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O Macaco: Osgood “Oz” Perkins adapta conto de Stephen King

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A maleabilidade do terror enquanto gênero cinematográfico e também a de alguns realizadores que transitam nesta seara, às vezes, ainda me surpreende. Experimentem assistir ao trailer de O Macaco, o novo longa-metragem de Osgood “Oz” Perkins, com produção de James Wan. A ideia passada para o público é a de um terror padrão, ou seja, de uma obra mais sisuda e convencional. Ter frescas na mente as imagens da produção anterior do cineasta, Longless, estrelada por Nicholas Cage e um dos grandes sucessos deste nicho no último ano, apenas reforça a impressão vendida pelo trailer. Acontece que não é nada disso. Se vocês forem ao cinema com esta expectativa, certamente, há uma enorme chance de se decepcionarem. Por essa razão, dou-lhes o melhor conselho que eu poderia dar: assistam O macaco, mas com a cabeça e o coração abertos, por favor. 

O macaco

Uma adaptação de um conto homônimo de Stephen King, lançado em 1980, a trama traz os irmãos gêmeos Hal e Bill Shelburn, na infância vividos por Christian Convery e na fase adulta por Theo James. Eles herdam do pai, um comandante de voos comerciais que os abandonou com a mãe, Lois (Tatiana Maslany), o boneco de um macaco que toca bateria – vocês já devem ter visto um por aí, é um brinquedo relativamente bem fácil de achar. De aparência boba e inofensiva, o bicho, na realidade, é o protótipo de um cramunhão feito de plástico, tecido e circuitos, tudo isso abastecido com duas pilhas Rayovac bem parrudas. Para o diabo fazer sua mágica, basta girar a chave que está em suas costas e… pronto! Em breve, alguém, em algum lugar, irá morrer. Sim, de forma implacável e sem qualquer chance de contestação. 

O prólogo do filme, apresentado por uma voz over, em que um homem, Hal, fala sobre uma herança maldita herdada do pai, determina, logo de cara, o tom de tudo o que veremos ao longo dos próximos 98 minutos. Petey, o pai dos gêmeos, vivido pelo ator Adam Scott, tentar passar o boneco para frente em uma loja de penhores. Ele explica a maldição para o proprietário que, obviamente, não acredita em nada. A consequência é fruto do desdém, como se o brinquedo entendesse exatamente o que os humanos falam. Em uma sequência que parece saída da franquia Premonição, uma série de acontecimentos bizarros resulta na extirpação do dono do estabelecimento. Tudo com muitíssimo sangue farsesco e tripas voando para todos os lados. 

Mortes após mortes, um belo dia, os garotos conseguem sumir com o boneco e acreditam terem se livrado da maldição. No entanto, ele é inquebrável, praticamente indestrutível, e vinte cinco anos se passam até que eles tenham notícias, mais uma vez, do filhote de cramunhão. Esse hiato remete a uma das coisas que talvez possam ser vistas como um problema ou um incômodo para parte dos espectadores: o fato de que O Macaco não fornece qualquer explicação para a origem do brinquedo e da maldição que esse carrega. Somos jogados no cerne da história do nada, se supetão e as coisas são do jeito que elas são, é melhor aceitarmos que dói menos. Eu tenho zero problema com isso, ainda mais que é sempre importante lembrar da existência de uma coisa chamada de “suspensão da descrença”. Por outro lado, o bom de ser jogado neste turbilhão de ação e inevitáveis gargalhadas, afinal, há muitas cenas engraçadas pelo modo como foram feitas, é não ter muita brecha para pensar no que está acontecendo. 

A julgar pelo tempo entre o inicio e o final do filme, mais o fato de que é possível ver um celular na fase adulta, dá para imaginar que a história se passa no começo dos anos 2000. Porém, em momento nenhum aparece uma data sequer localizando temporalmente a trama. O que é interessante e instigante. Os créditos iniciais do longa-metragem, em cores vivas e pela tipologia em si, transmitem a sensação de que estamos diante de uma autêntica película oitentista. As roupas das crianças na escola dos gêmeos Shelburn também são peças que tranquilamente veríamos na série de televisão “Stranger Things”, assim como o vestuário, hoje, cafona dos tios Chip, Oz Perkins em participação especial, e Ida, interpretada por Sarah Levy. Essas coisas me levam a pensar que tudo, talvez, faça parte de um limbo temporal, nada impossível para um autor como Stephen King. Mas não, provavelmente, estou viajando.  

Aliás, a trama de terror de O Macaco, mesmo com todos os seus momentos cômicos e sangue farsesco, possui um pano de fundo muito mais sério: uma história de bullying. Desde a primeira cena, da primeira voz over, fica clara a relação tóxica entre os dois irmãos. Bill, como nasceu antes, julga-se superior a Hal e explora isso ao máximo. Ele não perde uma chance de maltratar o outro e de culpá-lo por tudo de errado que acontece. É tão nocivo, que Hal chega a tentar usar o brinquedo para matar Bill. Essas situações possibilitam que os dois atores, Christian Convery e Theo James, cada um em sua parte do filme, se destaquem. Aí, é importante chamar atenção para James que surgiu na trilogia Divergente e foi bastante criticado na época. Alguns anos e algumas séries televisivas depois, “Magnatas do Crime” e “The White Lotus”, seu talento parece ter amadurecido e se ele ainda não pode ser chamado de um ator brilhante, carismático é um adjetivo que lhe cai muito bem. 

Maleabilidade, lá em cima, eu utilizei essa palavra para adjetivar o gênero de terror e alguns dos cineastas que transitam por ele. Apesar de já ter feito um rápido paralelo entre os dois últimos filmes de Osgood “Oz” Perkins, “Longless” e O Macaco, é necessário voltar a tal comparação para enfatizar o valor do trabalho do diretor. O primeiro, foi classificado por alguns como o mais assustador filme em sei lá quanto tempo. Apesar de ter gostado, entendido a proposta e tal, não achei tão aterrorizante assim – talvez tenha problemas com obras que cheguem com este hype, pois o mesmo ocorreu com Hereditário, de 2016. Por outro lado, o segundo, apesar do trailer que o vende errado, tem uma proposta completamente diferente e igualmente válida. Seu humor bizarro, que nem todo mundo vai achar graça, pode ser exemplificado por uma cenas em que alguém pergunta: “O que Deus diz quando um ônibus cheio de estudantes cai de uma ponte?” A resposta: “Fiz mais um strike”. Estão vendo? Eu achei graça e gostar deste ou daquele tipo de filme, é algo muito particular. Contudo, testemunhar um cineasta com esta qualidade e maleabilidade em ação, é um privilégio de todos nós. 

Desliguem os celulares e excelente diversão. 

Bruno Giacobbo
Bruno Giacobbo
Um dos últimos românticos, vivo à procura de um lugar chamado Notting Hill, mas começo a desconfiar que ele só existe mesmo nos filmes e na imaginação dos grandes roteiristas. Acredito que o cinema brasileiro é o melhor do mundo e defendo que a Boca do Lixo foi a nossa Nova Hollywood. Apesar das agruras da vida, sou feliz como um italiano quando sabe que terá amor e vinho.

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