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Homens de Barro retrata o amor de Romeu e Julieta de forma homoafetiva

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Os clássicos, certamente, parecem ter a inevitável vocação para a inspiração. Histórias como o amor de Romeu e Julieta, de William Shakespeare, são encenadas e filmadas desde o momento que o primeiro tablado foi construído ou o primeiro diretor gritou: “Luz, câmera e ação”. Algumas destas versões são convencionais, outras primam pela ousadia e podem ser chamadas de releituras. Em 1961, a inimizade entre os Capuletos e os Montecchios ganhou ares latinos e foi ambientada nos Estados Unidos, no longa-metragem Amor Sublime Amor, recentemente refilmado por Steven Spielberg. Já em 2005, no divertido O Casamento de Romeu e Julieta, a rixa era motivada pela rivalidade entre corintianos e palmeirenses. E assim tem sido ao longo do tempo, sempre ao bel prazer dos novos autores. Dito isto, com Homens de Barro, dirigido pela cineasta gaúcha Angelisa Stein em parceria com o diretor argentino Fernando Musa, não haveria de ser diferente. 

Homens de Barro

Um coprodução Brasil e Argentina, rodada no bairro de Belém Velho, em Porto Alegre, o filme retrata a rivalidade entre as famílias Miranda e Tamai, ambas proprietárias de olarias e por esta mesma razão concorrentes comerciais. Indiferentes a esta disputa, os primogênitos dos dois clãs, respectivamente, Pássaro (Gui Mallmann) e Marciano (Alexandre Borin), desfrutam, dentro do possível, de uma infância feliz na qual são melhores amigos. Após uma tragédia que se anuncia desde o começo da trama, eles se afastam e perdem qualquer contato. Tudo corre bem, até que, um dia, o irmão caçula de Marciano, Ângelo (João Pedro Prates), que havia deixado a lugarejo para estudar em uma universidade, volta para casa durante as férias. E o que ninguém poderia imaginar acontece: ele se apaixona por Pássaro e é correspondido. 

A ousadia do longa é retratar o amor de Romeu e Julieta de forma homoafetiva e em uma cidade do interior do Brasil onde, independentemente do ano em que nos encontramos, sempre haverá preconceito e rechaço por parte da conservadora família brasileira. Aliás, o fato das famílias alimentarem uma antiga rivalidade, iniciada por questões financeiras e abrasada pelo peso de uma tragédia, é só um elemento a mais, um catalisador de um desfecho que se mostra quase o tempo todo inapelável e muito difícil de se desvencilhar. No entanto, apesar da carga dramática, do ar irrespirável nos momentos de tensão e de uma nova tragédia que se anuncia iminente, há diversos instantes de leveza vividos pelo casal protagonista. 

Desconhecidos, pelo menos para este crítico, até assistir Homens de Barro, os intérpretes  Gui Mallmann e João Pedro Prates sustentam com bastante desenvoltura seus papéis. Existem traços em comum que unem as respectivas personalidades: Tanto Pássaro, quanto Ângelo, são aparentemente tímidos. Ambos possuem uma doçura no tratamento com os outros e são muito decididos. A prova disso é que, quando percebem o que está rolando, não hesitam. É claro que ninguém está livre de ter dúvidas ao longo do percurso, como veremos mais tarde. No entanto, esta é uma reação normal e que não diminui em nada o impacto da decisão inicial de entrar naquela história. Em contraste, Alexandre Borin confere ao seu personagem um ar mais taciturno e de permanente revolta. Dos três, é o que nunca se recuperou dos eventos do passado. Outra boa interpretação. 

Como produção, o longa-metragem da dupla Angelisa Stein e Fernando Musa, Homens de Barro se revela uma obra honesta e bem intencionada. As locações de Belém Velho, um bairro na região urbana da capital gaúcha, mas que ainda conserva características bem rurais, certamente, foram úteis ao propósito de transmitir ao público a ideia de que aquelas pessoas pertencem a uma outra época, pelo menos no que condiz à mentalidade. Além disso, houve claramente uma escolha por muitas cenas noturnas, friorentas, que, incialmente, se alternam quase em pé de igualdade com as tomadas diurnas, mas que, na reta final, passam a ser maioria. Está opção reforça uma velha técnica de utilizar o calor ou o frio como elementos sublimadores do efeito pretendido, aqui, a aproximação do inapelável desfecho. 

Desliguem os celulares e boa diversão. 

Bruno Giacobbo
Bruno Giacobbo
Um dos últimos românticos, vivo à procura de um lugar chamado Notting Hill, mas começo a desconfiar que ele só existe mesmo nos filmes e na imaginação dos grandes roteiristas. Acredito que o cinema brasileiro é o melhor do mundo e defendo que a Boca do Lixo foi a nossa Nova Hollywood. Apesar das agruras da vida, sou feliz como um italiano quando sabe que terá amor e vinho.

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