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Histórias que é Melhor Não Contar: Cesc Gay faz uma perspicaz cronica da classe média espanhola

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O que faz de um filme uma obra importante? Eu não tenho esta resposta e duvido muito que alguém a tenha. Primeiro, porque o que é importante para mim, não necessariamente será importante para outra pessoa. Certo? Mas, alguém dirá que um filme importante é aquele que ganha prêmios e é aplaudido pela crítica. No entanto, com certeza surgirão defensores da teoria de que a opinião da crítica não importa, desde que a obra em questão seja abraçada pelo público. Por outro lado, alguns falarão que os melhores filmes são os que fazem os espectadores pensarem e, quem sabe, mudarem a forma com veem o mundo. Isso quer dizer que os filmes sobre o cotidiano não são importantes? Eu discordo e o cineasta espanhol Cesc Gay, autor de Histórias que é Melhor Não Contar, também discorda. 

Desde 2012, quando lançou o longa O Que os Homens Falam, passando por “Truman”, que foi exibido no Festival do Rio de 2015, Gay se notabilizou por ser um perspicaz cronista da classe média espanhola. Seus trabalhos, apesar de oscilarem entre a comédia e o drama, não são densos e não provocam grandes reflexões. Esta não é a sua praia. As questões que lhe interessam não são aquelas que farão os espectadores verem o mundo de outra forma. As questões que norteiam os seus trabalhos podem ser chamadas de pequenos problemas burgueses ou de comezinhas. Coisas envolvendo sexo, traição, dúvidas em relação aos rumos de uma relação matrimonial e por aí vai. Assim, na esteira das duas películas supracitadas, o filme “Histórias que é Melhor Não Contar” pode ser considerado o “novo capítulo” de uma franquia informal.

Neste “novo capítulo”, roteirizado por Cesc Gay em parceria com Tomás Aragay, nos deparamos com cinco pequenas histórias. Na primeira, os vizinhos Alex (Chino Darin) e Laura (Anna Castillo), entre um passeio e outro com seus respectivos cachorros, flertam no parque. Já na segunda, o recém desquitado Carlos (Alex Brendemühl) conhece uma bela aspirante a atriz, Sandra (Eva Reyes), e, incentivado por um casal de amigos, flerta com ela para esquecer a ex-esposa. Por sua vez, no terceiro seguimento, três amigas e atrizes, Carol (Alexandra Jiménez), Blanca (Maribel Verdú) e Angela (Nora Navas), participam de uma audição para uma nova produção. Na quarta trama, Andrés (José Coronado), um velho romancista, leva sua jovem namorada, Bárbara (Alejandra Onieva), para almoçar. Ele tem alguns planos em mente, mas uma grande revelação pode atrapalhar tudo. Por último, durante um jogo de tênis, Edu (Quim Gutiérrez) confessa um segredo para Jota (Brays Efe) e se mostra preocupado com o futuro da sua relação com Sofia (Verónica Echegui). 

Obras como estas, estruturadas em formato coral, em que diversas historias ocorrem na mesma época, na mesma cidade e às vezes simultaneamente, costumam, quase sempre, terminar com todos os protagonistas se encontrando em um único lugar. Em alguns casos, eles até se conhecem, são vizinhos, como, por exemplo, em “Decálogo” de Krzysztof Kieslowski. Aqui, no entanto, Gay e Aragay optaram por não vincular suas histórias. O único vínculo comum seria a cidade. Esta vinculação, acredito eu, costuma ser utilizada mais com o intuito de dar um senso de unidade aos longas-metragens. Todavia, não é algo obrigatório e muito menos necessário, pelo menos nos filmes do diretor espanhol. Em “Histórias que é Melhor Não Contar” a unidade é conferida pela temática das tramas, pelas preocupações dos personagens que, com leves variações, como escrevi anteriormente, versam sobre os mesmíssimos interesses. São comezinhas, problemas burgueses, mas é o que passa pela cabeça da maior parte do público que paga pelos ingressos para ir ao cinema, seja ele espanhol ou brasileiro. 

Sem grandes movimentos de câmeras ou quaisquer peripécias fílmicas, o destaque principal desta obra está em seu roteiro e na qualidade do elenco. O primeiro dispõe de diálogos ágeis, que provocam algumas situações bastante ridículas e até mesmo absurdas, mas que causam muitos risos. Não sei se riríamos se acontecesse conosco, retrospectivamente, talvez, afinal não dá para levar a vida tão a sério, certo? Já o elenco não conta com parceiros habituais do diretor como Ricardo Darin e Javier Camara, aliás, este, dá as caras, sim, fazendo uma pontinha. Em compensação, honrando o sobrenome, Chino Darin está ótimo na primeira história e demonstra uma boa química cômica com Anna Castillo. E assim, sucessivamente, todos fazem jus ao texto. Contudo, o ápice, para mim, está na segunda historia, por sinal, a minha favorita. Antônio de la Torre e Maria León, intérpretes do casal amigo de Carlos, são aqueles amigos que você quer ter sempre por perto. Aliás, eles me remeteram a outro casal: Max (Tim McInnerny) e Bella (Gina McKee) de “Um Lugar Chamado Notting Hill”, o clássico das comédias românticas. 

O que faz de um filme uma obra importante? Estou acabando de escrever esta crítica e continuo sem ter uma resposta. Disse e repito: duvido muito que alguém a tenha, até porque, no final das contas, cada um sabe o que é mais importante para si. Para mim, por exemplo, é importante, de vez em quando, após um dia estressante, entrar na sala escura de um cinema e dar boas gargalhadas. Eu gosto muito de pensar e de refletir, mas tem dia que o meu cérebro pede outra coisa. Se vocês concordam comigo, se são assim ao menos de vez em quando, então, vocês precisam dar uma chance ao longa Histórias que é Melhor Não Contar. 

Desliguem os celulares e boas gargalhadas. 

Bruno Giacobbo
Bruno Giacobbo
Um dos últimos românticos, vivo à procura de um lugar chamado Notting Hill, mas começo a desconfiar que ele só existe mesmo nos filmes e na imaginação dos grandes roteiristas. Acredito que o cinema brasileiro é o melhor do mundo e defendo que a Boca do Lixo foi a nossa Nova Hollywood. Apesar das agruras da vida, sou feliz como um italiano quando sabe que terá amor e vinho.

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