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Noel Rosa – Um espírito circulante retrata parte da historia do artista

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Cantor, compositor, bandolinista, violinista e acima de tudo sambista, Noel de Medeiros Rosa partiu cedo deste mundo, mas não sem antes deixar sua marca. Ele tinha somente 26 anos quando faleceu vitimado por uma tuberculose. No entanto, ao longo de uma carreira que começou em 1929 e só findou com o seu passamento, o músico compôs mais de 200 canções, entre elas, verdadeiros clássicos do cancioneiro nacional como “Com que roupa eu vou?”, “Fita Amarela”, “Feitiço da Vila” e “Palpite Infeliz”. Com a nobre missão de não deixar o samba morrer, dirigido e roteirizado por Joana Nin, o documentário Noel Rosa: Um Espírito Circulante resgata e retrata um pouquinho da história do homem que mais se assemelha a um mito e vai além, ao mostrar como, hoje, Noel, o “Poeta da Vila”, e o bairro de Vila Isabel se confundem simbioticamente em uma relação que todos levam vantagem.

Logo no começo, na única aparição de Martinho da Vila, o segundo filho mais ilustre de Isabel, o herdeiro por direito de uma tradição de bambas do samba, escutamos sua voz em off dizendo que fala-se tanto de Noel Rosa até hoje que, por tabela, parece que ele ainda está vivo e que a qualquer momento adentrará em um dos botequins da Boulevard 28 de Setembro ou de algum outro logradouro adjacente. Essa impressão é reforçada por Moacyr Luz que revela, em uma conversa, captada pelas lentes dos diretores de fotografia Elisandro Dalcin e André de Paula, com o também músico Zé Renato, o seu espanto, ainda jovem, ao descobrir a quantidade de canções compostas por Noel em tão pouco tempo de vida. A constatação que precedeu o susto sempre o fez tomar Rosa por um personagem mitológico e, por isso mesmo, imortal. 

Para realizar Noel Rosa: Um Espírito Circulante, Nin decidiu usar de tudo um pouco. Apelou para imagens de arquivo, gravou depoimentos da maneira mais informal possível, quase todos regados com bastante música e muita cerveja, trechos da Rádio MIS – o arquivo radiofônico do Museu da Imagem do Som – e trechos do que parecem ser antigas entrevistas para a televisão ou outro DOC, talvez. E é em uma destas entrevistas que surge a saudosa Aracy de Almeida enaltecendo a generosidade de Noel Rosa, que a tomou pelas mãos e a apresentou a outros sambeiros, como eram chamados os sambistas, em seu debut pela noite boêmia do Rio de Janeiro. Com admiração e alegria, “A Dama do Encantado”, como ela era conhecida, revela que só mesmo Noel para acreditar naquela garota recém chegada do subúrbio. 

Um dos depoimentos mais interessantes de todo o documentário foi dado pelo compositor Edu Krieger. Para ele, ainda que o rock tenha sido inventado posteriormente, Noel Rosa foi o primeiro roqueiro brasileiro. E é óbvio que este insight um tanto quanto anacrônico e absurdo não tem nada a ver com o estilo musical. Na verdade, Krieger está se referindo à aura que Noel exalava e ao seu comportamento autodestrutivo, algo tipicamente característico dos roqueiros que integram o “Clube dos 27”. Para quem não sabe, no universo do rock, vários astros morreram de forma trágica aos 27 anos, nomes de peso como Jimi Hendrix, Janis Joplin, Jim Morrison e Kurt Cobain. Desta forma, Noel Rosa não só teria sido um precursor de um “estado de espírito” inédito, como superou todos ao falecer com 26 anos. 

Ao argumentar que, hoje, o músico e o bairro se confundem simbioticamente, Noel Rosa: Um Espírito Circulante é também um passeio no tempo pelas transformações, grandes ou pequenas, pelas quais a região passou ao longo do século XX. A Companhia de Fiação e Tecidos Confiança Industrial, por exemplo, que inspirou a música “Três Apitos”, ainda está por lá, mas os seus muros tombaram e atualmente abriga um enorme supermercado. Do mesmo jeito, algumas das casas da antiga vila de operários permanecem de pé e com alguns moradores de 60 anos atrás. Examinando este quadro, é fácil perceber que Vila Isabel, e aí devemos incluir inclusive a escola de samba, foi forjada no contexto histórico da vida e, principalmente, da obra de Noel. Por tal razão, talvez seja impossível separar uma coisa da outra. Assim, o samba tem uma questão física que remete imediatamente a lugares como Madureira e, claro, Vila Isabel. 

O tal “espirito circulante”, que está no título do documentário de Joana Nin, é um insight que surge em uma mesa de bar onde estão reunidas somente mulheres sambistas. Elas se referem ao fato de Noel Rosa estar presente, não importa em que direção se olhe, em todos os cantos do bairro de Vila Isabel: desde os nomes dos estabelecimentos comerciais que, de alguma forma, fazem referência ao músico, passando pela estátua de bronze em tamanho real, até o “Samba do Trabalhador”, criado há 20 anos por Moacyr Luz, que, em plena tarde de segunda-feira, atrai milhares de pessoas às instalações do Clube Renascença para, entre outras razões, celebrar a vida e a obra do grande “Poeta da Vila”. 

Desliguem os celulares e ótima diversão. 

Bruno Giacobbo
Bruno Giacobbo
Um dos últimos românticos, vivo à procura de um lugar chamado Notting Hill, mas começo a desconfiar que ele só existe mesmo nos filmes e na imaginação dos grandes roteiristas. Acredito que o cinema brasileiro é o melhor do mundo e defendo que a Boca do Lixo foi a nossa Nova Hollywood. Apesar das agruras da vida, sou feliz como um italiano quando sabe que terá amor e vinho.

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