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De Repente, Miss!: Hsu Chien joga na trave mais uma vez

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Estamos vivendo ou apenas habitando o mundo pertencente a Hsu Chien? Desde fevereiro do ano passado, um total de três filmes dirigidos por ele já estrearam no circuito, e nessa quinta-feira mais dois estreiam. Sim, dois filmes do mesmo diretor e protagonizados pela mesma atriz. Creio que um erro esteja sendo cometido, mas não tenho qualquer autoridade sobre essa decisão. Dessa forma, temos em 15 meses um total de cinco filmes novos de Chien a adentrar sua filmografia.

De Repente, Miss! é uma comédia para toda a família que entra num filão que comentei a pouco aqui no site, as comédias populares de férias na praia/parque aquático, que o próprio diretor tinha acabado de lançar um exemplar, Licença para Enlouquecer. Na linha de frente, temos as talentosas Fabiana Karla e Giulia Benite como mãe e filha embarcando com sua família para uma temporada no Beach Park – que não é nomeado, mas tem sua marca presente em muitas cenas do filme.

O filme é roteirizado por Dani Valente, ótima atriz que faz sua estreia como autora de cinema, mas tem os valores familiares que são caros a Chien. Logo, a identificação dele com o material é muito fácil, de conexão imediata; ou seja, ele já tem uma assinatura de reconhecimento instantâneo de sua filmografia impressa aqui. De Repente, Miss!, graças ao talento de seu elenco, consegue encontrar uma fonte de humor que está na base do cinema de seu diretor, de maneira bem mais eficaz que sua incursão anterior. O desenho dos personagens, também uma contribuição de Valente, esbarram nos clichês a todo momento, mas funcionam na seara que se propõem. Ninguém está mesmo esperando encontrar uma revolução aqui, e o filme não a promete.

O que ainda não faz sentido, tendo Chien a experiência que tem, são as escolhas estéticas que ele faz. Algum leitor poderia argumentar que a mim não se conectam obras com esse viés popular, no que responderei que é só procurar meus textos aqui a respeito de Dois é Demais em Orlando e Evidências do Amor para constatar que não é bem assim. O que talvez faça sentido é, vide que o cineasta repete muito do que não funcionou em outros filmes que eu não encontro identificação imagética a nenhuma outra, assim não se comunicando comigo. São ideias que, na minha análise, não funcionam na totalidade nem dentro de um universo da neochanchada, nem na dramédia familiar agridoce. Mais uma vez, é uma visão muito particular do que faz sentido no que sugerem planos, na tradução do roteiro pra tela, na condução dos atores, cuja unidade não transparece.

Se de um lado Karla e a musa de Chien, Daniele Winits, cumprem todos os requisitos da boa comédia, atores com personagens menores parecem perdidos ou são simplesmente ruins mesmo, caso do intérprete do interesse romântico de Benite. João Baldasserini está muito bem, assim como Roney Vilela, mas os atores que fazem os jovens colegas de profissão de Karla são muito fracos. Mas existe uma pessoa premiada de verdade por De Repente, Miss!, e ela se chama Nedira Campos. Atriz de teatro com uma linhagem no humor e no drama, cria televisiva de Jô Soares, Campos nunca teve uma oportunidade no audiovisual que mostre o que o espectador dos anos 80 sabe há 40 anos. Seu personagem não é grande, ela vive a babá dos filhos de Winits, mas deve ser a melhor criação do roteiro, que a atriz deixa claro que merecia mais espaço. O tempo que ela tem, sua entrega, é suficiente pra mostrar como é criminoso o que não foi dado a ela, e isso sem dúvida é um mérito que devemos dar a Chien.

Infelizmente essa característica não se fecha na personagem de Campos. Muitas situações promissoras são apenas vislumbradas pelo desenvolvimento do projeto, sem desembocar no produto final. A tentativa de aproximação e princípio de sororidade entre as protagonistas rivais é boicotada pela necessidade de marcar Winits como uma vilã sem nuances. Isso não é culpa da atriz, que está mais do que pronta e vende capacidade de ir além do que geralmente destinam pra ela. Como um todo, De Repente, Miss! se mostra incapaz de compreender que existia em todos os lados, chances para ser mais: mais engraçado, mais encorpado, mais amplo, mais abrangente, ou seja, melhor. Existe um teto que é colocado para o filme respirar que é inferior ao que está à sua disposição. Ou talvez ser apenas agradável eram suas intenções, quando o cinema nacional popular não precisa de um freio qualitativo.

A direção de Chien apresenta excessos de closes e de ‘slow motion’ incompreensíveis, que tentam apresentar um olhar aproximado sobre aquela família, mas cria o oposto. Somos apartados de quem é filmado, porque essa quantidade de elementos carrega as imagens de artificialidade. Com isso, o que deveria ser o principal ativo de De Repente, Miss! – o afeto que une uma família, para refletir a desagregação de outra – não se sustenta. Seus atores, ainda que imerso em frases de auto ajuda e declarações que parecem ditados populares sendo reproduzidos, ficam solitários na defesa do material. Nós, espectadores, sorrimos aqui e ali, algumas vezes cúmplices, outras tantas de nervoso pela desarmonia apresentada.

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