- Publicidade -

Bizarros Peixes das Fossas Abissais: Marão mergulha na psicodelia em animação exuberante

Publicado em:

Algumas expressões podem ser repetidas em diferentes títulos, às vezes em múltiplos momentos em uma mesma temporada. Quem nunca declarou assistir ao “melhor filme do ano” algumas vezes no mesmo espaço de tempo? Sem medo de errar, no entanto, posso declarar que Bizarros Peixes das Fossas Abissais é uma experiência como poucas dentro do contexto apresentado: o Cinema de Animação brasileiro. Não apenas sua realização demanda um bocado de coragem, como o seu lançamento é um ato de resistência dentro da normatividade que rege um circuito cada vez menos interessado no risco, e cujo retorno imediato é uma realidade que permitiria a continuidade do estado das coisas.

Bizarros Peixes das Fossas Abissais

No entanto, ao encarar a estreia na direção de longas-metragens do diretor, roteirista e desenhista Marão, uma porta de oportunidades parece surgir para o futuro da área, seja ela a animação, mais especificamente, ou o audiovisual como um todo. Isso porque Marão, que não é conhecido como alguém em repouso, leva toda a sua anarquia estético narrativa para a linguagem longa. O resultado é, em falta de palavra melhor, inexplicável, aliás, leve essa expressão ao pé da letra, para em seguida utilizá-la como um adjetivo que o definiria com admiração. E não há como não encontrar em Bizarros Peixes das Fossas Abissais o reconhecimento a uma ousadia que faz falta em qualquer cinematografia, que engrandece não apenas o olhar imediato. Seu destemor fica.

Podemos chamar a ambientação de Bizarros Peixes das Fossas Abissais como uma abertura para a psicodelia mediante elementos comuns. Em tese, temos uma jovem mulher, uma tartaruga e uma nuvem em cena. A partir do nosso encontro com elas, as coisas se mostram como verdadeiramente são: ela tem superpoderes que transformam as partes de seu corpo no que ela desejar (a frase “minha bunda é um gorila!” dificilmente será esquecida), enquanto a tartaruga sofre de transtorno obsessivo compulsivo grave e a nuvem convive com um raro caso de incontinência pluviométrica. O filme não narra apenas esse encontro, mas o lugar no mundo em que seres desgarrados precisam, para encontrar o desejo de ficar.

Poderíamos chamar Bizarros Peixes das Fossas Abissais de filme de estrada? Em tese, é diante do que estamos. Essas três, digamos, existências saem em busca de uma resposta a suas indagações particulares, que transformam-se em questões coletivas a reverberar em todos, e possivelmente no mundo do futuro. Podemos igualmente chamar Marão de destemido, tendo ele a consciência de que nosso circuito é viciado a respeito do que é considerado normativo, estamos diante de um bicho estranho sob qualquer aspecto. As animações nacionais são, ainda, muito poucas, além disso, acredito que essa, especificamente, é pensada fora dos padrões estéticos e narrativos do que é vigente só se torna mais incomum, só podemos celebrar sua aparição.

É, certamente, necessário compreender que o mundo não é feito apenas de Disney, Pixar, Studio Ghibli, Aardman, Illumination, … , mas sim tem um manancial bem grande de trabalhos exuberantes em seus lugares de escolha menos óbvia, como a estreia da semana passada Meu Amigo Robô. Mesmo o paladar adulto tem dificuldade de absorver tais códigos, e o que Marão faz em sua estreia é nos tirar da zona de conforto. Inclusive em encontrar novas associações para apresentar fórmulas já decodificadas, porque precisamos olhar para as diferenças e encontrar beleza na singularidade, o que nos torna seres únicos. De alguma maneira enviesada, é sobre tais valores que Bizarros Peixes das Fossas Abissais se debruça, um lugar onde o poder das maravilhas vai além da entrada em um tronco de árvore.

De duração tão diminuta, é também arriscado que Bizarros Peixes das Fossas Abissais acople em sua duração o prolongado momento do encontro com o título. Na verdade, esse é o momento crucial onde tais situações se mostrarão delimitadoras a respeito do quanto se avança nessa produção. Acredito que o fascínio das imagens como um todo, e o jogo desafiador que se apresenta dentro da narrativa, sejam o suficiente para que tal jornada a três não se apresente de maneira diferente a de uma obra de arte, com a qual nosso visionamento só precisa se acostumar, para então mergulhar junto na psicodelia de seu autor.

Mais Notícias

Nossas Redes

2,459FansGostar
216SeguidoresSeguir
125InscritosInscrever
3.870 Seguidores
Seguir
- Publicidade -