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Deborah Colker fala como a dança é capaz de revolucionar o mundo

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Coreógrafa fala como o espetáculo “OVO” do Cirque du Soleil impactou sua carreira.

Deborah Colker
Foto: Cafi

Deborah Colker dedicou seu tempo, nos últimos anos, a buscar uma cura, aliás, no caso, uma solução para a doença genética que seu neto tem, a epidermólise bolhosa. Assim, nasceu o novo trabalho da Cia. Deborah Colker, um espetáculo que vai muito além do aspecto autobiográfico. “Cura” trata de ciência, fé, da luta para superar e aceitar nossos limites, do enfrentamento da discriminação e do preconceito.

A coreógrafa concebeu o projeto em 2017, mas foi no ano seguinte, com a morte de Stephen Hawking, que encontrou o conceito. Embora acometido por uma doença degenerativa, a ELA (Esclerose lateral amiotrófica), o cientista britânico viveu até os 76 anos, além de ter se tornado um dos nomes mais importantes da história da física.

Deborah percebeu que há outras formas de cura além das que a medicina possibilita. “Quando foi diagnosticado, os médicos deram a Hawking três anos de vida. Ele viveu mais 50, criativos e iluminados. Entendi o que é a cura do que não tem cura”, conta.

A dramaturgia do espetáculo, que estreia em live no Globoplay no dia 25 de setembro em transmissão ao vivo e com sinal aberto, é do rabino Nilton Bonder, além disso, a trilha original é de Carlinhos Brown.

 O espetáculo “Cura” conta com dramaturgia do rabino Nilton Bonder, além de ser autobiográfico. O fato de ter um rabino como dramaturgo do seu novo trabalho influencia em suas crenças religiosas? Aliás, como surgiu essa parceria?
Deborah Colker –  Esse espetáculo busca a cura do que não tem cura, é uma ponte entre a fé e a ciência. Bonder é um pensador, escritor, transgressor, uma mente inteligente, culta, rica e, como bom rabino, um belo contador de histórias que conhece povos e culturas. Ele, certamente, seria a pessoa perfeita para ser meu parceiro na dramaturgia. Ele sabe provocar e fazer perguntas. Como tenho um lado de indignação, luta e perseverança muito forte, Bonder, surpreendentemente, me trouxe a aceitação, a reflexão, além de outros caminhos para encontrar sempre a cura. Ter o direito de pedir, se aproximar da dor do outro e preservar a alegria.

Trouxemos 5 personagens para contar essa história: Theo (meu neto), Obaluaê (orixá da doença e da cura), Sthephen Hawking (cientista), Jesus (o maior símbolo do amor), Leonard Cohen (poeta). Com eles, povos, culturas, religiões, cantos , danças e canções.

 “Cura” trata de ciência, fé e da luta para superar e aceitar nossos limites, em tempos atuais, qual a importância de se falar sobre superação?
Deborah Colker – Percebi que meu maior inimigo é a ignorância e a discriminação. A falsa normalidade, os padrões não são evolutivos e não são reais. O conhecimento e o reconhecimento da força dentro da fragilidade, da cura dentro da doença. Saber gritar e calar, agir e esperar, lutar e aceitar. Superação é inteligência, apropriação, conhecimento, disciplina. Superar é curar!

Pela primeira vez, um espetáculo seu estreia direto no streaming, mercado cada vez mais em ascensão, como você vê essa nova experiência do público em assistir o seu trabalho, em um novo formato? Você acha que o impacto será diferente?Debora Colker – Estou muito feliz com esse acesso irrestrito a todos. Esse sinal aberto, gratuito para todo país é uma democratização da arte e da dança. É muito bacana!

Quantas pessoas não conseguirão ir ao teatro? Não só pela pandemia, mas por o país estar tão quebrado. Tantas pessoas conhecem a companhia, mas nunca puderam ver, e agora terão a oportunidade de assistir. Isso é que é dar oportunidade! Bravo para todos envolvidos: Globoplay, Vale, Cia de Dança, Ministério do Turismo. Muito feliz com isso!

Com relação ao impacto, claro que há perdas e ganhos. Se perde não ver o suor através dos olhos, mas se ganha uma câmera chegando perto do movimento das expressões, dando a dimensão do palco todo e do detalhe de cada bailarino e do movimento.

Você dirigiu o espetáculo “OVO” do Cirque du Soleil, poderia falar como surgiu esse convite e como foi essa experiência?
Debora Colker – Foi, certamente, uma experiência grandiosa que me dimensionou de outra maneira com o mundo e também com o meu trabalho. O meu trabalho com minha companhia me levou até o Cirque. Estava em Londres, apresentando “Nó” no Barbican e veio o convite, foi em 2006. Fui a primeira mulher a dirigir e criar para eles!

“OVO” tem 53 pessoas em cena, artistas de oito países do mundo, todos com nível máximo em suas técnicas. Escolhi os insetos, relacionei famílias de insetos com as técnicas do Circo e seus equipamentos. Criei, dirigi e coreografei. Passei muito frio, 25 graus abaixo de zero. O Cirque é, surpreendentemente, fascinante, uma escola. Certamente, a maior fábrica de espetáculos do mundo!

É uma estrutura muito grande, não é fácil. Tem que dar certo e o investimento é muito alto no show, tem que ser sucesso, lotar. Eles me perguntaram se queria bailarinos, disse que não. Queria fazer um espetáculo de circo que todos dancem e que realizem seus insetos e gestos através do movimento. O espetáculo ficou 12 anos em cartaz, até antes da pandemia, lotando no mundo inteiro. Fui a vários lugares, chamada por eles para fazer imprensa e cuidei muitas vezes da qualidade do trabalho também. Aprendi a contar uma história, dramaturgia num espetáculo grandioso como este, a cuidar de detalhes, a composição estética toda.

Depois quando fui fazer as Olimpíadas no Rio, por já ter feito o Cirque vim com uma maturidade e experiência que só o Soleil poderia ter me dado. Um espetáculo dessa magnitude quando comecei me dava medo, um desafio monstruoso, depois dessa experiência o artista fica ainda mais corajoso e exigente.

A Cia. Deborah Colker está no mercado há mais de 20 anos, sendo uma das mais premiadas e prestigiadas no Brasil e no mundo. Você acha que a dança como arte é capaz de revolucionar o mundo?
Deborah Colker – Com certeza! Já ganhei prêmio em Londres, em Moscou, fui a diretora de movimento das Olimpíadas, criei e dirigi e coreografei um show para o Cirque. É a dança ocupando espaço, gritando e se comunicando, mostrando que é popular, sofisticada, que conta uma história, que tem significado, expressividade e conteúdo potente. O corpo fala, pensa, emociona e se comunica!  Os gestos são palavras, os movimentos são frases, linguagem.

Por fim, gostaria de saber como você escolhe o que vai produzir? Como é o seu processo criativo? O que te influencia?
Deborah Colker –  Meu processo é muito íntimo, biográfico, particular. Parte sempre de uma urgência a ser dita, de uma intuição e uma necessidade de externar algo profundo. Começa de uma situação pessoal, mas ao mesmo tempo não é pessoal, pois a dramaturgia se expande, os significados e saberes construídos vão se conectando e esses significados tem que ser experimentados no corpo, além de construir um corpo que produz movimento investigando espaço e carregando de sentidos, emoções e significados os movimentos.

O corpo e as ideias vão se costurando, se trançando, em camadas, em escamas, que as vezes estão mais cruas, mais primitivas, as vezes até mais cerebrais. O processo criativo com minha cia. é longo, tem no mínimo entre 2 e 3 anos. Aliás, num processo de criação você tem que experimentar caminhos novos. Dá medo, insegurança, mas tem que experimentar. Com o processo você experimenta muito, investiga, respeita as estruturas clássicas e constrói.

Alê Shcolnik
Alê Shcolnikhttps://www.rotacult.com.br
Editora de conteúdo e fundadora do site, jornalista, publicitária, fotografa e crítica de cinema (membro da ACCRJ - Associação de Críticos de Cinema do Rio de Janeiro). Amante das Artes, aprendiz na arte de expor a vida como ela é. Cultura e tattoos nunca são demais!

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