Aliás, Portella já tinha aderido a complexa empreitada da ‘biografia das coisas’: em Aumenta que é Rock’n’Roll não necessariamente conta a história de um criador, mas sim do que ele criou. Assim como Air (com o tênis) e Tetris (com o jogo), porém rodado bem antes desses, o homem por trás de algo continua por trás, o que importa aqui é uma rádio.

A nova empreitada de Tomás Portella poderia ter rendido um filme burocrático, sem dimensões louváveis, com tipos chapados criando um pano de fundo para o real interesse da produção, a Rádio Fluminense 94,9. Em 1982, não existia internet, tv a cabo, computador pessoal, celular, nada disso, mas existiam os programas de rádio. Luiz Antonio Mello, um jornalista e apresentador de rádio, percebeu uma lacuna na programação, em meio à falta de perspectiva pessoal. Nascia o embrião para a formação da ‘Maldita’, apelido que a rádio ganhou, se transformando em sucesso instantâneo entre os jovens que buscavam fugir do lugar comum. O que Aumenta que é Rock’n’Roll mostra é, acima de tudo, o retrato de um tempo, mas o carinho pela peça é tão grande, que outros elementos essenciais acabam se fazendo presentes.

Com reconstituição minuciosa de um caos chamado Fluminense, o filme recria o sentimento de recuperação da identidade e do ufanismo com algo que ninguém sabia direito o que era, mas o sentimento era forte. O fim da ditadura militar, as votações para as eleições diretas, a criação do primeiro festival de Rock, essas são as portas de entrada para Aumenta que é Rock’n’Roll tentar absorver o espírito de uma geração cheia de ansiedade. Para tanto, além da sensação palpável de que algo estava sendo redefinido, existe um trabalho de direção de arte que serve para impressionar a produção como um todo, com o tanto de detalhe apresentado em pouco menos de duas horas de exibição.

O que Tomás Portella faz aqui vai além de reconfigurar sua carreira, além de posicioná-lo dentro de trilhos onde ele não havia estado anteriormente. Ele manufatura um escopo maior do que a ambição da produção poderia imaginar, que sugere um novo olhar para o que ele produz de imagens. É um tipo de granulado que vai se definindo ao longo da projeção, transformando a paleta de cores durante o processo, de maneira orgânica ao que é contado. Indo além, Aumenta que é Rock’n’Roll faz uso da qualidade de texto que apresenta em linhas gerais, seu diretor, certamente, está pronto para não se prender aos rótulos que tentam inserir nele.

Além disso, Aumenta que é Rock’n’Roll ainda encontra tempo para nutrir uma história de amor cheia de percalços, e nos fazer chamar os dois protagonistas como tipos que parecem seguir o único passo de mostrar seu amor. Como estamos falando de dois atores que vendem química, Johnny Massaro e Marina Provenzzano rivalizam com a formação da rádio o posto de mais carismático assunto a ser tratado aqui. O que falta ao roteiro de L.G. Bayão é a noção de que, ao abraçar o tom episódico, o material soa repleto de fagulhas desnecessárias, que completam uma adição x na narrativa por um curto espaço de tempo, e somem sem motivo para conexão desse encontro de incertezas.

Servindo como bússola para a geração essencial do Rock Nacional, a ‘Maldita’ lançou Titãs, Blitz, Legião Urbana, Barão Vermelho, Os Paralamas do Sucesso, Plebe Rude, e muito mais! Sendo todos eles um grupo de artistas imprescindíveis à nossa história musical. Não existiu inocência na forma como Melo resolve bancar um sonho impossível, assim como eram o da redemocratização, e o da oportunidade inédita para as mulheres darem voz a uma rádio, Aumenta que é Rock’n’Roll é uma síntese arranhada de um período histórico de abertura e explosões, que como costuma acontecer foi mais veloz para os indivíduos do que para as coisas. Com isso, o que deveria ser um drama, ou uma comédia, para contar uma história essencialmente política, mas cuja descontração provocou uma cortina de fumaça que não fizesse perceber a criação da História e o nosso testemunho a respeito dela.