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“Marginal Genet” faz visceral retrato da juventude de um autor maldito

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Ao escrever “pior do que não realizar os sonhos de sua juventude seria ter sido jovem e nunca ter sonhado”, Jean Genet (1910-1986) libertou sua legião de leitores (como prosador e poeta) e de espectadores (nos teatros que lotou) para uma utopia cujo único plano de metas é o querer (e, com ele, o gozar). A partir dos versos de “Le Condamné à Mort” e de um romance, “Nossa Senhora das Flores” (1944), ele fez de seu viver a mediação de uma dramaturgia (literária e teatral) à flor da pele, em que o desejo era a estrela de Belém de personagens em tempo de danação. Aliás, a canção “Cada homem mata aquilo que ama” (“Each man kills the thing he loves”), entoada pela atriz Jeanne Moreau na adaptação para telas de seu “Querelle” (dirigida por Rainer Werner Fassbinder, e lançada em 1982), traduz seu olhar para as estratégias do gostar em sua obra. É essa sanha destrutiva que norteia o diálogo feito pelo encenador Francis Mayer com seu legado na peça “Marginal Genet”, que abriu o circuito de estreias cênicas cariocas em 2025, no Cine Teatro Joia. É uma peça de imersão no que há de inflamável o olhar genetiano.    

Cerca de um ano depois do visceral “Pasolini No Deserto da Alma” (capaz de mesclar o hit “Iron Man” de Ozzy Osbourne à poética do diretor de “Pocilga”), Mayer prossegue na sua cartografia de “malditos”, concentrando-se sobre os anos de formação de Genet. Arrisca um retrato do autor quando jovem, contando com a entrega radical do ator Thiago Brugger no papel título. A linha central de seu espetáculo é a educação sentimental (pela pedra) do escritor, a partir dos fatos narrados em seu “Diário de um Ladrão” (1949), editado aqui pela Nova Fronteira. 

Além disso, as páginas escolhidas por Mayer comportam as experiências de Genet com a marginalidade, no relato dos crimes em que se envolveu para sobreviver e na imolação de seu corpo ao “deus dinheiro”, na prática da prostituição. Filho de uma garota de programa que o abandonou à adoção, ele escreve sobre a opção em viver nas (e das) ruas, experimentando o prazer nos braços e nos beijos de homens por vezes hostis. Bernardini (interpretado com viço por Vinícius Moizés) é um desses amantes. 

Existe lugar para a amizade em seus dias de mocidade também, vide o acolhimento por parte da diva da noite Charlotte Renaux (Samuel Godois, em tocante atuação). É desse seu tempo de moço que brotam as cicatrizes que servirão como tinta ao repertório narrativo a ser construído por Genet a partir dos anos 1940, o que fez dele um porta-voz do fino da fossa. Mayer, habilidoso na construção de cenas claustrofóbicas, certamente, elabora uma encenação nervosa, que nos leva a refletir sobre a solidão que precede um beijo roubado, uma escolha, uma renúncia. Mais feroz do que ela é a solidão de abandono. Essa é a solidão sobre a qual Genet mais e melhor escreveu.       

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