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A Outra Forma: Animação fala de coisas da realidade em um mundo distópico

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Recentemente exibido na CCXP 2024, após uma temporada de sucesso na Europa em que, entre outras mostras, foi aplaudido no Festival de Cinema de Animação de Annecy, na França, o longa-metragem A Outra Forma, dirigido e roteirizado pelo cineasta colombiano Diego Felipe Guzmán, retrata, sem diálogos ou quaisquer falas; mas com uma trilha sonora intensa e poderosa, um futuro distópico, não tão distante assim, onde o principal objetivo da humanidade é se submeter a um processo de quadratura e embarcar em um foguete rumo à lua. Lá, o que aguarda as pessoas é a oportunidade de fazer parte de algo bem maior: uma espécie de paraíso cúbico. Meio louco, não? 

Esta animação, uma coprodução Colômbia-Brasil, tem um protagonista que serve de fio condutor da trama. Apesar de em alguns lugares ele ser chamado de Peter Press ou Pedro Prensa, no filme propriamente dito em nenhum momento este nome é citado. De qualquer maneira, esta possível alcunha é compreensível, pois sua cabeça é achatada lateralmente por um prensa. Acontece que nem sempre ele foi assim. Ao longo da trama, temos vislumbres do seu passado por meio de lembranças e através destas o enxergamos ainda criança, escalando árvores para observar a lua, e a sua aparência é a de um menino qualquer. 

Quando a história volta para o presente, descobrimos que tanto o protagonista quanto os demais personagens estão submetidos a uma contagem progressiva de 0 a 100. O contador de cada pessoa está fixado na janela ou na varanda, do lado de fora, dos apartamentos. Completar a contagem centesimal significa completar o processo de quadratura e ser autorizado a embarcar no foguete rumo ao espaço. Todavia, no tão aguardado dia, um incidente impede que o nosso personagem principal embarque e reinicia a sua contagem. 

Paralelamente, a narrativa concebida por Guzmán desenvolve mais dois personagens importantes. Um deles é uma mulher, uma modelo famosa, que estampa cartazes espalhados por toda a cidade. É impossível ficar indiferente a ela, os homens que a admiram são a prova disso. Até que, assim como o protagonista, um incidente atrapalha o seu processo de quadratura. O outro é um rapaz que traz sempre uma caixa quadrada de papelão enfiada na cabeça. Nada mais sobre ele é mostrado. 

A Outra Forma, como qualquer obra sobre distopias, imagina uma realidade inexistente, por vezes surreal, para falar de coisas da realidade em que está inserida e foi concebida. A tal outra forma a qual o título se refere, inicialmente, soa como uma referência explícita ao processo de quadratura. Um dia, e isto o longa-metragem não explica o porquê, a humanidade decidiu deixar de ser como era para adquirir novos contornos geométricos. Todavia, esta é uma interpretação bastante simplória e distopias não seguem uma lógica simples ou fácil.

A interpretação mais adequada encontra-se no que acontece com o protagonista e a modelo após os seus respetivos incidentes. Ainda que com dificuldade e alguma resistência inicial, ambos começam a ver que há outras formas fora o quadrado, afinal. a humanidade não foi sempre daquele jeito. A partir daí, aquelas lembranças das quais tivemos vislumbres se revelam resquícios de uma individualidade que estava dormente dentro do personagem principal e que necessitava apenas de uma fagulha para despertar. 

A Outra Forma pode ser entendida como um protesto contra todo tipo de padronização social: da beleza, do comportamento, da opinião pessoal e de tantas outras coisas. A individualidade que leva à discordância, consequentemente, ao debate e à construção de alternativas para o que não está dando certo é o que fez a humanidade progredir. E, mesmo sem o filme dar qualquer explicação, dá para deduzir que foi deste jeito que ela adquiriu a capacidade de realizar viagens para o tal paraíso cúbico. Se todos fossem quadrados desde o começo, nada disso teria sido possível. 

Pensando melhor, até que, no final das contas,  não há nada de meio louco, né? 

Desliguem os celulares e boa diversão.

Bruno Giacobbo
Bruno Giacobbo
Um dos últimos românticos, vivo à procura de um lugar chamado Notting Hill, mas começo a desconfiar que ele só existe mesmo nos filmes e na imaginação dos grandes roteiristas. Acredito que o cinema brasileiro é o melhor do mundo e defendo que a Boca do Lixo foi a nossa Nova Hollywood. Apesar das agruras da vida, sou feliz como um italiano quando sabe que terá amor e vinho.

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