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Leandro Hassum abusa do gestual, das caras e bocas em Uma Advogada Brilhante

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No mundo cinematográfico brasileiro, Leandro Hassum já é uma marca. O ator e humorista que, recentemente, afirmou que o cinema é a sua vida e a sua maior paixão, e aliás, é sinônimo de boas bilheterias e de salas cheias. Seus filmes se enquadram naquele tipo de humor que podemos classificar, sem qualquer demérito, como popular. O humor popular é aquele que agrada um grande público e é de fácil comunicação com qualquer pessoa. E para que seja sempre assim e nunca perca essa sintonia, o timing das piadas não pode mudar. Em uma cena do seu novo longa-metragem, Uma Advogada Brilhante, sob a batuta da diretora Alê McHaddo, Leandro Hassum abusa do gestual, das caras e bocas com o intuito de provocar risos. Certamente, é uma de suas marcas registradas e talvez não funcione com todo mundo, mas funciona com muita gente, por isso ele segue repetindo a fórmula ano após ano. Todavia, como esta nova produção aborda um tema espinhoso, pode ser que justamente este timing soe acima do tom e também não agrade a todos. 

Leandro Hassum

Nesta quarta colaboração entre intérprete e diretora – Amor dá Trabalho, de 2019, Amor sem Medida, de 2021, e Meu Cunhado é um Vampiro, de 2023 -, Leandro Hassum interpreta o advogado Michelle Barbieri, mais conhecido como Mike, mas que, devido ao seu nome de origem italiana, costuma ser confundido com uma mulher. Separado, ele não pode nem pensar em atrasar o pagamento da pensão de sua ex-esposa, Virgínia (Cris Wersom), já que esta deseja levar seu filho para os Estados Unidos. Um dia, a firma de advocacia onde trabalha é comprada por um dos maiores escritórios do país. Inicialmente, o que parecia ser um sonho, logo se transforma em um pesadelo quando, por uma questão de equiparação de gênero, todos os homens de sua antiga firma são informados que serão demitidos. Para não perder o emprego, Mike, então, decide assumir a identidade feminina com a qual sempre foi confundido. 

Antes de começar a sessão para a imprensa de Uma Advogada Brilhante, sentado no meu lugar, mais a título de reflexão, comentei com dois colegas: “O quão problemático, em pleno ano de 2025, pode ser um filme em que um homem, ainda que esse tenha razões nobres, se faz passar por uma mulher?”. Esse não é, de fato, um questionamento de fácil resposta. Iniciado o longa, as coisas ficaram ainda mais problemáticas. Para começo de conversa, a tal equiparação de gênero é falsa. O tempo inteiro só visualizamos duas advogadas em todo o escritório, sendo que uma delas não é mulher: Michelle Barbieri e Júlia Ornelas (Claudia Campolina), personagem destinada a ser o par romântico do protagonista. Para além dessa constatação, o doutor João Pedro,  principal advogado e um dos chefes da firma, vivido pelo ator Bruno Garcia, é o estereótipo clássico do machista da pior espécie. 

Aos poucos, as duas vão conquistando o seu espaço, ainda que João Pedro e outros homens tentem diminuir a importância de suas conquistas. Neste ínterim, Leandro Hassum exibe o seu repertório habitual de piadas, dá até para dizer que quem já viu um filme dele, viu todos. A cena citada no parágrafo inicial ocorre em um tribunal, durante o julgamento que irá arbitrar o valor da pensão a ser paga para Virgínia, e Mike está realizando a sua própria defesa. A gag, aqui, consiste no fato dele falar com ele mesmo como se fossem duas pessoas diferentes. Engraçada ou não, faz sucesso e é o que o público quer ver. O problema ocorre quando as piadas machistas começam a pulular em uma obra que, até este momento, já deixava a desejar não sendo tão cômica quanto deveria ser. No início, não são muitas e proferidas, principalmente, pelo personagem de Garcia. Até que, com o tempo, tornam-se abundantes e atingem o seu ápice em uma cena de extremo mau gosto, que acontece logo após a primeira grande causa vencida por Michelle e Júlia.  

O beabá da crítica cinematográfica diz, com absoluta clareza, que mostrar determinadas coisas em um filme não significa endossá-las. O belo e poético O Silêncio do Céu, de 2016, dirigido por Marco Dutra, abre com uma cena de estupro e nem por isso está dizendo que aquilo é correto. Muito pelo contrário, o obra mostra, entre outros aspectos, a busca do marido da vítima por vingança. Da mesma maneira, tenho convicção em afirmar que ao elencar tantas cenas questionáveis e piadas machistas, a intenção do roteiro, assinado pela diretora em parceria com Cris Wersom e Luiz Felipe Mazzoni, era mostrar o quão erradas são estas palavras e atitudes, porém, está tudo muito acima do tom. Assim, do mesmo jeito que eu fiz com os meus colegas de imprensa, proponho aqui um exercício de reflexão: E se Uma Advogada Brilhante fosse dirigido por um homem hétero e não por uma mulher trans? Qual seria a reação do público e de boa parte da crítica especializada?

Além disso, vendo Uma Advogada Brilhante, lembrei de outra película: Uma Babá Quase Perfeita, de 1993, com a direção de Chris Columbus. Há referências a outros filmes, mas, para mim, essa é a mais forte. Quem recorda bem deste clássico da “Sessão da Tarde”, sabe que as duas produções partem do mesmo lugar: um pai que se passa por uma mulher para não ficar longe do filho ou dos filhos, no caso do longa americano. Indo mais adiante, os fãs vão lembrar da cena em que Robin Williams, em um jantar, precisa estar simultaneamente em duas mesas diferentes. Em uma como ele mesmo, na outra como a babá. Essa situação impossível o leva a trocar de roupa toda hora, de lá para cá. No longa brasileiro, temos duas cenas que emulam esta: uma também em um jantar, a outra no fórum. Columbus e McHaddo mandaram muito bem nestas passagens. São os momentos mais engraçados das duas obras, contudo, a diferença está no em torno. Enquanto um filme segue com o sabor sem máculas da infância, o outro desponta graças as suas escolhas infelizes, ainda que bem intencionadas, em meio a uma repetição de situações já exploradas em outras obras. 

Desliguem os celulares. 

Bruno Giacobbo
Bruno Giacobbo
Um dos últimos românticos, vivo à procura de um lugar chamado Notting Hill, mas começo a desconfiar que ele só existe mesmo nos filmes e na imaginação dos grandes roteiristas. Acredito que o cinema brasileiro é o melhor do mundo e defendo que a Boca do Lixo foi a nossa Nova Hollywood. Apesar das agruras da vida, sou feliz como um italiano quando sabe que terá amor e vinho.

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