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Sérgio Módena, diretor de Vilões de Shakespeare, fala sobre os 7 pecados capitais

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O espetáculo chega à sua 100°apresentação o que significa que está sendo bem aceito pelo publico, porém os textos e a teatralidade de Shakespeare sempre foram difíceis de digerir, como é levar ao publico uma texto de fácil acesso?

Sérgio Módena – Shakespeare sempre teve uma enorme aceitação popular, pois o autor antes de mais nada estava preocupado em se conectar com o público de seu tempo e fazer com que suas peças fossem grandes sucessos de bilheteria, os “blockbusters” da era elisabetana. Como o bardo retratou tão bem a alma humana, colocando em cena sua beleza, dor, vilania e tragicidade mais implícitas, , suas peças atravessaram os séculos sempre relidas de acordo com os contextos históricos de cada época . Temas como luta pelo poder, vingança, o amor, ambição, culpa são arquetípicos e são eles os grandes temas de Shakespeare. Vale dizer também que a linguagem shakespeariana não abre mão de uma construção poética e lírica, mas ela é dotada de uma concretude avassaladora. Para isso, precisa ser muito bem compreendido e dito pelo ator. Aí sim teremos uma plena comunicação com a plateia.

Vilões de Shakespeare é um desafio cênico que foge de um monólogo shakespeariano?
Sérgio Módena – Todo espetáculo para mim é um novo desafio, sinto que estou começando do zero, de uma folha em branco que não permite (ou não deseja) rascunhos de outras obras que fiz. A gente carrega um traço, uma linha de criação que perpassa por todos os trabalhos, mas é importante descobrir os caminhos que um novo texto oferece. Os “Vilões de Shakespeare” em sua estrutura dramatúrgica propõe um passeio entre narrativa contemporânea (através do palestrante que vem “ensinar quem são esses vilões”) e os próprios textos das peças de Shakespeare. Logo, o narrador funciona como um alívio, uma pausa bem humorada e bastante irônica entre uma tragédia e outra. E talvez esse trânsito constitua um excelente desafio para o ator e para mim como diretor. Os Vilões em sua essência traz algo simples mas poderoso: alguém que vem contar histórias. Um contador de histórias que permite de vez em quando viver os personagens narrados. E essa combinação faz com que o público se sinta convidado a mergulhar em universos de peças que ele provavelmente não conhece. Especialmente o público brasileiro.

Na sua opinião, os vilões são estimulados pelos os 7 pecados capitais? Ou são movidos apenas pelo desejo de vingança? 

Sérgio Módena –  Há inúmeras razões para a vilania desses personagens, mas em muitas vezes não há razão alguma. Nesse último caso, o vilão é o que chamamos de representação do mal, aquele que é motivado e inspirado pela destruição do outro, um verdadeiro psicopata, como Iago. Outros como Macbeth são tragados para a vilania por conta de sua ambição pelo poder. Mas ele também é um homem honrado e é essa sua característica que o traí. Um vilão consumido pela culpa avassaladora, talvez um dos personagens mais belos de Shakespeare. Ricardo III é inspirado nas alegorias do teatro medieval, onde havia sempre um personagem extremamente “vil”. Mas Shakespeare também o dotou de um histórico traumatizante, mergulhado em guerras familiares, com o corpo deformado, feio, coxo e desprezado pelas mulheres e até pela própria mãe. Ou seja, em cada peça uma nova onda de acontecimentos parece embasar a natureza do mal de seus vilões.

 Se você pudesse escolher apenas um vilão de Shakespeare para dirigir qual seria? E porque?

Sérgio Módena – Sou fascinado por Macbeth e pretendo montá-lo em breve. Talvez ele tenha de sobra o que muitos de nossos governantes demonstram não ter hoje em dia: o sentimento de culpa que nasce de seu distinção entre o bem e o mal. Mas essa distinção é apagada (ou borrada) quando o seu desejo de conquistar o trono fala mais alto. Macbeth simboliza uma guerra arquetípica entre luz e trevas que todos nós carregamos em nossas almas. No caso dele, foi seu lado mais sombrio que acabou por vencer.

O que te levou a fazer um monólogo sobre os Vilões de Shakespeare?

Sérgio Módena –  Fui convidado pelo Marcelo Serrado para dirigir esse projeto após ele ter visto minha direção de Ricardo III. Desde então ficamos muito próximos e a vontade de trabalhar juntos só aumentou. Marcelo é um ator dotado de todos os recursos essenciais para esse espetáculo. Ele gosta de contar bem uma história e estabelecer uma conexão com o público carregada de humor e ironia, características estas fundamentais na obra original do Berkoff.

Qual é a importância de Shakespeare na formação ? E na sua carreira?
Sérgio Módena – Eu interpretei Romeu e Teobaldo numa montagem de Romeu e Julieta Unicamp, dirigida por Marcio Tadeu que me marcou muito. Depois em Londres acabei estudando Shakespeare novamente. Portanto sempre estive muito ligado às suas peças. Sinto como se em sua obra estivesse o que há de mais clássico e mais contemporâneo em relação ao fazer teatral. São peças que fazem parte do inconsciente coletivo da civilização ocidental, elas nos pertencem do mesmo modo que pertencemos a elas.

Shakespeare Vs. Brecht , como eles influenciam na sua formação?
Sérgio Módena – Brecht foi outro autor fundamental na minha formação. Fui aluno do diretor Marcio Aurélio que nos trazia uma visão realmente contundente da obra brechtiana. Ele nos ensinou a entender esses autores a partir de uma maneira viva e pulsante. Ou seja, os clássicos não permaneceram para serem intocáveis. Eles podem ser provocados, relidos, ressignificados, desde que seja feito de forma inteligente e pertinente. Como bem disse o dramaturgor Heiner Müller: “fazer Brecht sem criticá-lo é traí-lo.”

Alê Shcolnik
Alê Shcolnikhttps://www.rotacult.com.br
Editora de conteúdo e fundadora do site, jornalista, publicitária, fotografa e crítica de cinema (membro da ACCRJ - Associação de Críticos de Cinema do Rio de Janeiro). Amante das Artes, aprendiz na arte de expor a vida como ela é. Cultura e tattoos nunca são demais!

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