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SETEMBRO 5: Tim Fehlbaum relembra o “Massacre de Munique”

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As Olimpíadas, a Copa do Mundo de Futebol e os grandes eventos esportivos em geral surgiram com a vocação de promover a paz e congregar os povos. Quem não se lembra do histórico jogo entre as seleções dos Estados Unidos e do Irã, rivais políticos, no Mundial de 1998, na França, em que as duas equipes trocaram flâmulas e posaram para a foto? Ou da seleção sul-africana de rugby, campeã mundial em 1995, a primeira equipe a reunir atletas brancos e pretos após o apartheid? Teve ainda aquele jogo do Santos, na Nigéria, em que a simples presença de Pelé provocou um cessar fogo no conflito que acontecia naquele exato momento, lembram? São muitas histórias que demonstram o poder do esporte como força apaziguadora. No entanto,  infelizmente, há exemplos contrários de como uma competição esportiva também pode ser maculada pela maldade humana ou por um gesto de irracionalidade e brutalidade. Este é o plot de Setembro 5, longa-metragem dirigido pelo cineasta suíço Tim Fehlbaum. 

Os Jogos Olímpicos de 1972 foram a primeira grande chance dos alemães mostrarem a nova sociedade germânica para o restante do planeta. Uma sociedade formada de modo majoritário por pessoas que não viveram ou não apoiaram as atrocidades da Segunda Guerra Mundial. Dois anos mais tarde, aconteceria a Copa do Mundo da Alemanha. Tudo ia bem, o objetivo estava sendo alcançado satisfatoriamente, até que, no início da segunda semana de competições, no dia 5 de setembro, uma organização terrorista palestina chamada “Setembro Negro”, invadiu a vila olímpica e fez onze integrantes da equipe olímpica de Israel de reféns. O saldo final, uma mistura de despreparo com incompetência, foi o assassinato de todos os reféns, de cinco terroristas e de um policial. Esse terrível episódio ficou conhecido como “Massacre de Munique”, a cidade onde ocorria os jogos. 

Os acontecimentos deste triste dia, no roteiro escrito pelo próprio diretor em parceria com Moritz Binder e Alex David, são mostrados pelos olhos de uma equipe de jornalistas norte-americanos da rede de televisão ABC, a única emissora a cobrir quase toda a tragédia ao vivo, em tempo real. No centro da ação, personagens reais como Roone Arledge (Peter Sarsgaard), presidente da ABC Sports, Marvin Bader (Ben Chaplin) e Geoffrey Mason (John Magaro), produtores responsáveis pelo conteúdo que ia ao ar, todos sem experiência neste tipo de situação, tanto é que, repetidas vezes, a direção da TV, nos Estados Unidos, tentou transferir a comando da transmissão para o departamento de jornalismo. Na verdade, entre os profissionais, havia, sim, um com experiência: Peter Jennings (Benjamim Walker), um repórter que trabalhara como correspondente no Oriente Médio. E foi graças a ela que a ABC conseguiu o “furo” de reportagem, já que Peter se escondeu e permaneceu dentro da vila olímpica enquanto  essa era esvaziada pelas autoridades. 

Com esta escolha de roteiro, Setembro 5, indicado ao Globo de Ouro de Melhor Filme de Drama, se assume, desde o princípio, como o que de fato ele é: um tenso thriller jornalístico da melhor estirpe hollywoodiana, como eles tanto gostam de fazer por lá. Este subgênero já produziu obras incontáveis em que dá para destacar os clássicos “A Montanha dos Sete Abutres” (1951) e “Todos os Homens do Presidente” (1976); e longas-metragens bem mais recentes como “Spotlight: Segredos Revelados” (2015) e “The Post: A Guerra Secreta” (2017). O elemento que une a produção de Fehlbaum a essas quatro obras, principalmente as duas últimas, mais próximas temporalmente e por isso menos datadas, é a sensação de fazer os espectadores imergirem completamente no frisson de uma redação jornalística. Para cumprir este propósito, a edição de Hansjörg Weißbrich presta um auxílio importante ao ajudar a imprimir um bom ritmo aos desdobramentos da trama. 

Com uma fotografia, assinada por Markus Förderer, que emula, em diversos momentos, as imagens de uma televisão de tubo dos anos 70, o longa se preocupa, ainda, em mostrar o sentimento dos alemães em relação à tragédia e a associação desta com o passado recente do país. E isto é feito através da personagem Marianne Gebhardt (Leonie Benesch), uma tradutora de alemão contratada pela emissora. Ela é única, em toda a redação, que fala a língua local. Dito isto, com a evolução dos acontecimentos, Marianne passa a desempenhar inclusive o papel de intérprete, indo a campo atrás da notícia. Por meio da voz de tal personagem, temos uma noção de como tudo aquilo impactou os anfitriões. Com feridas ainda não cicatrizadas, tudo o que eles não precisavam era de uma nova tragédia no quintal de casa, mesmo que, desta feita, não tenham nenhuma culpa no cartório. 

Com um pouquinho mais de 1h30 de duração, Setembro 5 passa como um furacão. É obra para ver sem desgrudar da cadeira e sem precisar ir ao banheiro. Se encaixa naquela categoria de filmes baseados em fatos reais que, mesmo sabendo o final, não deixam de chocar como se fosse uma nefasta notícia que acabamos de receber. Bastante triste. Agora, para os estudantes de jornalismo que, por ventura, venham assistí-lo, é uma aula de como essa profissão, tão desvalorizada em nossos tempos, é extremamente importante e emocionante, mesmo nas situações mais adversas e indesejáveis. Como diriam por aí: ossos do ofício. 

Desliguem os celulares e ótima diversão. 

Bruno Giacobbo
Bruno Giacobbo
Um dos últimos românticos, vivo à procura de um lugar chamado Notting Hill, mas começo a desconfiar que ele só existe mesmo nos filmes e na imaginação dos grandes roteiristas. Acredito que o cinema brasileiro é o melhor do mundo e defendo que a Boca do Lixo foi a nossa Nova Hollywood. Apesar das agruras da vida, sou feliz como um italiano quando sabe que terá amor e vinho.

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