Fora De Rumo

 Quando pensamos em um filme de ação nos moldes Jackie Chan algumas expectativas surgem quase que imediatamente. Cenas de luta que muitas vezes se assemelham a danças perfeitamente (não tão perfeitamente assim, como constantemente vemos nos erros de gravação) sincronizadas e coreografadas, que dão as cenas de ação bastante fluidez. Um tipo de comédia quase inocente, entre tombos e cambalhotas e diálogos espertinhos, meio chaves até. Expectativas costumam ser um problema, porque são grandes riscos de decepção, mas não é o caso de Fora de Rumo que é um excelente exemplar de uma comedia/ação no melhor estilo Jackie Chan. Apesar de não ser nada excepcional, e deixar um gostinho de que talvez tenha faltado alguma coisa em algum lugar, o filme não decepciona.

Bennie Chan (Jackie Chan) faz de tudo para tentar salvar seu parceiro, que está amarrado à uma bomba, sem sucesso. O amigo Yung (Eric Tsang), então, se joga ao mar para evitar que a explosão mate os dois, mas não sem antes pedir que Chan cuide de sua filha e a proteja do bandido, suposto responsável por sua morte, “The Matador“. 9 anos se passam e Bennie continua tentando revelar a identidade do criminoso, que acredita ser o empresário Victor Wong (Winston Chao). Essa obsessão faz com que o detetive seja obrigado a tirar férias forçadas quando uma de suas investigações leva a uma caçada que termina com destruição total do lugar, com uma excelente cena em que as casas desabam em efeito dominó. Porém, isso tudo se dá sem produzir nenhuma prova concreta contra o empresário.

Victor Wong é dono de um belíssimo Hotel-Cassino onde trabalha a não mais criança, Samantha (Fan Bingbing), filha de Yung e afilhada de Bennie. A moça se infiltrou no hotel, na esperança de coletar alguma informação que posa ser útil para confirmar a identidade do bandido. Ela trabalha como uma espécie de hostess para grandes apostadores e assim conhece Conor Watts (Johnny Knoxville), um apostador fanfarrão que vive levando as pessoas na lábia e cometendo pequenos delitos, um boneco retirado de um pai sem paciência aqui, uma chave de hotel trocada ali. Connor é perseguido pela máfia rússa, com que tem assuntos pessoais a acertar, e ao tentar fugir utiliza a chave roubada de Samantha para ter acesso aos elevadores e acaba no lugar errado na hora errada. O canastrão é sequestrado e levado para a Rússia, mas Samantha é responsabilizada pelo incidente, já que, além de ver mais do que devia, o rapaz ainda saiu levando uma quantia considerável que ganhou no cassino. Desesperada, e fazendo o papel da donzela em perigo, ela pede ajuda ao padrinho para que vá a Rússia e o traga de volta, para que ela consiga se livrar da enrascada em que se meteu.

O encontro entre Bennie Chan e Connor Wats se dá em meio a muita ação e algumas excelentes piadas, infelizmente o momento é cortado, e não produz o impacto que deveria, por uma trilha que me parece desencontrada, praticamente ao longo de todo o filme funcionando como um anti clímax muitas vezes. Desse primeiro encontro inicia-se a aventura, já que, para tentar não voltar para Hong Kong, Connor encendeia os passaportes. Os dois começam uma jornada que vai da Rússia, passando pela Mongólia até chegar a fronteira da China. É quase palpável a falta de química e sintonia entre os dois, muito diferente do que estamos acostumados a ver com Owen Wilson (Bater ou correr e Bater ou correr em Londres) e Chris Tucker ( A hora do rush 1, 2 e 3), parece o tempo todo que falta alguma coisa, mas a medida que o filme vai avançando isso se dissipa um pouco. Jackie Chan já carrega seus 62 anos e apesar de não desapontar, Johnny Knoxville acaba carregando grande parte da tensão cômica física.

Existe um ranço no cinema de ação que, as vezes passa despercebido, mas que em 90% dos casos está lá, que é a necessidade de conter elementos machistas. A necessidade de se ter uma donzela em perigo, ou de fazer menção ao sutiã de uma das personagens no meio de uma cena de luta, ou a colega de trabalho que está esperando pacientemente ser convidada, ser escolhida pelo protagonista, mas o que mais me chamou atenção foi uma fala específica em que Jackie Chan diz “Não é honroso lutar com uma mulher”, sendo que a “Mulher” em questão era Eve Torres, uma lutadora, uma WWE diva, nome dado as lutadoras da Wrestling profissional WWE para referir-se as suas wrestlers femininas. No filme ela interpreta uma capanga perfeitamente capaz de enfrentar o protagonista. Já é mais do que tempo de as produções repensarem o papel das mulheres em seus filmes.

A direção de Renny Harlin (Duro de matar 2 e Risco Total), que tem bastante experiência no gênero garante o ritmo do filme, que é cheio de excelentes cenas de ação dos mais diversos tipos com rafting em uma balsa feita com peles de porcos, tirolesa em um abismo, lutas na lama, perseguições, resgates em um navio afundando, essa diversidade de elementos criativos o filme se torna bastante movimentado e animado. Não é um filme que requer que se pense muito sobre nada, sendo inclusive bastante bobo em muitos momentos, mas é na mesma medida extremamente divertido, agradável e capaz de prender a atenção. Com tantas cenas boas de ação e algumas risadas garantidas o filme não pode ser considerado chato, e tem até algumas surpresas.

O fato do filme se tornar um road movie, enquanto a dupla tenta chegar a Hong Kong, é responsável por uma série de cenários incríveis que resultam numa bela e dinâmica fotografia com a mudanças rápida dos ambientes dando ainda mais intensidade ao ritmo do filme. Esse passeio por diferentes paisagens rende também a oportunidade de visitar alguns elementos culturais e de tradições muito interessantes e, ainda que rapidamente, acrescentam conteúdo ao filme. Um dos momentos inesquecíveis é o cover de “Rolling in the deep” da Adele cantada no meio de uma vila no interior da Mongólia, é uma daquelas cenas que dificilmente veríamos em outro lugar, com o acréscimo de ver o próprio jackie Chan cantando. Realmente um deleite.