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 O deserto de Akin aborda as consequências da relação Brasil / Cuba, em 2013

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Em julho de 2013, durante o Governo Dilma, o Brasil viu a implementação do programa “Mais Médicos”. Em parceria principalmente com Cuba, o país do mundo com o maior número de doutores por mil habitantes, o objetivo era atender cerca de 63 milhões de brasileiros que não tinham acesso à atendimento médico. Inicialmente, o programa foi um grande sucesso. Com o tempo e a chegada das eleições que levou à troca do grupo político que estava no poder, críticas começaram a serem feitas e problemas foram relatados em um cenário politicamente dramático. Dentro do contexto apresentado, o longa-metragem O Deserto de Akin, dirigido por Bernard Lessa, conta a história de um destes profissionais que vieram trabalhar por aqui e que, longe de casa, enfrentou os seus próprios dramas. 

Na trama, Akin, interpretado por Reynier Morales, é um médico cubano que mora no Espírito Santo. Em meio a uma rotina de completa entrega e total dedicação aos seus pacientes, entre eles os moradores de uma comunidade indígena, desfruta de momentos de bastante intimidade com a professora Erica, vivida por Ana Flávia Cavalcanti, e o chefe de cozinha Sérgio, papel de Guga Patriota. Assim, aos poucos e devagar, o protagonista aprofunda e fortalece sua relação com o Brasil, com o seu povo e a sua cultura. Mas não há mal que nunca acabe ou bem que sempre dure, com a eleição de Jair Bolsonaro e o fim do programa, Akin se vê obrigado a voltar para Cuba. Todavia, será que ele irá mesmo voltar? 

Confesso que nos primeiros minutos de O Deserto de Akin achei estar diante de um documentário. Foi apenas por pouco tempo, mas esta sensação se deu por causa de dois fatores: o meu hábito de ir para quase todas as cabines com a menor quantidade possível de informações sobre o filme em questão e uma pegada “naturalista fake” imprimida pela direção de Lessa. É claro que, quando se olha mais afundo e com muita atenção, qualquer um vê que as cenas foram ensaiadas, mas, por detrás desta encenação, há um esforço consciente em tudo parecer natural. O fato dos atores não serem muito conhecidos – eu, particularmente, só conhecia a Ana Flávia Cavalcanti – e o uso de moradores locais como coadjuvantes, ou figurantes, também ajuda a reforçar a sensação inicial. 

O resultado dessa conjunção de fatores, em cena, é um filme com uma química gostosa e, claro, bastante natural. Erica ama Akin, Sérgio gosta de Akin, já Akin, por sua vez, gosta dos dois, mas ama mesmo o Brasil. Este amor reverbera em todos os momentos da atuação do ator e cantor cubano Reynier Morales: no modo como o personagem cuida e trata dos seus pacientes como se fosse um médico de verdade; no olhar de melancolia e de tristeza quando descobre que, pelo menos em tese, terá que voltar para o seu país, pois o programa fora encerrado pelo novo governo. Neste instante, o nome do longa, O Deserto da Akin, que até ali só parecia referenciar umas poucas dunas que vimos em uma praia, passa a fazer sentido porque, enfim, o percebemos como uma referência à aridez do deserto emocional que o protagonista se vê forçado a encarar daquele ponto em diante. 

O Deserto de Akin é uma obra curta: são apenas 78 minutos de duração. Mais do que suficiente para retratar com uma boa dose de suavidade e de delicadeza a tensão de um período recente da História Contemporânea do Brasil. Lessa utilizou o impasse vivido pelo personagem com o fim do programa “Mais Médicos” para mostrar como a sociedade está dividida devido a questões políticas. É como se não fôssemos todos brasileiros, pois não nos reconhecemos mais nos outros ou não naqueles que pensam diferente de nós. Falta-nos o amor e o afeto que sobram, diariamente, ao protagonista na hora de tratar os seus pacientes e, por consequência, com o país onde escolheu viver. Assim como outras obras de forte cunho politico, este é um filme que nos leva a pensar e a refletir sobre o mundo a nossa volta, algo que deveríamos fazer sem precisar de qualquer estímulo externo. 

Desliguem os celulares e boa diversão.

Bruno Giacobbo
Bruno Giacobbo
Um dos últimos românticos, vivo à procura de um lugar chamado Notting Hill, mas começo a desconfiar que ele só existe mesmo nos filmes e na imaginação dos grandes roteiristas. Acredito que o cinema brasileiro é o melhor do mundo e defendo que a Boca do Lixo foi a nossa Nova Hollywood. Apesar das agruras da vida, sou feliz como um italiano quando sabe que terá amor e vinho.

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